sexta-feira, janeiro 04, 2013

DIFICULDADES DE UM HOMEM DE ESTADO

Rogar que rogarei?
Toda a carne é como erva: incluindo
Os Companheiros do Banho, os cavaleiros do Império Britânico, os oficiais,
ó oficiais, da Legião de Honra,
A Ordem da Águia Negra (1ª e 2ª classes),
E a Ordem do Sol-Nascente.
Rogar rogar que rogarei?
A primeira coisa a fazer é organizar as comissões
Os conselhos consultivos, as comissões permanentes, as comissões
                                                          especiais e as sub-comissões.
Um mesmo secretário serve para várias.
Que rogarei?
Artur Eduardo Cirilo da Silva é nomeado telefonista
Com um vencimento de cento e vinte escudos por semana, elevável,
por fracções anuais de vinte e cinco escudos,
A duzentos escudos por semana; com uma gratificação
de cento e cinquenta escudos pelo
Natal
E direito por ano a uma semana de férias.
Foi nomeada uma comissão que nomeará a comissão de engenheiros
Para o estudo do Abastecimento de Aguas.
Está nomeada a comissão
Da Construção Civil, para tratar sobretudo da reconstrução das
fortificações.
É nomeada uma comissão
Para discutir com a comissão designada pelos Volscos
Os termos da paz perpétua: os frecheiros, alfagemes e ferreiros
Nomearam uma comissão conjunta para protestar contra a redução das
encomendas.
Entretanto os guardas jogam aos dados na escadaria
E as rãs (ó Mantuano) coaxam nos pântanos.
Pirilampos cintilam contra o vago relampejar de brancura
Que rogarei?
Mãe ó mãe.
Eis a galeria dos retratos de família, bustos enegrecidos, parecendo
todos notavelmente romanos,
Notavelmente iguais uns aos outros, iluminados sucessivamente pelo
cintilar
De um suado portador de archote, que boceja.
Oh quem se escondesse... Escondesse por baixo... Lá onde o pé da
pomba pousou e se firmou por um instante
Um instante imóvel, repouso meridiano, sob os mais altos ramos da mais
vasta árvore do meio-dia
Sob as penas do peito agitadas pela aragem post-meridiana
Lá onde o ciclamen abre as suas asas, onde a clematite pende do lintel
Ó mãe (não entre estes bustos, tão correctamente votivos)
Eu cansada cabeça entre estas cabeças
Pescoços fortes para suportá-las
Narizes fortes para cortar o vento
Mãe
Não estaremos nós, alguma vez, agora quase, juntos,
Se as imolações, oblações, impetrações,
Agora são cumpridas
Não estaremos nós
Oh quem se escondesse na Uma do meio-dia, na crocitante noite
silenciosa.
Vem com o deslizar das asas do morcego, o pequeno cintilar do pirilampo
ou vagalume
Erguendo-se e tombando, de poeira coroados, os pequenos seres,
Os pequenos seres trilam pela poeira, pela noite,
Ó mãe
Que rogarei?
Exigimos uma comissão, uma comissão representativa, uma comissão de
inquérito
DEMISSÃO DEMISSÃO DEMISSÃO


(T.S.Eliot faleceu a 4 de Janeiro de 1965)

(Tradução de Jorge de Sena)

2 comentários:

Manuel Veiga disse...

Demissão, já!...

e não se poderá exterminá-los?

grato por dares a conhecer este extraordinário poema!

abraço

jrd disse...

Excelente!
Continua a ser assim.

Abraço