quarta-feira, janeiro 13, 2010

Deixemo-nos matar e logo se vê














A jovem da fotografia chama-se Myleene Klass e é uma apresentadora de televisão inglesa e modelo da Marks & Spencer. À meia noite de sexta feira, 8 de Janeiro, encontrava-se na cozinha da sua casa, com a sua filha no andar de cima (o companheiro estava ausente em negócios), quando descobriu uns  jovens intrusos no seu jardim. Cheia de medo, agarrou numa faca e começou a bater com ela na janela e a gritar antes de eles terem fugido. Acabou por ser avisada pela polícia de que não devia ter utilizado a faca para assustar os jovens, porque empunhar uma “arma ofensiva”, mesmo dentro da própria casa, era ilegal. A polícia explicou-lhe, ainda, que mesmo que estivesse sozinha em casa e se confrontasse com um intruso, não podia proteger-se.

Esta bizarro episódio surge menos de um mês depois de uma controversa sentença que condenou Munir Hussain e o seu irmão Tokeer Hussain a 30 e 39 meses de prisão efectiva. Munir Hussain é um pacato homem de negócios londrino e, quando chegou a casa durante o Ramadão, vindo da mesquita com a família, foi confrontado com três ladrões mascarados que os prenderam e ameaçaram matá-los a todos. O filho adolescente conseguiu fugir e foi pedir ajuda ao tio Tokeer, que veio em auxílio da família. Os ladrões fugiram, mas os dois irmãos conseguiram apanhar um deles, criminoso com 50 condenações no cadastro, batendo-lhe com uma pá de críquete, o que lhe deixou danos neurológicos permanentes. Tratou-se, na opinião do juiz que os condenou, de “um terrível e violento ataque” cometido pelos dois irmãos. Resolveu, por isso, destruir as suas famílias, pois é disso que se trata quando um homem de negócios islâmico é condenado a dois anos e meio de prisão num país como a Inglaterra.

Cá mais perto, um ourives da Trofa foi assaltado por jovens armados, espoliado de mais de duzentos mil euros e baleado. Conseguiu, mesmo assim, empunhar uma caçadeira e atingir um dos ladrões no abdómen. Com o comparsa a esvair-se em sangue dentro da viatura, os outros continuaram os assaltos até que o ferido morreu e foi abandonado. O ourives foi acusado de “homicídio privilegiado», um crime previsto na lei para os casos em que a actuação surge num estado de «emoção violenta, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral, que diminuam sensivelmente a culpa» e é punível com prisão entre um a cinco anos.

Não deixa de ser curioso que o assaltado seja acusado de “homicídio privilegiado”, pois dá-se a entender que nem todos os cidadãos podem ter o “privilégio” de serem assaltados, roubados, baleados e, ainda, terem acesso a uma caçadeira e espetarem com um chumbos no abdómen de um dos assaltantes. Compreendia-se melhor se fosse acusado de homicídio por negligência, já que não tomou as medidas ao seu alcance para levar mais uns tiros dos bondosos rapazes que o assaltaram.

Bem sei que num estado de direito não se pode fazer justiça pelas próprias mãos e longe de mim ser apologista de tal. Mas isso é uma coisa, e ter de ficar inactivo enquanto se é assaltado, violado, roubado ou baleado é outra completamente diferente, já que a faca de cozinha, a pá de críquete e, presumo, a caçadeira estavam legalmente na posse das pessoas. Depois queixem-se de que os paulinhos das feiras de lá e de cá atraem muita gente quando falam de insegurança e pedem um polícia para cada cidadão mais dois polícias para vigiarem cada um dos outros e se vigiarem mutuamente.

E eu que até estava a pensar comprar um machado no AKI para ter atrás da porta de entrada da minha casa! Agora, até a vara de oliveira vou ter de arrumar e, se for assaltado, pergunto se querem beber umas bujecas com amendoins ou tremoços. Caso sejam da elite, poderei mesmo oferecer uns uísques velhos acompanhados de figos secos com nozes, presunto com broa e vinho verde, porto vintage com queijo da serra de comer à colher ou tinto alentejano do meio da tabela com torresmos, enquanto a minha companheira tenta, sub-repticiamente, telefonar à polícia para virem acompanhá-los à porta.

4 comentários:

mdsol disse...

Está tudo do avesso.

bons temposhein disse...

Logo se vê...o estado a que isto está a chegar.

Milu disse...

Pelos vistos isto está bom é para os ladrões. Mas tive de me rir consigo na parte final do seu texto. Fiquei preocupada, porque como a minha casa por norma está sempre desguarnecida de tão opíparos manjares, imagine-se o desencanto dos larápios. Talvez a minha frugalidade me valesse então um valente excerto de porrada. Com um bocadinho de sorte, talvez aceitassem que eu encomendasse umas pizzas. :D

Lamentador disse...

A propósito do tal ourives que matou o assaltante O Muro das Lamentações estabeleceu um manual de boas práticas educativas para ourives e joalheiros assaltados... e que pode ser aplicado a outras classes empresariais e não só...