How many times must a man look up, Before he can see the sky? How many ears must one man have, Before he can hear people cry? The answer, my friend, is blowin' in the wind. The answer is blowin' in the wind.
domingo, novembro 30, 2008
Marcelo 1 – Manuela 0
Ao ouvir, há minutos, a discorrência de Manuela Ferreira Leite no congresso da “jota” laranja, veio-me à ideia o Marcelo.
Não aquele que gosta de mergulhar nos cagalhões do Tejo, que lê mais de 250 livros por semana, que parece que dá (vende a bom preço) aulas de direito e pareceres jurídicos e que me obriga o fugir do canal público nos Domingos à noite; mas aquele outro Marcelo que, nos meus 20 anos, iam decorridos os finais dos anos sessenta, tentava iludir os Coitos (ou coitados) e quejandos com as tais “conversas em família”.
Nessa altura, já familiarizado com as obras proibidas do Karl e do Friedrich, do Vladimir Ilitch e do Herbert, do Jean Paul e do Louis, o tal Marcelo da dita “primavera” nunca me convenceu de que tínhamos saído da mais invernosa das ditaduras. Hoje, quarenta anos passados e continuando a manter a minha costela marxista e a minha análise dialética da história, acho - e com pena o digo - que a Manuela Ferreira Leite nem para subsecretária de estado daquela altura serviria. Nem sequer para escrever a coluna “coscuvilhices” de um antigo matutino da capital, assinada por Maria Armanda Falcão, mais conhecida por “Vera Lagoa”. Onde para o saudoso José Vilhena?
sábado, novembro 29, 2008
Dia
O relógio parou, imoral, agredindo e violentando a necessidade de um novo dia.
Peço outro sol, qualquer luz que traga delírio, gente nova, para habitar um mundo enredado por teias de aranha.
Um raio dourado, queimando a pele, ardendo nos couros, deixando um vermelho seguido por manchas.
A claridade chegando, chamando para a vida, jogando na cara a renovação.
Traiçoeiro dia, irônico que brinca com a ansiedade lançando promessas com ar descrente, falando com jeito de desmentido
Carla Bianca*
*poetisa brasileira
sexta-feira, novembro 28, 2008
Amizade
A amizade é um amor que nunca morre.
A amizade é uma virtude que muitos sabem que existe, alguns descobrem, mas poucos reconhecem.
A amizade quando é sincera o esquecimento é impossível.
A confiança, tal como a arte, não deriva de termos resposta para tudo, mas de estarmos abertos a todas as perguntas.
A dor alimenta a coragem. Você não pode ser corajoso se só aconteceram coisas maravilhosas com você.
A esperança é um empréstimo pedido à felicidade.
A felicidade não é um prémio, e sim uma consequência, a solidão não é um castigo, e sim um resultado.
A felicidade não está no fim da jornada, e sim em cada curva do caminho que percorremos para encontrá-la.
A gente tropeça sempre nas pedras pequenas, porque as grandes a gente logo enxerga.
A glória da amizade não é a mão estendida, nem o sorriso carinhoso, nem mesmo a delicia da companhia. É a inspiração espiritual que vem quando você descobre que alguém acredita e confia em você.
A infelicidade tem isto de bom: faz-nos conhecer os verdadeiros amigos.
A inteligência é o farol que nos guia, mas é a vontade que nos faz caminhar.
A maior fraqueza de uma pessoa, é trocar aquilo que ela mais deseja na vida, por aquilo que ele deseja no momento.
A persistência é o caminho do êxito.
A pior solidão é aquela que se sente na companhia de outros.
A SOLIDÃO É UMA GOTA NO OCEANO QUE SÓ OLHA PARA SI MESMA...
UMA GOTA QUE NÃO SABE QUE É OCEANO...
Amigos são a outra parte do oceano que a gota procura...
A tua única obrigação durante toda a tua existência é seres verdadeiro para contigo próprio.
A verdadeira amizade deixa marcas positivas que o tempo jamais poderá apagar.
A verdadeira amizade é aquela que não pede nada em troca, a não ser a própria amiga.
A verdadeira generosidade é fazer alguma coisa de bom por alguém que nunca vai descobrir.
A verdadeira liberdade é poder tudo sobre si.
Algumas pessoas acham-se cultas porque comparam sua ignorância com as dos outros.
Amigo de verdade é aquele que transforma um pequeno momento em um grande instante.
Amigo é a luz que não deixa a vida escurecer.
Amigo é aquele que conhece todos os seus segredos e mesmo assim gosta de você !
Amigo é aquele que nos faz sentir melhor e sobre tudo nos faz sentir amados...
