sexta-feira, fevereiro 09, 2007

2007 FEVEREIRO 09 Os párocos do concelho de Felgueiras protagonizaram no passado domingo uma iniciativa como a cara deles. Convocaram as populações católicas de todas as paróquias que estão sob o seu comando, para o Monte de Santa Quitéria, sobranceiro à cidade de Felgueiras, a fim de, lá do alto, elas e eles gritarem em uníssono NÃO à Lei de despenalização do aborto que vai a referendo este domingo, 11. Responderam à sinistra convocatória apenas aquelas populações que os párocos ainda conseguem manter subjugadas e tolhidas pelas suas catequeses moralistas dominicais. A esmagadora maioria, felizmente, esteve-se nas tintas. Apenas quem ainda se não libertou do Medo de Deus e do Inferno e dos seus Sacerdotes sem entranhas de Misericórdia e de humanidade, mais funcionários de carreira eclesiástica do que irmãos, é que compareceu. E todos com ar de toupeira e de forçados pagadores de promessas. A começar pelos próprios párocos que a tudo presidiram. Como se, de repente, neste início do século XXI, a Idade Média estivesse de regresso a este concelho do distrito do Porto. Tive de passar àquela hora, a caminho do 8.º Encontro de Espiritualidade em S. Pedro da Cova, Gondomar, por um dos locais onde as populações deveriam começar por se concentrar, e pude ver, já na berma da estrada, um dos párocos com a sua pequena corte de adolescentes de coro, devidamente trajados a rigor. Todos, pároco e adolescentes, vestiam de branco, túnicas dos ombros até aos pés, sobre as suas roupas de uso domingueiro que assim ficavam escondidas. A pose era de envergonhados e humilhados. De condenados. Seres assim, não são gente. São abortos. Não são mulheres nem homens. São uniformes. São súbditos. A começar pelos párocos, súbditos do bispo residencial e do Código de Direito Canónico e dum Moralismo rançoso e imoral que faz deles eunucos à força, quando do que a Humanidade mais precisa é de mulheres e homens livres e insubmissos. E mulheres e homens livres e insubmissos é o que deve fazer o Celibato pelo Reino de Deus, praticantes da libertação, alegremente centrados no Essencial que é invisível aos olhos, nomeadamente, aos olhos dos hierarcas episcopais, condenados a ter de viver solitários na cátedra do poder sagrado e dos respectivos paços, como inacessíveis e intocáveis vestais de carne e osso, mas sem afectos. Tudo o que o Moralismo sem moral sabe fazer são funcionários ao seu serviço, carne para religião e para santuários, prostitutos do sagrado que engordam e enriquecem à custa de ritos e de cerimónias alienantes que Deus, o de Jesus, só pode vomitar. E que outra coisa são, por exemplo, as missas rotineiras sem profecia e carregadas de Moralismo estupidificante que todos os domingos os párocos realizam, semana após semana, mês após mês, ano após ano, geração após geração, senão vómitos de Deus, o de Jesus? E a prova é que, quanto mais os párocos as fazem, mais as populações que as frequentam ficam adoentadas, tolhidas, oprimidas, aterrorizadas, abortadas, desmobilizadas social e politicamente. Ora, como pelos frutos se conhece a árvore, está à vista de todas as pessoas o que são as missas que tais frutos produzem. O mesmo se diga de todos os outros ritos e todas as outras actividades que os párocos e os bispos residenciais fazem, num corre-corre com tudo de inumano e de prostituído. Nem sequer são actividades inócuas, inofensivas, daquelas que não fazem nem bem nem mal. Não. São actividades prejudiciais. Portadoras de veneno. Carregadas de vírus. Como esta peregrinação ao Monte de Santa Quitéria contra a Lei de despenalização do aborto e das mulheres que em consciência optem por abortar. De todas estas actividades dos párocos e dos bispos residenciais, as populações precisam de fugir. Parecem actividades pastorais, mas são actividades carregadas de Moralismo e, por isso, carregadas de vírus que, em muitos casos, chegam a ser mortais. Se fossem actividades pastorais, seriam da mesma qualidade das de Jesus, o bom Pastor. Mas não. Andam tecidas de Mentira e de Cinismo, de Hipocrisia e de Humilhação. Aliás, o primeiro a fugir delas foi o próprio Deus, o de Jesus. Pelo menos, desde que os Sacerdotes do Templo lhe mataram o filho muito amado, Jesus, o de Nazaré, nunca mais Deus quis nada com eles. Ao ressuscitar Jesus, Deus disse urbi et orbi, com essa sua Acção/Insurreição, que nunca mais queria nada com os Sacerdotes, seja de que religião ou Igreja for. Muito menos com as religiões que eles promovem e alimentam. Vomita-os a todos e às religiões que eles promovem e alimentam. De quem Deus gosta é de Jesus, o seu filho muito amado. E do que ele faz. Os Sacerdotes é que não gostam nada que Jesus abra os olhos aos cegos, nem que faça ouvir os surdos e falar os mudos. Nem que faça andar os paralíticos e