How many times must a man look up, Before he can see the sky? How many ears must one man have, Before he can hear people cry? The answer, my friend, is blowin' in the wind. The answer is blowin' in the wind.
quarta-feira, fevereiro 20, 2008
Se bem me lembro…
Vitorino Nemésio deixou-nos há 30 anos.
Mais conhecido pela sua qualidade de grande comunicador, justamente conquistada pelo seu programa se bem me lembro, que protagonizou na RTP durante vários anos a partir de 1969 e que, segundo estimativas, tinha uma audiência superior a 4 milhões de telespectadores, deixou também uma extensa obra escrita, que vai desde a poesia à ficção ( o romance Mau Tempo no Canal é um clássico), passando pela crónica, pelo ensaio e pela crítica. No dizer de David Mourão Ferreira, a sua obra é “um autêntico arquipélago”.
Do meu ponto de vista, tem uma mácula no currículo: o facto de ter aceitado dirigir o jornal O Dia – um jornal de extrema direita à época - entre 1975 e 1976, do qual veio a demitir-se. No entanto, a sua craveira intelectual fá-lo parecer um pormenor insignificante.
Da sua poesia, deixo aqui dois exemplos: um, muito revelador do humor e da abertura de espírito de um septuagenário às tecnologias então nascentes; o outro, bem, o outro, porque o considero admirável.
Semântica electrónica
Ordeno ao ordenador que me ordene o ordenado
Ordeno ao ordenador que me ordenhe o ordenhado
Ordinalmente
Ordenadamente
Ordeiramente.
Mas o desordeiro
Quebrou o ordenador
E eu já não dou ordens
coordenadas
Seja a quem for.
Então resolvo tomar ordens
Menores, maiores,
E sou ordenado,
Enfim - o ordenado
Que tentei ordenhar ao ordenador quebrado.
- Mas - diz-me a ordenança -
Você não pode ordenhar uma máquina:
Uma máquina é que pode ordenhar uma vaca.
De mais a mais, você agora é padre,
E fica mal a um padre ordenhar, mesmo uma ovelha
Velhaca, mesmo uma ovelha velha,
Quanto mais uma vaca!
Pois uma máquina é vicária (você é vigário?):
Vaca (em vacância) à vaca.
São ordens...
Eu então, ordinalmente ordeiro, ordenado, ordenhado,
Às ordens da ordenança em ordem unida e dispersa
(Para acabar a conversa
Como aprendi na Infantaria),
Ordenhado chorei meu triste fado.
Mas tristeza ordenhada é nata de alegria:
E chorei leite condensado,
Leite em pó, leite céptico asséptico,
Oh, milagre ordinal de um mundo cibernético!
O cão atómico
Este cão tem folhas nas orelhas,
com quatro talos
mas o que este cão deveria ter era calos,
e só tem olhos e ossos
e morrinha num dente!
Mas, meu Deus, este cão
quase o diria meu irmão
parece gente!
Este cão é redondo. Está deitado,
rosna com gengivas de uivo.
Dizem-me que foi lobo,
mas perdeu a alcateia
como os homens perderam a razão,
que hoje serve de osso ao cão
escapou ao cogumelo nuclear,
e por isso se foi deitar.
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2 comentários:
Do ponto de vista das letras foi sem dúvida uma grande figura, na vertente política a sua posição foi sempre pouco clara, antes e depois de Abril.
É um facto, "jrd", mas, pelo menos, parece que não tentou enganar ninguém.
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