Amigo é aquele que, a cada vez, nos faz entrever a meta e que percorre conosco um trecho do caminho.
Amigos são como flores cada um tem o seu encanto por isso cultive-os.
Amizade é como música: duas cordas afinadas no mesmo tom, vibram juntas...
Amizade, palavra que designa vários sentimentos, que não pode ser trocada por meras coisas materiais... Deve ser guardada e conservada no coração!!!
As pessoas entram em nossas vidas por acaso, mas não é por acaso que elas permanecem.
Celebrar a vida é somar amigos, experiências e conquistas, dando-lhes sempre algum significado.
Diante de um obstáculo não cruzes os braços, pois o maior homem do mundo morreu de braços abertos.
Elogie os amigos em público, critique em particular.
Errar é humano, perdoar é divino.
Evitar a felicidade com medo que ela acabe; é o melhor meio de ser infeliz.
Faça amizade com a bondade das pessoas, nunca com seus bens!
Felicidade é a certeza de que a nossa vida não está se passando inutilmente.
Érico Veríssimo
quinta-feira, novembro 27, 2008
Os últimos gorgolejos dos perus
O Dia de Acção de Graças, comemorado na 4ª quinta feira de Novembro, é um importante feriado celebrado nos Estados Unidos (e no Canadá) com lautos jantares, cujo prato forte é o peru. Por isso, nos dias que antecedem a festividade, dezenas de milhões de perus são mortos para abastecerem as mesas da quase totalidade dos mais de trezentos milhões de cidadãos estado-unidenses.
Dizem os apreciadores, entre os quais não me incluo, que o peru, antes de ser morto, deve ser embebedado com água-ardente, para tornar a carne mais saborosa. Desconheço se por aquelas paragens existe tal hábito e as imagens recolhidas na passada quinta feira em Anchorage - nas quais Sarah Palin, na festa do Perdão do Peru, deu uma entrevista a um canal de televisão tendo com pano de fundo um tal Joe, o matador de perus, em plena actividade - não mostram qualquer pessoa na tarefa de enfiar bagaço pelas goelas das aves.
Seja como for, ainda restam perus vivos e alguns parecem bem abastecidos de álcool, seja ele água-ardente ou Jack Daniels. Vem isto a propósito da dupla W/Condy, que desencadeou uma inesperada iniciativa na Europa, incitando os aliados da NATO a oferecerem de bandeja a qualidade de membros à Ucrânia e à Geórgia, dispensando o lento processo de adesão e o preenchimento dos necessários requisitos, entre eles a integridade territorial, numa manobra de última hora para ensombrarem, ainda mais, as relações com Moscovo e deixarem Obama sem grande margem de manobra.
Embora seja pouco provável obterem sucesso, como se pode ler aqui pelos depoimentos de várias pessoas, os últimos gorgolejos dos actuais perus da Casa Branca são de meter medo ao susto.
quarta-feira, novembro 26, 2008
uma certa quantidade
(Imagem: Porta de entrada para o mundo paralelo – Mário Ceasriny)
Uma certa quantidade de gente à procura
de gente à procura duma certa quantidade
Soma:
uma paisagem extremamente à procura
o problema da luz (adrede ligado ao problema da vergonha)
e o problema do quarto-atelier-avião
Entretanto
e justamente quando
já não eram precisos
apareceram os poetas à procura
e a querer multiplicar tudo por dez
má raça que eles têm
ou muito inteligentes ou muito estúpidos
pois uma e outra coisa eles são
Jesus Aristóteles Platão
abrem o mapa:
dói aqui
dói acolá
E resulta que também estes andavam à procura
duma certa quantidade de gente
que saía à procura mas por outras bandas
bandas que por seu turno também procuravam imenso
um jeito certo de andar à procura deles
visto todos buscarem quem andasse
incautamente por ali a procurar
Que susto se de repente alguém a sério encontrasse
que certo se esse alguém fosse um adolescente
como se é uma nuvem um atelier um astro
Mário Cesariny
terça-feira, novembro 25, 2008
Dependência do Governo
Diz-se geralmente que, em Portugal, o público tem ideia de que o Governo deve fazer tudo, pensar em tudo, iniciar tudo: tira-se daqui a conclusão que somos um povo sem poderes iniciadores, bons para ser tutelados, indignos de uma larga liberdade, e inaptos para a independência. A nossa pobreza relativa é atribuída a este hábito político e social de depender para tudo do Governo, e de volver constantemente as mãos e os olhos para ele como para uma Providência sempre presente.