levante/ressuscite os mortos. Mas Deus é do que verdadeiramente gosta em Jesus, o de Nazaré, e por isso o reconheceu como o seu filho bem amado e colocou-o para todo o sempre como o modelo acabado, perfeito, de ser humano para todos os povos, quaisquer que sejam a sua cor e a sua língua. Os Sacerdotes não gostam e por isso matam-no. E como hão-de gostar dele se, ao fazer todas essas acções libertadoras e promotoras de seres humanos autónomos e sororais/fraternos, Jesus está a dar-lhes cabo do negócio e do poder sagrado, que outra coisa não são as religiões e os cultos a que todos eles presidem em exclusivo nos templos e outros santuários sobre a terra? Então uma mulher, um homem que, graças a Jesus e ao seu Espírito, abre os olhos da própria consciência e, assim, se torna capaz de ver as falcatruas que os Sacerdotes realizam em nome de Deus; ou que começa a ouvir os clamores das vítimas das religiões e das mentiras dos Sacerdotes; ou que começa a falar com ciência e com liberdade; ou que começa a andar sobre os seus próprios pés, sem precisar mais do “apoio” dos Sacerdotes; ou que sai dos túmulos em que os Sacerdotes insistem em mantê-la, mantê-lo a vida inteira, não é uma mulher, um homem que os Sacerdotes nunca mais conseguem subjugar e enganar? Como poderão eles tolerar quem assim os desmascara e lhes estraga tão chorudo e tão prostituído negócio e tanto poder sagrado? Bem sei que todos ou quase todos os Sacerdotes que hoje pontificam nos templos e altares são, eles próprios, as principais vítimas de catequeses mentirosas e terroristas e moralistas. E de teologias idolátricas, nos antípodas da teologia de Jesus. Convenceram-nos, durante os decisivos anos da sua formação, de que Deus gosta de Religião e que a Religião é que salva a Humanidade. E eles, de posse dessa (in)formação, de bom grado, alistaram-se para essa actividade apresentada como a mais sublime e a mais digna e também a mais salvadora. Mas tudo isso não passa de crassa Mentira. Uma Mentira que eles, os Sacerdotes, têm obrigação, à medida que desenvolvem e reflectem as suas práticas rituais e rotineiras, de detectar e logo passar a lutar contra ela e defender-se dela. Sob pena de serem cúmplices e carrascos das populações. Só Sacerdotes, a quem convém ser cegos, para não perderem estúpidos privilégios, é que não querem ver isto. Mas então não têm desculpa. Avisadas andarão, pois, as populações que os deixarem a falar e a oficiar sozinhos nos templos e nos altares. Na verdade, Deus, o de Jesus, não gosta nada de Religião. Do que Deus gosta é de Política, enquanto actividade maior dos seres humanos, uma actividade da mesma qualidade e do mesmo Sopro da actividade e do Sopro de Jesus, o de Nazaré. E como poderia a Religião salvar a Humanidade, se toda ela é fruto do Medo e alimentadora do Medo, nomeadamente daquele Medo mais inumano que é o Medo alojado no nosso Inconsciente colectivo, desde os tempos mais tenebrosos, como foram os começos da Humanidade, um Medo que leva quem dele anda possuído a fazer coisas contra si próprio, contra o o seu próprio desenvolvimento integral, contra a sua própria felicidade, contra a sua integridade física e cultural/espiritual, e também contra o seu próximo, sempre a pretexto de que age assim por amor de Deus? Acham que exagero? Vejam o que se passa em redor de certos santuários de nomeada, no nosso país e no resto do mundo. Apresentados oficialmente como espaços sagrados, mais não são do que espaçosos antros onde os seres humanos que os frequentam são incitados/pressionados/violentados a assumir posturas pessoais e de conjunto carregadas de indignidade, abaixo até de animal, e onde são literalmente sugados do seu dinheiro e do ouro que têm e até do que não têm, como paradigmaticamente denunciam os Evangelhos Sinópticos, ao narrarem o caso concreto daquela viúva pobre do tempo histórico de Jesus que, já então, se sentiu incitada/pressionada/violentada pelo ambiente religioso a dar ao tesouro do Templo de Jerusalém o último cêntimo de que dispunha. O escândalo e a indignação apoderaram-se a tal ponto de Jesus que ele não se conteve e correu a chamar as discípulas, os discípulos que o acompanhavam, para que vissem com os próprios olhos aquele crime de lesa-seres-humanos, nomeadamente, de lesa-pobres, e de lesa-Deus-Vivo que acabava de ter lugar ali diante de toda a gente. E, não satisfeito com isso, levou ainda mais longe a sua justificadíssima cólera: dumas cordas fez chicote e com ele em punho expulsou na hora todos os comerciantes que negociavam no Templo, verdadeiro covil de ladrões, sem se esquecer dos que vendiam rolas e pombas, isto é, os que faziam negócio com a miséria dos pobres, como aquela pobre viúva. Bem sei que, aparentemente, são as populações que frequentam esses locais que fazem questão de se