quinta-feira, maio 21, 2009

A salgalhada Há dois factos políticos recentes que indiciam que grande parte da nossa classe política ou é incompetente, ou irresponsável, ou desonesta, ou demagógica ou usa da má-fé, ou é várias ou todas essas coisas ao mesmo tempo. Vamos ao caso Lopes da Mota. O estatuto do membro nacional no EUROJUST é definido pela Lei nº 36/2003 e dispõe que tal membro é nomeado por despacho conjunto dos Ministros dos Negócios Estrangeiros e da Justiça, sob proposta do Procurador-Geral da República, ouvido o Conselho Superior do Ministério Público. Mais diz a Lei que o membro nacional tem de ser um Procurador-geral adjunto, que lhe é subsidiariamente aplicável o disposto no Estatuto do Ministério Público e que depende directamente do Procurador-Geral da República no que se refere ao exercício das competências em território nacional. Em nenhum dos seus artigos a Lei prevê que o membro nacional do EUROJUST possa ser exonerado das suas funções antes do termo do mandato. Para mim, que não sou especialista em leis (sou melhor, dizem mesmo que excelente, a cozinhar rojões à moda do Minho, bacalhau à Brás, feijoada à transmontana e favas com entrecosto e enchidos do Alentejo, entre outras dietas), quer isto dizer que, legalmente, o magistrado Lopes da Mota não pode ser demitido pelo Governo. Não tive tempo nem pachorra para ler a totalidade do Lei nº 60/98, que define o Estatuto do Ministério Público, pelo que não sei se o Procurador Geral da República o pode demitir ou não, mas tenho dúvidas, dado que se trata de um Estatuto mais antigo. Ora, a Lei nº 36/2003 é de 22 de Agosto de 2003, quando a maioria da Assembleia da República pertencia à coligação PSD/PP, quando Manuela Ferreira Leite era Ministra das Finanças e Paulo Portas Ministro da Defesa e quando muitos dos actuais Deputados de todas as bancadas ocupavam lugar no Parlamento. Se a Lei tem um buraco, como parece ser o caso, ao não prever mecanismos de exoneração de um representante nacional num organismo europeu, a culpa é, em primeiro lugar, da maioria da altura, pelo que não se compreende o ar de virgens ofendidas de Ferreira Leite, Portas e outros deputados dessa maioria. Não tendo visto as actas da Legislatura, desconheço quem votou contra e se houve alguém que clamou contra o buraco, mas tenho para mim que a maioria daqueles que agora gritam tem culpas no cartório. O Governo pode ter feito muita borrada (e fez montes dela, tanta que o mau cheiro já tresanda para os concelhos limítrofes da capital), mas não tem de ser criticado por não fazer uma coisa que a Lei não lhe permite fazer. E o cinismo ou a má-fé assumem requintes de sem vergonhice descarada quando se exige que o Governo faça aquilo que Lopes da Mota é acusado de ter feito – pressionar o Ministério Público. Passando ao caso Dias Loureiro, o Estatuto dos Membros do Conselho de Estado é definido pela Lei nº 31/84, aprovada durante o Governo do Bloco Central. A lei diz que os Membros por inerência se mantêm enquanto exercerem funções (com excepção dos antigos Presidentes da República, que são Membros vitalícios), que os 5 escolhidos pelo Presidente se mantêm durante todo o mandato deste e que os 5 eleitos pela Assembleia se mantêm durante a Legislatura, exercendo funções até à tomada de posse dos novos escolhidos e eleitos. Cessação de funções? Apenas por renúncia, por morte ou por incapacidade permanente. E mesmo que sejam presos e condenados por crime punível com prisão maior quando apanhados em flagrante delito (nos restantes casos apenas podem ser detidos ou presos com autorização do Conselho) só podem ser suspensos temporariamente. Assim sendo, quer gostemos deste PR quer não - e eu não gosto, se Dias Loureiro não se demitir, nem o Presidente nem o Conselho de Estado o podem demitir. Perante os factos, que raio de legisladores temos nós que permitem que o Presidente da República possa ser destituído, o Governo demitido e a Assembleia dissolvida, mas entendem que um membro do Conselho de Estado ou um represente nacional no EUROJUST apenas devem cessar funções por renúncia ou morte? E que depois deitam para os ombros dos outros a responsabilidade pelos buracos legislativos que produziram? Imagem: Gravações com uma salgalhada erótica Hindu no templo de Kandariya Mahadeva India, cerca de 1050 AC - Fotografia de Massimo Borchi/Corbis

1 comentário:

jrd disse...

A sal(galhada) vai refinar-se com a próxima ida do Oliveira e Costa ao Parlamento.