Eça de Queirós, in 'Cartas de Inglaterra'
163 anos após o nascimento do autor e mais de 100 anos passados sobre a escrita das Cartas de Inglaterra, o que mudou relativamente à dependência do Governo? Mudou muito, mas para pior, pois os que defendem menos Estado são os primeiros a estender a mão ao mínimo solavanco. BPP diz alguma coisa a alguém?
segunda-feira, novembro 24, 2008
Poema do futuro
Conscientemente escrevo e, consciente,
medito o meu destino.
No declive do tempo os anos correm,
deslizam como a água, até que um dia
um possível leitor pega num livro
e lê,
lê displicentemente,
por mero acaso, sem saber porquê.
Lê, e sorri.
Sorri da construção do verso que destoa
no seu diferente ouvido;
sorri dos termos que o poeta usou
onde os fungos do tempo deixaram cheiro a mofo;
e sorri, quase ri, do íntimo sentido,
do latejar antigo
daquele corpo imóvel, exhumado
da vala do poema.
Na História Natural dos sentimentos
tudo se transformou.
O amor tem outras falas,
a dor outras arestas,
a esperança outros disfarces,
a raiva outros esgares.
Estendido sobre a página, exposto e descoberto,
exemplar curioso de um mundo ultrapassado,
é tudo quanto fica,
é tudo quanto resta
de um ser que entre outros seres
vagueou sobre a Terra.
António Gedeão
domingo, novembro 23, 2008
Não me leia assim
Não me leia com a pestana que eu não sou Mario Quintana.
Não me leia de joelhos que eu não sou Paulo Coelho.
Não me leia ensimesmado que eu não sou o Saramago.
Não me leia com teimosice que eu não sou Clarice.
Não me leia a fuzilar que eu não sou Ferreira Gular.
Não me leia como duende que eu não sou Murilo Mendes.
Não me leia de cima que eu não sou Jorge de Lima.
Não me leia com aspereza que eu não sou Cristóvão Tezza.
Não me leia de retrós que eu não sou Amós Oz.
Não me leia acurado que eu não sou Adélia Prado.
Não me leia do abacateiro que eu não sou João Ubaldo Ribeiro.
Não me leia com cara de sueco que eu não sou Umberto Eco.
Não me leia na biblioteca que eu não sou Rubem Fonseca.
Não me leia como rabino que eu não sou Fernando Sabino.
Não me leia respondão que eu não sou Ignácio de Loyola Brandão.
Não me leia furioso, ou furiosa, que eu não sou Guimarães Rosa.
Não me leia fumando cigarro que eu não sou Manoel de Barros.
Não me leia na cadeira que eu não sou Manuel Bandeira.
Não me leia na separata que eu não sou o Mario Prata.
Não me leia na Bahia que eu não sou Moacyr Scliar.
Não me leia em Praga que eu não sou Rubem Braga.
Não me leia na gráfica que eu não sou Kafka.
Não me leia com ares de estudo que eu não sou Câmara Cascudo.
Não me leia em celibato que eu não sou Monteiro Lobato.
Não me leia fazendo pose que eu não sou Alfredo Bosi.
Não me leia a arquejar que eu não sou Fabrício Carpinejar.
Não me leia tão quieto que eu não sou João Cabral de Melo Neto.
Não me leia bebendo uísque que eu não sou Paulo Leminski.
Não me leia mais... que eu não sou Vinicius de Moraes.
Não me leia como se eu não fosse eu... ou Casimiro de Abreu.
Não me leia agora que eu já vou embora.
Não me leia rindo que eu já estou indo.
Não me leia correndo que eu não sou referendo.
Não me leia pedindo justiça que eu não sou dobradiça.
Não me leia hoje antes que eu fuja.
Gabriel Perissé*
*professor e escritor
Publicado no jornal digital Correio da Cidadania
sábado, novembro 22, 2008
sexta-feira, novembro 21, 2008
“Basta!”
“Seven years of waiting for our legal system to give them an answer to their legal question is enough”.
Foi com as palavras acima citadas, que não constam da sentença “oficial”, que o juiz Richard J. Leon, do Tribunal Federal, em Washington, ordenou ontem a libertação imediata de 5 argelinos detidos em Guantánamo desde Janeiro de 2002.
Conservador, nomeado por George W. Bush, o juiz Leon fez uma enérgica acusação às decisões de detenção da administração Bush e deu um inquestionável testemunho da importância de permitir aos juízes federais avaliar as provas secretas do governo utilizadas para justificar as detenções, o que constitui um enorme revés para o Mr. W.
