terça-feira, março 31, 2009

Ditaduras e ditabrandas Há 45 anos uma ditadura militar sangrenta, que durou mais de 20 anos, abateu-se sobre o Brasil. Milhares foram perseguidos e presos, centenas tiveram de se exilar, muitos - várias centenas, segundo uns, alguns milhares, de acordo com outros - foram barbaramente assassinados ou desapareceram. Ao contrário de outros países da América Latina que viverem sob ditaduras militares - Chile, Argentina, Uruguai, Guatemala - que já começaram a julgar e a punir os algozes, no Brasil não tem sido possível abrir os arquivos do regime militar com vista a reconhecer, julgar e punir os criminosos, em grande parte porque os meios de comunicação social que apoiaram o regime ainda dominam a informação brasileira, a ponto de um deles - A Folha de São Paulo - ter afirmado não ter existido uma ditadura, mas sim uma ditabranda. Entre os muitos exilados esteve o meu cantor brasileiro preferido, Chico Buarque, que escreveu e cantou alguns das canções mais cáusticas para a ditadura, entre as quais Fado Tropical, Cálice e Meu Caro Amigo. Esta última foi escrita em forma de carta musicada dirigida a Augusto Boal, que na altura vivia no exílio, em Lisboa, e incluída no álbum Meus Caros Amigos, de 1976. Para ouvir: Meu Caro Amigo Meu caro amigo me perdoe, por favor Se eu não lhe faço uma visita Mas como agora apareceu um portador Mando notícias nessa fita Aqui na terra ‘tão jogando futebol Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll Uns dias chove, noutros dias bate sol Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui ‘tá preta Muita mutreta pra levar a situação Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça E a gente vai tomando que, também, sem a cachaça Ninguém segura esse rojão Meu caro amigo eu não pretendo provocar Nem atiçar suas saudades Mas acontece que não posso me furtar A lhe contar as novidades Aqui na terra ‘tão jogando futebol Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll Uns dias chove, noutros dias bate sol Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui ‘tá preta É pirueta pra cavar o ganha-pão Que a gente vai cavando só de birra, só de sarro E a gente vai fumando que, também, sem um cigarro Ninguém segura esse rojão Meu caro amigo eu quis até telefonar Mas a tarifa não tem graça Eu ando aflito pra fazer você ficar A par de tudo que se passa Aqui na terra ‘tão jogando futebol Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll Uns dias chove, noutros dias bate sol Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui ‘tá preta Muita careta pra engolir a transação E a gente ‘tá engolindo cada sapo no caminho E a gente vai se amando que, também, sem um carinho Ninguém segura esse rojão Meu caro amigo eu bem queria lhe escrever Mas o correio andou arisco Se me permitem, vou tentar lhe remeter Notícias frescas nesse disco Aqui na terra’ tão jogando futebol Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll Uns dias chove, noutros dias bate sol Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui ‘tá preta A Marieta manda um beijo para os seus Um beijo na família, na Cecília e nas crianças O Francis aproveita pra também mandar lembranças A todo o pessoal Adeus Chico Buarque

1 comentário:

O Puma disse...

Boa memória