quinta-feira, agosto 08, 2013

Requiem por um cão

Cão que matinalmente farejavas a calçada
as ervas os calhaus os seixos e os paralelepípedos
os restos de comida os restos de manhã
a chuva antes caída e convertida numa como que auréola da terra
cão que isso farejavas cão que nada disso já farejas
Foi um segundo súbito e ficaste ensanduichado
esborrachado comprimido e reduzido
debaixo do rodado imperturbável do pesado camião
Que tinhas que não tens diz-mo ou ladra-mo
ou utiliza então qualquer moderno meio de comunicação
diz-me lá cão que faísca fugiu do teu olhar
que falta nesse corpo afinal o mesmo corpo
só que embalado ou liofilizado?
Eras vivo e morreste nada mais teus donos
se é que os tinhas sempre que de ti falavam
falavam no presente falam no passado agora
Mudou alguma coisa de um momento para o outro
coisa sem importância de maior para quem passa
indiferente até ao halo da manhã de pensamento posto
em coisas práticas em coisas próximas
Cão que morreste tão caninamente
cão que morreste e me fazes pensar parar até
que o polícia me diz que siga em frente
Que se passou então? um simples cão que era e já não é


(poeta riomaiorense falecido faz hoje 35 anos)

4 comentários:

São disse...

Ruy Belo era um pouco obcecado pela morte, segundo ouvi a um crítico...

Abraço-o

Manuel Veiga disse...

Ruy Belo, um Poeta maior.

abraço

Anónimo disse...

eu tenho um labrador

adoro-o

Bjinhos
Paula

Flor de Jasmim disse...

Um poeta do qual conheço muito pouco.

beijinho e uma flor