E não se ficou por aqui, o juiz. Numa outra atitude extraordinária, instou o Departamento de Justiça a não recorrer da sua sentença, porque “sete anos à espera...é suficiente”.
quinta-feira, novembro 20, 2008
A negritude e a liberdade
Enquanto o mundo inteiro comemora a chegada do primeiro negro ao posto de presidente dos Estados Unidos e muitos refletem sobre as conseqüências disso para a América do Norte e para o mundo, o Brasil recorda a figura de Zumbi, líder negro do Quilombo dos Palmares, assassinado no dia 20 de novembro de 1697. Ele teve a sua cabeça exposta em um poste, numa praça do Recife, para que ninguém mais ousasse liderar um quilombo ou pretendesse ajudar os escravos a serem livres. Ao invés de pôr fim às lutas pela liberdade, a morte de Zumbi, ao contrário, suscitou da parte de muitos escravos a consciência de que não poderiam deixar que a morte desse grande chefe fosse inútil. A memória do seu martírio se tornou incentivo para que negros, índios e brancos se unissem em torno de um projeto de igualdade humana e de um Estado cujas raças e etnias pudessem ser cidadãs de pleno direito. Até hoje, esta democracia racial plena não é um direito adquirido. No Brasil, as pessoas de raça negra ainda têm menos condições de acesso à educação, ao trabalho remunerado e à plena cidadania. E não só isso. José Vicente, reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, em São Paulo, afirma: "A cor negra da pele de homens e mulheres, assim como sua raça e cultura próprias, foram motivos de crueldade humana e de barbárie que mancharam e continuam manchando a dignidade da humanidade"
A reflexão é de Marcelo Barros, monge beneditino e escritor brasileiro, e pode ser lida no jornal online Adital, onde também se encontram outros artigos de opinião sobre Zumbi dos Palmares, como Valeu Zumbi!, da jornalista Elaine Tavares, ou Zumbi dos Palmares liderou a 1ª experiência democrática do Brasil, de Ismar C. de Souza, militante do movimento negro e jornalista free lancer.
quarta-feira, novembro 19, 2008
Disse, está dito!
“Quando não se está em democracia é outra conversa, EU digo como é que é e faz-se”; “E até não sei se a certa altura não é bom haver seis meses sem democracia, mete-se tudo na ordem e depois, então, venha a democracia”.
Foi isto o que eu ouvi MFL dizer, com a maior das calmas, entre outras barbaridades, e até me ia engasgando com a sopa.
Não se tratou de palavras ditas “no calor da luta política”, como concedeu Marcelo, apoiante incondicional deste abencerragem. Foram lidas (pelo menos tinha papéis na estante) na calma de um pós almoço na Câmara do Comércio Luso-Americana e, a menos que tenha decidido seguir na peugada do seu ídolo ajardinado, sabia muito bem o que dizia.
Também não foi uma afirmação “irónica”, como veio defender o vassalo Guedes. Para além de não haver qualquer ironia na afirmação, também não a havia na voz.
Ainda menos acredito que “não pode ter querido dizer aquilo que disse”, ao contrário do que defendeu o seu antigo adversário Coelho, o Passos. Quando se lê algo que se escreveu (e, de tão mau, teve de ser escrito por ela), não há lugar para equívocos.
MFL é mesmo assim, uma espécie de múmia cristalizada no tempo da outra senhora, uma pretensa economista que da economia tem a percepção de um contabilista (com o devido respeito para com estes últimos, que têm uma profissão importante na sociedade). A mensagem dela não passa, porque não pode passar algo que inexiste, mesmo que toda a comunicação social fosse sua lacaia, longe vá o agoiro.
MFL não deixou de ter condições de liderar o maior partido da oposição pelo que ontem afirmou; ela nunca teve condições de liderar o que quer que fosse, talvez com a excepção de umas folhas do Balanço e de Ganhos e Perdas. Perdem todos o que acreditam na democracia, mesmo numa democracia burguesa com as falhas que a nossa tem tido; e o Sócrates também ganha, pois bem pode descansar de uma oposição que se opõe a si própria.
terça-feira, novembro 18, 2008
Light my fire
O cara chega ao escritório cantarolando um clássico do The Doors - mas isso é uma provocação, por favor, não faz! Ela, que sempre adorou o Jim Morrison com aquele timbre poderoso de contrabaixo e um embalo meio jazzístico. Aquele jeito malvado num rosto de menino.
Quando a amiga lhe disse ao telefone “o Jim tá morto, morreu de overdose, na banheira”, tirou o jeans preto do armário, fez voto de silêncio, e pelo resto do mês desfilou seu luto. Até pra morrer o filho da mãe inventa um estilo. Afinal, não é o que importa? Ter estilo?