desfazer do que têm e do que não têm para entregarem ao santuário e ao cofre do santuário, geridos e administrados pelos Sacerdotes. Mas na verdade são os Sacerdotes que a tudo presidem que estão por trás de tudo e que, com o Moralismo que constantemente pregam às populações, desencadeiam e alimentam dentro delas sentimentos de tanta culpa e de tanta indignidade, que elas não têm outra saída senão humilhar-se e sacrificar-se, a vida inteira, como bestas de carga, auto-flagelar-se (quase) até à morte, reduzir-se à condição de abjectos cumpridores de promessas, na convicção de que é assim que agradam, desagravam e dão glória a Deus. Sem que nenhum dos Sacerdotes, oportuna e inoportunamente, lhes diga que, com tais comportamentos, o que conseguem é dar vómitos a Deus, o de Jesus! Porque a Deus, o de Jesus, o que lhe dá glória é ver cada mulher, cada homem que vem a este mundo crescer em idade, em estatura, em sabedoria e em graça, exactamente como Jesus, o Filho do Homem que mais se parece com Ele, tanto que - diz o Evangelho de João - quem o vê, vê o próprio Deus. Foi por isso um pecado gravíssimo o que os párocos do concelho de Felgueiras cometeram, no passado domingo, um daqueles pecados que O Evangelho chega a dizer que não tem perdão. Numa postura conjunta de sadomasoquismo, arregimentaram as populações católicas que sacrilegamente ainda manipulam e fizeram-nas avançar, manhã cedo, pelas ruas da cidade a rezar o terço à mítica deusa virgem e mãe do Paganismo religioso, contra a Lei de despenalização do aborto e das mulheres que, porventura, continuem a abortar, inclusive nas primeiras dez semanas de gravidez. Ao agirem assim, mostraram bem o que são. São Sacerdotes. Não são pastores. São mercenários que negoceiam com o obscurantismo das populações. Não são profetas. Se fossem pastores ao jeito de Jesus, e profetas desassombrados como ele, em vez de iniciativas deste jaez, havíamos de vê-los a trabalhar incansavelmente com as populações, para que elas fujam do obscurantismo das religiões e se abram à Fé de Jesus, o de Nazaré, de modo a serem capazes de, como ele, discernirem os sinais dos tempos e perceberem por onde é que está a PASSAR o Espírito de Deus criador e libertador de seres humanos à sua imagem e semelhança. Populações assim ilustradas e evangelizadas, é que veriam, em cada momento e em cada situação, o que é bom e o que é mau e decidiriam em consciência. No caso concreto da Lei de despenalização do aborto, a referendar este domingo, as populações ilustradas evangelizadas depressa concluiriam que votar SIM no referendo é, no nosso aqui e agora português, a postura que mais defende a vida e que mais dignifica as mulheres, por isso, é também a que dá mais glória a Deus, o de Jesus, esse mesmo que quer posturas de Misericórdia e vomita todas as posturas de Crueldade, por mais moralistas que elas se apresentem. Nota: Não se pense que este meu libelo contra os párocos, mais Sacerdotes do que Pastores, mais funcionários eclesiásticos do que Presbíteros da Igreja, se deve ao facto de eu ter deixado de ser pároco. Nada disso. É uma denúncia essencial, decorrente da Fé de Jesus, a única que a Igreja deve fazer sua e prosseguir no tempo e no espaço. Aliás, foi precisamente nos poucos anos em que fui pároco, que comecei a dar-me conta desta perversão clerical. E, ainda sem ver muito claro, como hoje felizmente vejo, logo comecei a combater privilégios clericais e a interrogar-me sobre o para quê de muitas coisas que como pároco tinha que fazer. Com o passar dos meses, vi-me a ser cada vez menos Sacerdote e cada vez mais Presbítero da Igreja, na peugada de Jesus, o de Nazaré. E foi por isso que o Bispo, a partir de determinada altura, deixou de confiar em mim como pároco e passou a olhar-me como uma espécie de "cavalo de Tróia" dentro da Igreja. Até que me retirou a paróquia e sentenciou contra mim, sem que me fosse dada qualquer hipótese de defesa: enquanto for bispo do Porto, você nunca mais será pároco na Diocese. Para ele, isto era uma sanção canónica. Mas para mim, com o passar dos anos, mais não foi do que uma graça que eu agora só posso desejar que todos os que ainda são párocos venham também a receber. A Igreja de Jesus sairá a ganhar. E a Humanidade também. Pelo andar da carruagem, já não faltará muito tempo para que os párocos-Sacerdotes que hoje temos, mais eunucos à força por imposição do Sistema eclesiástico do que eunucos livres e responsáveis por amor do Reino de Deus, dêem lugar a Presbíteros Pastores, cheios de graça e de verdade, de Misericórdia e de Lucidez, verdadeiras leoas humanas, sempre prontos e determinados a sair em defesa dos pobres e dos oprimidos e a denunciar sem descanso as Economias e os Poderes que os fabricam aos milhões.

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