quinta-feira, janeiro 29, 2009

Os perdedores Naquela que um jornalista israelita, judeu e residente em Jerusalém, apelidou de guerra mais brutal e mais cruel de toda a história de Israel e que agora atravessa um cessar fogo periclitante, não houve ganhadores, mas apenas perdedores. Israel, apesar do aparente sucesso militar, perdeu em toda a linha, não conseguindo nenhum dos objectivos declarados, menos ainda dos encobertos mas à vista de toda a gente, e mostrou a centenas de milhões de pessoas a verdadeira face do sionismo. Quanto aos objectivos declarados, Israel queria destruir o Hamas e o seu governo, conseguir a reinstalação do líder da Fatah no poder em Gaza e acabar com a resistência armada. Terá conseguido matar mais de 1.300 palestinos, entre os quais 95 militantes do Hamas, sendo o resto civis, incluindo perto de 400 crianças; Mahmoud Abbas (ou Abu Mazen) perdeu mais uma fatia da pouca credibilidade que tinha, mesmo na Cisjordânia, e deixou de reunir quaisquer condições para liderar o que quer que seja; e teve o condão de fazer com que cada palestino capaz de pegar em armas, agora ou no futuro, seja mais um provável resistente armado, multiplicando por quase 100 o número de resistentes armados que se estima existir actualmente. No que respeita aos objectivos encobertos, pretendia Israel que o exército recuperasse a aura de invencibilidade perdida na guerra de 2006 e que os Partidos Kadima - do Primeiro (des)Ministro Ehud Olmert e da Ministra das Negociatas Estrangeiras Tipzi Livni - e Trabalhista - do Ministro do Ataque, Ehud Barak, ficassem bem posicionados para vencer as eleições do próximo mês. Conseguiu que o IDF passasse a ser visto entre a maioria da população mundial como um bando de terroristas assassinos; que todas as sondagens apontem como grande vencedor o Likud, do extremista Benjamin Nataniau; e que centenas de milhões de pessoas ficassem a conhecer os horrores da criação do estado sionista. Os palestinos também perderam, tornando mais difícil a concretização do sonho de um Estado Palestino independente. Mahmoud Abbas, que já era pouco crível por ter feito concessões a Israel sem obter nada em troca, perdeu o pouco que tinha e não se perfila ninguém capaz de liderar a Fatah e conduzi-la a um entendimento com o Hamas. Por sua vez, o Hamas, apesar de aparentemente ter saído reforçado, tem um milhão e meio de pessoas a morrer, sem acesso a comida, água e medicamentos e tem quase 400 quilómetros quadrados, completamente arrasados, para reconstruir, o que não pode fazer sem o apoio do Ocidente, que insiste em canalizar a ajuda através da Fatah. Como se isso não bastasse, há líderes do Hamas - como se pode ver neste artigo do professor de Irvine, Mark LeVine – que sabem há muitos anos que a violência não funciona, mas não sabem como fazê-la parar e que o verdadeiro acto de desespero que constitui o lançamento de foguetes Qassam e morteiros – que são poucos, desnecessários, errados e improdutivos – apenas serve para dar um pretexto a Israel para mais chacinas e para permitir aos seus apoiantes assobiar para o lado. Para além de ser uma temeridade totalmente desnecessária “cutucar a onça com vara curta”, ninguém, a não ser meia dúzia de lunáticos, admite que, mau grado toda a injustiça que envolveu a criação de um estado sionista e racista em terras palestinas e a sua crescente escalada de violência até ao que hoje é, Israel pode (e muito menos deve) ser destruído, pelo que o Hamas, mais tarde ou mais cedo, vai ter de aceitar oficialmente a sua existência. Quanto mais tarde o fizer mais contribui para o lento extermínio de um povo que diz defender. Perdeu, também, a dita “civilização ocidental”, ao permitir que um dos “seus” (salvo seja) tenha agido ao longo de 60 anos e continue a agir muito pior do que os bárbaros da idade das trevas, ao contribuir para a escalada do conflito de religiões e ao aprofundar o fosso entre o Ocidente e o Leste e entre o Norte e o Sul. Depois de tudo aquilo a que se assistiu, que autoridade têm os auto-denominados paladinos dos direitos humanos para se arvorarem em seus defensores? E, pior ainda, quem lhes vai ligar alguma? Perdeu, ainda, a humanidade no seu todo, principalmente os mais carentes, porque aquilo que Israel destruiu tinha sido construído, em grande parte, com o apoio da boa vontade de Estados e cidadãos dos países ditos desenvolvidos. E se, para os Estados, os donativos são uma forma de tentar limpar com uma mão a (má) consciência que a outra mão deixou conspurcar já é de esperar que os cidadãos se comecem a interrogar sobre se vale a pena contribuir para construir, hoje, algo que algum doido varrido vai destruir amanhã.

3 comentários:

jrd disse...

Apenas ganhou quem sempre ganha: A Indústria armamentista.

~pi disse...

tantas perdas

(tanto desamor

e parecemos aprender tão

pouco...



abraÇo




~

samuel disse...

Exccelente texto!