Ela era tão nova. E boba. Bobinha. Na cabeceira da cama, onde deveria impor-se um crucifixo de conter a libido mal domada das mocinhas, vigiava o ídolo. Tinha noites em que o roqueiro voltava do além via pôster fazendo-a despertar inteira.
Bom, quando o monumento entra embalando a voz “vem bebê acender o meu fogo”, numa onda tipo não sei de nada, ela se faz tocha de incendiar caminhos - vem por aqui, por aqui - ou um interruptor capaz de ativar milhões de watts em testosterona.
Aí, fica difícil... Vai concentrar no trabalho, vai, uma falação medonha, quanta miudeza boa pra se guardar num armarinho. E ela ali - mulher, teu nome é paciência - num esforço capricorniano mantém a pose profissional o quanto pode. Transbordando The Doors por entre frestas e aberturas.
Algumas vezes, o que temos de melhor é a memória. A loira lembrou de coisas no momento em que despachava assuntos. O sabor retornando à rosa boca. A boca que se impôs. Absoluta. No sexo absoluto dele. E enquanto a cabeça era empurrada repetidas vezes sufocando-a em direção ao todo, suas narinas se dilatavam num esforço de guardar-lhe o almíscar.
Lembrou tantas bobagens ao encará-lo de frente... Deliciosamente burra durante o expediente.
Myrian Beck
Publicado no jornal digital VIAPOLÍTICA
segunda-feira, novembro 17, 2008
domingo, novembro 16, 2008
Biografias
Creio que todas as palavras que vamos pronunciando, todos os movimentos e gestos, concluídos ou somente esboçados, que vamos fazendo, cada um deles e todos juntos, podem ser entendidos como peças soltas de uma autobiografia não intencional que, embora involuntária, ou por isso mesmo, não seria menos sincera e veraz que o mais minucioso dos relatos de uma vida passada à escrita e ao papel. Esta convicção de que tudo quanto dizemos e fazemos ao longo do tempo, mesmo parecendo desprovido de significado e importância, é, e não pode impedir-se de o ser, expressão biográfica, levou-me a sugerir um dia, com mais seriedade do que à primeira vista possa parecer, que todos os seres humanos deveriam deixar relatadas por escrito as suas vidas, e que esses milhares de milhões de volumes, quando começassem a não caber na Terra, seriam levados para a Lua. Isto significaria que a grande, a enorme, a gigantesca, a desmesurada, a imensa biblioteca do existir humano teria de ser dividida, primeiro, em duas partes, e logo, com o decorrer do tempo, em três, em quatro, ou mesmo em nove, na suposição de que nos oito restantes planetas do sistema solar, houvesse condições de ambiente tão benévolas que respeitassem a fragilidade do papel. Imagino que os relatos daquelas muitas vidas que, por serem simples e modestas, coubessem em apenas meia dúzia de folhas, ou ainda menos, seriam despachados para Plutão, o mais distante dos filhos do Sol, aonde de certeza raramente quereriam viajar os investigadores.
Decerto se levantariam problemas e dúvidas na hora de estabelecer e definir os critérios de composição das ditas “biobliotecas”. Seria indiscutível, por exemplo, que obras como os diários de Amiel, de Kafka ou de Virginia Woolf, a biografia de Samuel Johnson, a autobiografia de Cellini, as memórias de Casanova ou as confissões de Rousseau, a par de tantas outras de importância humana e literária semelhante, deveriam permanecer no planeta onde haviam sido escritas para que fossem testemunho da passagem por este mundo de homens e mulheres que, pelas boas ou más razões do que tinham vivido, deixaram um sinal, uma presença, uma influência que, tendo perdurado até hoje, continuarão a deixar marcadas as gerações vindouras. Os problemas surgiriam quando sobre a escolha do que deveria ficar ou enviar ao espaço exterior começassem a reflectir-se as inevitáveis valorações subjectivas, os preconceitos, os medos, os rancores antigos ou recentes, os perdões impossíveis, as justificações tardias, tudo o que na vida é assombração, desespero e agonia, enfim, a natureza humana. Creio que, afinal, o melhor será deixar as coisas como estão. Como a maior parte da melhores ideias, também esta minha é impraticável. Paciência.
José Saramago
Publicado em O Caderno de Saramago
Felizes 86 anos, José!
sábado, novembro 15, 2008
sexta-feira, novembro 14, 2008
Ser Independente da Opinião Pública
Ser independente da opinião pública é a primeira condição formal para realizar qualquer coisa grandiosa ou racional, tanto na vida como na ciência. Com o tempo, este feito será seguramente reconhecido pela opinião pública, que na altura conveniente o transformará em mais um dos seus preconceitos.
