How many times must a man look up, Before he can see the sky? How many ears must one man have, Before he can hear people cry? The answer, my friend, is blowin' in the wind. The answer is blowin' in the wind.
terça-feira, dezembro 31, 2013
segunda-feira, dezembro 30, 2013
As imagens
As imagens
significam tudo a princípio. São sólidas. Espaçosas.
Mas os
sonhos coagulam, fazem-se forma e desencanto.
Já o céu não
há imagem que o fixe. A nuvem vista do
Avião: um
vapor que nos tira a vista, o grou, um pássaro, mais nada
Até o
comunismo, a imagem final, sempre refrescada
Porque
lavada com sangue tantas vezes, o dia-a-dia
Paga-lhe um
salário modesto, sem brilho, cego de suor,
Escombros os
grandes poemas, como corpos muito tempo amados e
Postos de
lado agora, no caminho da espécie exigente e finita
Nas
entrelinhas lamentos
sobre ossos
feliz o carregador de pedra
Porque o
belo significa o fim provável dos terrores.
(escritor
alemão falecido faz hoje 18 anos)
Tradução de
João Barrento
domingo, dezembro 29, 2013
o morto
foi
encontrado morto
não veio nos
jornais
teve direito
apenas a foto
mais tarde
lá se foi o
corpo
para dentro
de uma saco
de plástico
tenho pena
que os pombos não tenham direito a funeral
há pombos
que não são pombos
morrem sem
um nome
de fome e
frio
a cada três
segundos
que uma
criança sucumbe
hei-de
comprar umas lentes de contacto
para o
primeiro ministro
que não anda
nos passeios públicos.
(poetisa
coimbrã que hoje faz 68 anos)
sábado, dezembro 28, 2013
sexta-feira, dezembro 27, 2013
Voz
Voz modelada
na certeza irreal
da montanha
que respira o húmus do vento,
espalha as
sementes vegetais do sal,
nos lagos da
terra, único alimento!
E os lagos
se vestem de ondas que assaltam
a parede
lisa deste quarto fechado:
a abóboda
celeste que os anjos asfaltam
dum visgo
babado…
(escritor
amarantino nascido faz hoje 90 anos)
quinta-feira, dezembro 26, 2013
elegia
já nada é o
que era
e
provavelmente nunca mais o será
e mesmo que
o fosse
algo me diz
que já não seria o que era
porque o que
era
era o que
era por ser o que era
do que eu me
lembro muito bem
embora eu
então não fosse o que agora sou
mas o que
agora sou
ou estou a
ser
é deixar de
ser o que sou
porque eu
sou deixando de ser
deixar de
ser é a minha maneira de ser
sou a cada
instante
o que já não
sou
e o mesmo se
deve passar com tudo o que é
motivo por
que não admira que assim seja
quer dizer
quer nada
seja o que era
e se assim é
ou já não é
seja ou não
seja
(escritor
portuense que hoje faz 76 anos)
quarta-feira, dezembro 25, 2013
Natal Divino
Natal divino
ao rés-do-chão humano,
Sem um anjo
a cantar a cada ouvido.
Encolhido
À lareira,
Ao que
pergunto
Respondo
Com as achas
que vou pondo
Na fogueira.
O mito
apenas velado
Como um
cadáver
Familiar…
E neve,
neve, a caiar
De triste
melancolia
Os caminhos
onde um dia
Vi os Magos
galopar…
Miguel Torga
terça-feira, dezembro 24, 2013
enquanto é
tempo
ninguém foi
ver se eu estava na esquina
ou se, pelo
menos, minha palavra estava
e dizia a
que veio
batendo de
frente
de perfil
de quina
a poesia é
um escândalo
atrás do
outro
o poeta, um
bando
movido à
cicatriz
e perdigoto
misto de
mártir e meretriz
um poço
um passo
carne de
pescoço
alma que foi
pro espaço
todo santo
dia
morre um de
tanto beber
outro de
atrofia
poucos de
tanto escrever
muitos que
ainda iriam ser
e não foram
nem sombra
do que
poderiam ter sido
ah! não
farei um último pedido
a vida é um
não sei
e a gente
sabe
que é de lei
usar antes
que acabe
antes que o
peito
como um pneu
furado
se esvazie,
de tal jeito,
que o
coração
ainda vivo
seja
prensado, paralisado
sem emoção
sem motivo
sem ar
sem ter
conjugado
na primeira
pessoa
o verbo amar
(poeta paranaense
nascido a 24 de Dezembro de 1950)
segunda-feira, dezembro 23, 2013
Paixão
Podia
escrever o teu nome num vidro embaciado ou
segredá-lo a
uma borboleta negra.
