quinta-feira, setembro 20, 2007

O lado negro dos agrocombustíveis À primeira vista, os biocarburantes parecem uma solução altamente satisfatória. Produzidos a partir da cana de açúcar, de cereais, da soja e das palmeiras oleaginosas, constituem energias totalmente renováveis e alegadamente limpas, para além de, hipoteticamente, contribuírem para a melhoria das condições de vida de milhões de camponeses pobres. Mas, quando a esmola é grande, o pobre desconfia. E, como a esmola foi de monta, primeiro com o célebre memorando Bush - Lula e depois com a cimeira União Europeia – Brasil, e eu sou pobre, deu-me para fazer aquilo que seria suposto ser trabalho de jornalista que se preze: investigar, para ver se não haveria “gato escondido com o rabo de fora”. E o panorama não podia ser mais aterrador. Às imensas consequências ambientais negativas provocadas pela desflorestação galopante já verificada na Malásia e na Indonésia e espectável no Brasil, pela monocultura intensiva de espécies não autóctones, pelo consumo intensivo de água desperdiçada no cultivo e pelos gazes com efeitos de estufa provocados pela produção do combustível, que chegam a ultrapassar as emissões dos combustíveis fósseis, é necessário acrescentar os custos sociais associados à espoliação de milhões de camponeses dos seus meios de subsistência e ao aumento exponencial do custo dos cereais no mercado internacional, que já levou a violentos protestos de multidões de mexicanos confrontados com o preço do milho que importam dos Estados Unidos e que é a base do prato nacional, a famosa “tortilla”. Mas o melhor será dar a “tesoura” a quem “percebe da poda”. Entre tanta informação que me parece digna de realce, recomendo um artigo do sociólogo belga François Houtart, intitulado “o custo económico e social dos agrocombustíveis” (em castelhano) e outro de Eric Holtz-Gimenez, director geral do “Food First”, publicado no Le Monde Diplomatic de Junho de 2007, com o título “ Os cinco mitos da transição para os agrocombustíveis”, que pode ser lido em francês ou em inglês. Também já se fala da produção de biocarburantes a partir da celulose, pois os cientistas estão a trabalhar numa bactéria que o permitiria. Para nós, que temos assistido impotentes ao domínio do eucalipto sobre as espécies originais das nossa florestas, com a consequente aridez e desertificação dos solos, será fácil imaginar o que acontecerá à fauna e floras mundiais quando se começar a produzir combustível a partir de árvores de crescimento rápido. Confrontados com o petróleo a esgotar-se, a previsível escassez de água doce num futuro próximo, os efeitos potencialmente devastadores da produção de biocarburantes e as necessidades crescentes de energia, não seremos capazes de encontrar alternativas?

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