Georg Hegel, in 'Filosofia do Direito'
quinta-feira, novembro 13, 2008
Os Convencidos da Vida
Todos os dias os encontro. Evito-os. Às vezes sou obrigado a escutá-los, a dialogar com eles. Já não me confrangem. Contam-me vitórias. Querem vencer, querem, convencidos, convencer. Vençam lá, à vontade. Sobretudo, vençam sem me chatear.
Mas também os aturo por escrito. No livro, no jornal. Romancistas, poetas, ensaístas, críticos (de cinema, meu Deus, de cinema!). Será que voltaram os polígrafos? Voltaram, pois, e em força.
Convencidos da vida há-os, afinal, por toda a parte, em todos (e por todos) os meios. Eles estão convictos da sua excelência, da excelência das suas obras e manobras (as obras justificam as manobras), de que podem ser, se ainda não são, os melhores, os mais em vista.
Praticam, uns com os outros, nada de genuinamente indecente: apenas um espelhismo lisonjeador. Além de espectadores, o convencido precisa de irmãos-em-convencimento. Isolado, através de quem poderia continuar a convencer-se, a propagar-se?
(...) No corre-que-corre, o convencido da vida não é um vaidoso à toa. Ele é o vaidoso que quer extrair da sua vaidade, que nunca é gratuita, todo o rendimento possível. Nos negócios, na política, no jornalismo, nas letras, nas artes. É tão capaz de aceitar uma condecoração como de rejeitá-la. Depende do que, na circunstância, ele julgar que lhe será mais útil.
Para quem o sabe observar, para quem tem a pachorra de lhe seguir a trajectória, o convencido da vida farta-se de cometer «gaffes». Não importa: o caminho é em frente e para cima. A pior das «gaffes», além daquelas, apenas formais, que decorrem da sua ignorância de certos sinais ou etiquetas de casta, de classe, e que o inculcam como um arrivista, um «parvenu», a pior das «gaffes» é o convencido da vida julgar-se mais hábil manobrador do que qualquer outro.
Daí que não seja tão raro como isso ver um convencido da vida fazer plof e descer, liquidado, para as profundas. Se tiver raça, pôr-se-á, imediatamente, a «refaire surface». Cá chegado, ei-lo a retomar, metamorfoseado ou não, o seu propósito de se convencer da vida - da sua, claro - para de novo ser, com toda a plenitude, o convencido da vida que, afinal... sempre foi.
Alexandre O'Neill, in "Uma Coisa em Forma de Assim"
Retirado do Citador
quarta-feira, novembro 12, 2008
Os Deuses de Hoje
(Segundo soneto)
É preciso que a música aparente
no vaso harmonizado pelo oleiro
seja perfeitamente consistente
com o gesto interior, seu companheiro
e fazedor. O vaso encerra o cheiro
e os ritmos da terra e da semente
porque antes de ser forma foi primeiro
humildade de barro paciente.
Deus, que concebe o cântaro e o separa
da argila lentamente, foi fazendo
do meu aprendizado o Seu compêndio
de opacidades cada vez mais claras,
e com silêncios sempre mais esplêndidos
foi limando, aguçando o que escutara.
Bruno Tolentino
terça-feira, novembro 11, 2008
As letras do riso
Li há muito tempo, não sei onde, que podemos rir em diferentes letras.
Quem ri em A ri o riso solto, franco, generoso, como se cantasse em dia de sol, de peito aberto, braços abertos, coração aberto, gargalhada aberta. Riso em A pode virar riso em K, kakakaka! Ou em H aspirado, hahahahaha! Gargalhar com a garganta e com a alma.
Outro tipo de riso é o riso em E. Malicioso riso, um tanto triste, porque é riso de quem ri da humanidade, esquecendo-se, o gozador, que todos à humanidade pertencemos. Riso meio cínico, se é que existe meio cinismo. Riso de quem pensa que tem tudo e por isso ri de quem nada tem. Riso em tom menor, riso que ri da dor alheia, mas é sintoma de outra dor, oculta dor.
O riso em I é riso ingênuo, tímido, fino riso de quem tem medo de rir. Riso talvez bobo, envergonhado riso, riso que ri à toa, sem muita graça, ri para mostrar que sabe rir. Riso com receio de ser ilícito, riso implícito, riso solícito, bondoso, bondoso até demais. Sub-riso. Sorrisinho. Riso escondido de si mesmo, riso preso, riso que até parece choro magoado.