Podia cortar
os pulsos e deixar o sangue correr até que
o mar
ficasse vermelho.
Ou beijar-te
os pés. Mas esse gesto está reservado
desde o
princípio dos séculos e teria o sabor de uma
profanação.
(poeta
vila-verdense que hoje faz 56 anos)
domingo, dezembro 22, 2013
Memória
O mundo parou.
O tempo, tão implacável
em seu compasso,
tão cadenciado, também parou.
Tudo estacou, congelou,
ficou petrificado e mudo.
E eu, no mundo,
voltei ao passado
aproveitando a imutabilidade
das coisas, das pessoas, dos fatos,
e revivi momentos,
fiz meu próprio tempo
andar pra trás,
atrás de pra trás,
voltar os anos.
Eu e meu tempo,
o tempo e meu mundo,
o mundo e meu eu,
tudo a um só tempo
em um mesmo lugar
no meu imo.
Só aí.
O tempo, tão implacável
em seu compasso,
tão cadenciado, também parou.
Tudo estacou, congelou,
ficou petrificado e mudo.
E eu, no mundo,
voltei ao passado
aproveitando a imutabilidade
das coisas, das pessoas, dos fatos,
e revivi momentos,
fiz meu próprio tempo
andar pra trás,
atrás de pra trás,
voltar os anos.
Eu e meu tempo,
o tempo e meu mundo,
o mundo e meu eu,
tudo a um só tempo
em um mesmo lugar
no meu imo.
Só aí.
(poeta pernambucano que hoje faz 66 anos)
sábado, dezembro 21, 2013
Las nubes
Inútilmente
interrogas.
Tus ojos
miran al cielo.
Buscas
detrás de las nubes,
huellas que
se llevó el viento.
Buscas las
manos calientes,
los rostros
de los que fueron,
el círculo
donde yerran
tocando sus
instrumentos.
Nubes que
eran ritmo, canto
sin final y
sin comienzo,
campanas de
espumas pálidas
volteando su
secreto,
palmas de
mármol, criaturas
girando al
compás del tiempo,
imitándole
la vida
su perpetuo
movimiento.
Inútilmente
interrogas
desde tus
párpados ciegos.
¿Qué haces
mirando a las nubes,
José Hierro?
(poeta
madrileno falecido faz hoje 11 anos)
sexta-feira, dezembro 20, 2013
Dá-me as
Tuas Mãos
As mãos
foram feitas
para trazer
o futuro,
encurtar a
tristeza, encher
o que fica
das mãos
de ontem -
intervalos
(duros,
fiéis) das palavras,
vocação
urgente
da ternura,
pensamento
entreaberto
até
aos dedos
longos
pelas coisas
fora
pelos anos
dentro.
(poeta
português nascido em Lourenço Marques a 20 de Dezembro de 1927 e falecido em
Espanha em 1975, de acidente de viação)
quinta-feira, dezembro 19, 2013
Amigo
Mal nos
conhecemos
Inauguramos
a palavra amigo!
Amigo é um
sorriso
De boca em
boca,
Um olhar bem
limpo
Uma casa,
mesmo modesta, que se oferece.
Um coração
pronto a pulsar
Na nossa
mão!
Amigo
(recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos
detritos?)
Amigo é o
contrário de inimigo!
Amigo é o
erro corrigido,
Não o erro
perseguido, explorado.
É a verdade
partilhada, praticada.
Amigo é a
solidão derrotada!
Amigo é uma
grande tarefa,
Um trabalho
sem fim,
Um espaço
útil, um tempo fértil,
Amigo vai
ser, é já uma grande festa!
(Alexandre
O'Neill nasceu faz hoje 89 anos)
Somos
imagens fátuas
Uma tarde é
tão pouco em nossa mão!
Os seus
anéis deixados os pesamos
Com puros
olhos; damos
Rigor ao que
é recordação.
Depois a
noite esculpe
Nossa
extensão no sono.
A que erma
catedral iremos nós de estátuas?
Sem um deus
que nos culpe,
Tais os
anéis de outono
Somos
imagens fátuas.
(Vitorino
Nemésio nasceu faz hoje 112 anos)
quarta-feira, dezembro 18, 2013
Stabat Mater
Stabat Mater
Esperando en
la comisaría
Ante la
sorna del alférez
Stabat Mater
Aguardando
que concluya
La voraz
semiología
De los
médicos
Stabat Mater
Descuajeringada,
entregada
A
obstetrices somnolientas
Stabat Mater
Sola en la
noche
Stabat Mater
En las
vitrinas de las tiendas
En el día de
la madre
Stabat Mater
once veces Dolorosa
Y una grande
voz le dijo
No llores
más, mujer, desde hoy
Hay otro
ángel en los cielos
(poeta
peruano que hoje faria hoje 72 anos)
terça-feira, dezembro 17, 2013
Nunca serei
vencida
Nunca serei
vencida.
Não o serei
senão à
força de vencer.
Cada
armadilha estendida
fechando-me
cada vez mais
no amor
que acabará
por ser o meu
túmulo,
acabarei a
minha vida numa cela
de vitórias.
Sozinha,
a derrota
encontra chaves,
abre portas.
A morte,
para atingir
o fugitivo,
tem de se
pôr em movimento,
perder essa
fixidez
que nos faz
reconhecer
que ela é o
duro contrário
da vida.
Ela dá-nos o
fim do cisne
atingido em
pleno voo,
de Aquiles
agarrado pelos cabelos
por não
sabermos que sombria Razão.
Como a
mulher asfixiada no vestíbulo
da sua casa
de Pompeia,
a morte não
faz mais do que prolongar
no outro
mundo os corredores
da fuga.
A minha
morte será
de pedra.
Conheço as
passagens,
as curvas,
as
armadilhas,
todas as
minas da Fatalidade.
Não posso
perder-me.
A morte,
para me
matar,
terá
necessidade da minha
cumplicidade.
(Marguerite
Yourcenar faleceu faz hoje 26 anos)
Tradução de
Maria da Graça Morais Sarmento
segunda-feira, dezembro 16, 2013
Deus
Fiquei farta
de deus
do deus da
minha infância
do deus
impingido nas escolas
do deus de
toda a gente
hoje
cortei-o aos pedaços
e ofereci-o
às estrelas
aos planetas
e às galáxias
que dormitam
no universo sideral
agora vogam
perdidos
a milhares
de anos-luz
na dança da
poeira dos espaços.
(poetisa
cabo-verdiana nascida faz hoje 86 anos)
domingo, dezembro 15, 2013
sábado, dezembro 14, 2013
Liberdade
Nos meus
cadernos escolares
Na minha
carteira e nas árvores
Na areia e
na neve
Escrevo o
teu nome
Em todas as
páginas lidas
Em todas as
páginas brancas
Pedra sangue
papel ou cinza
Escrevo o
teu nome
Nas imagens
douradas
Nas armas
dos guerreiros
Na coroa dos
reis
Escrevo o
teu nome
Na selva e
no deserto
Nos ninhos
nas giestas
No eco da
minha infância
Escrevo o
teu nome
Nas
maravilhas nocturnas
No pão
branco dos dias
Nas estações
desposadas
Escrevo o
teu nome
Em todos os
meus trapos de azul
No charco
sol bolorento
No lago de
lua viva
Escrevo o
teu nome
Nos campos
no horizonte
Nas asas dos
pássaros
E no moinho
das sombras
Escrevo o
teu nome
Em cada bafo
da aurora
No mar nos
navios
Na montanha
demente
Escrevo o
teu nome
Nas formas
cintilantes
Nos sinos
das cores
Na verdade
física
Escrevo o
teu nome
Nos atalhos
despertos
Nas estradas
abertas
Nas praças
que extravasam
Escrevo o
teu nome
No candeeiro
que se acende
No candeeiro
que se apaga
Nas minhas
casas reunidas
Escrevo o
teu nome
No fruto
cortado em dois
Do espelho e
do meu quarto
No meu leito
concha vazia
Escrevo o
teu nome
No meu cão
guloso e meigo
Nas suas
orelhas erguidas
Na sua pata
desajeitada
Escrevo o
teu nome
No trampolim
da minha porta
Nos objectos
familiares
No jorro do
fogo abençoado
Escrevo o
teu nome
Em toda a
carne concedida
Na fronte
dos meus amigos
Em cada mão
que se estende
Escrevo o
teu nome
No vidro das
surpresas
Nos lábios
aplicados
Bem por cima
do silêncio
Escrevo o
teu nome
Nas
ausências sem desejo
Na nua
solidão
Nos degraus
da morte
Escrevo o
teu nome
Na saúde
regressada
No risco
desaparecido
Na esperança
sem memória
Escrevo o
teu nome
E pelo poder
d’uma palavra
Recomeço a
minha vida
Nasci para
te conhecer
Para te
nomear
Liberdade
(poeta da
Resistência francesa, nascido a 14 de Dezembro de 1895)
Tradução de
Egito Gonçalves
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