Há aqueles que riem em O, riso de Papai Noel, riso gordo, riso corajoso, orgulhoso da arte de rir, riso poderoso, abastoso, copioso, incopiável. Riso redondo, que vai rolando e se desenrolando como tapete a convidar para a festa sem fim, para o mundo melhor, para a alegria sincera. Riso bonachão, luminoso, afetuoso, amoroso, caloroso, riso que entrega uma rosa para a criança doente, riso delicioso como um doce.
O riso em U, hipócrita riso, misantropo riso, inescrupuloso riso. Riso do mal. Riso sádico. Riso irresponsável. Riso que humilha, tortura, machuca, tritura. Riso azedo que ri da amargura alheia. Riso que não ouve, não fala, não responde. Riso rude, ruim, sem rosto.
Mas existe riso para além das vogais. Podemos rir em diversas consoantes.
Rir em X. Riso enigmático, boca fechada, olhos faiscando.
Rir em L. Riso lateral, prometendo não se sabe o quê.
Rir em S. Riso sinuoso, melífluo riso, só uns poucos entendem sua mensagem.
Rir em V. Riso da vitória, que pode ser riso em W, se forem duas pessoas rindo de mãos dadas.
Risos vários. É preciso alfabetizar-se para entender o humor de cada um.
Gabriel Perissé*
*professor e escritor
Publicado no jornal digital Correio da Cidadania
segunda-feira, novembro 10, 2008
Cogito
Eu sou como eu sou
Pronome
Pessoal intransferível
Do homem que iniciei
Na medida do impossível
Eu sou como eu sou
Agora
Sem grandes segredos dantes
Sem novos secretos dentes
Nesta hora
Eu sou como eu sou
Presente
Desferrolhado indecente
Feito um pedaço de mim
Eu sou como eu sou
Vidente
E vivo tranqüilamente
Todas as horas do fim
Torquato Neto*
*poeta brasileiro
domingo, novembro 09, 2008
O caminhoneiro boémio
Um caminhoneiro alegre era o Tonhão. Levava sempre na cabina do seu Fenemê um violão, que dedilhava todas as noites acompanhando a cantoria dos companheiros nos postos de gasolina das estradas onde pernoitavam.
Na Rio-Bahia, na Fernão Dias, nas estradas goianas ou do sul, todo mundo conhecia o Tonhão, gostava dele e achava bom quando coincidia de passar a noite no mesmo posto de gasolina. Iam para o bar, a cerveja corria solta (“só à noite”, aconselhava ele, “nada de beber antes de dirigir”) e a música também. Boleros e sambas-canções enchiam o ar com músicas que quase sempre falavam de amor ou de saudade.
Mas, quando chegava em casa, numa cidade pequena do interior de São Paulo, logo depois de matar a saudade da família, Tonhão ficava doido para viajar de novo, seu romantismo parece que terminava.
O problema era a falta de vida noturna que era obrigado a ter, quando estava em casa. Na sua cidade, nove horas da noite já não tinha ninguém na rua. Só alguns “boêmios”. E ele gostava da vida de boemia de verdade, de ficar até tarde bebendo cerveja, tocando seu violão e cantando.
Os seus amigos gostavam quando ele chegava, mas logo a mulher começava a lhe falar para não chegar tarde em casa. Aquelas coisas de sempre. Ele ia para um bar, se embalava na música e na cerveja, e nunca chegava antes da meia-noite em casa. Aí, era aquela briga!
Um fim de tarde, fazia uma semana que tinha chegado de viagem e esperava carga para viajar de novo, antes do jantar a mulher já foi lhe avisando:
- Se for para chegar de madrugada em casa hoje, não precisa nem voltar. Pode ir embora.
E o Tonhão saiu só para dar uma voltinha à noite, com intenção de tomar um arzinho e voltar. Mas, no bar da praça, encontrou o Zico, que ele considerava “o melhor cantor das músicas do Nelson Gonçalves”.
Topou acompanhar o Zico “só numa música”. E tomou um copinho de cerveja. Aí veio mais uma música, mais uma cerveja... Quando viu era quase uma hora da manhã.
Foi embora preocupado e, à uma hora em ponto, entrou em casa devagarzinho, silencioso para não acordar a mulher. Tirou a roupa e entrou com cuidado debaixo das cobertas, ao lado da esposa e dormiu. Cedinho, sentiu um chacoalhão. Abriu os olhos, era a mulher furiosa:
- Que hora você chegou essa noite, hem?
- Dez horas – disse, sabendo que normalmente a essa hora a mulher já devia estar dormindo.
- Mentiroso! Pensa que eu não vi? Quando você entrou, o relógio da igreja estava batendo uma hora! Uma hora, viu?
- Uai, o que é que você queria? Que ele batesse no zero também?
Mouzar Benedito
Publicado no jornal digital VIAPOLÍTICA
sábado, novembro 08, 2008
Os 12 trabalhos de W.
Como é pouco crível que alguém esteja disposto a esportular várias dezenas de euros para ouvir barbaridades, é muito improvável que o Mr. W. venha a ter algum sucesso como conferencista.
Mas o ainda inquilino da Casa Branca não tem de se preocupar a procurar trabalho, já que o jornalista do The Guardian Tim Dowling, com o refinado humor que lhe é peculiar, já elaborou uma lista de vários empregos, adequados ao gosto por desafios do “talentoso” sujeito.
Embora restrita, a proposta abrange uma dúzia de cargos, desde líder da Coreia do Norte a estrela do musical W, passando por ministro do interior do Irão ou por melhor amigo de Paris Hilton.
sexta-feira, novembro 07, 2008
Reinvenção
A vida só é possível
reinventada.
Anda o sol pelas campinas
e passeia a mão dourada
pelas águas, pelas folhas...
Ah! tudo bolhas
que vem de fundas piscinas
de ilusionismo... - mais nada.
Mas a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.
Vem a lua, vem, retira
as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços
cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira
da lua, na noite escura.
Não te encontro, não te alcanço...
Só - no tempo equilibrada,
desprendo-me do balanço
que além do tempo me leva.
Só - na treva,
fico: recebida e dada.
Porque a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.
Cecília Meireles*
*poetisa brasileira
quinta-feira, novembro 06, 2008
Sacode as nuvens
Sacode as nuvens que te poisam nos cabelos,
Sacode as aves que te levam o olhar.
Sacode os sonhos mais pesados do que as pedras.
Porque eu cheguei e é tempo de me veres,
Mesmo que os meus gestos te trespassem
De solidão e tu caias em poeira,
Mesmo que a minha voz queime o ar que respiras
E os teus olhos nunca mais possam olhar.
Sophia de Mello Breyner
quarta-feira, novembro 05, 2008
Esperança
A vitória de Obama, por margem esmagadora em número de votos do Colégio Eleitoral e por margem bem confortável em termos de percentagem, representou a derrota da politica mais rasteira, violenta e hipócrita.
Seria utópico pensar que tudo mudou de repente, já que a evolução das mentalidades demora gerações e o povo dos Estados Unidos, como qualquer povo, não passou a ser sábio da noite para o dia e a ideologia continua bem viva.
Mas, se o novo Presidente do país mais poderoso do mundo conseguir que, a pouco e pouco, os Estados Unidos:
*Deixem de portar-se como donos do mundo e olhem para os outros países em pé de igualdade;
*Deixem de interferir na vida dos povos, em qualquer parte do mundo e sobretudo na América Latina, para que cada povo tome o rumo que melhor se adaptar aos seus anseios, em liberdade e em paz;
*Levantem o bloqueio a Cuba;
*Saiam tão cedo quanto possível dos lodaçais do Iraque e do Afeganistão;
*Resolvam diplomaticamente o problema do Irão;
*Convençam o aliado israelita de que a única forma de viver em paz é partilhar a terra com os palestinos;
*Reconheçam que a Rússia tem justas pretensões a desempenhar um papel relevante no mundo e que deve ser um parceiro, não um inimigo;
*Passem a respeitar os direitos humanos, que tanto apregoam, em todas as partes do globo e não apenas onde lhes dá jeito;
*Se submetam ao TPI;
*Comecem a prestar atenção às alterações climáticas;
*Encarem de frente a crise financeira mundial, começando por punir exemplarmente os predadores de Wall Street;
*E se tornem num país socialmente mais equilibrado, com garantias de acesso à educação e à saúde para todos os cidadãos....
...terá valido a pena ter concretizado um sonho de 40 anos.
terça-feira, novembro 04, 2008
Rondó da Liberdade
É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.
Há os que têm vocação para escravo,
mas há os escravos que se revoltam contra a escravidão.
Não ficar de joelhos,
que não é racional renunciar a ser livre.
Mesmo os escravos por vocação
devem ser obrigados a ser livres,
quando as algemas forem quebradas.
É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.
O homem deve ser livre...
O amor é que não se detém ante nenhum obstáculo,
e pode mesmo existir quando não se é livre.
E no entanto ele é em si mesmo
a expressão mais elevada do que houver de mais livre
em todas as gamas do humano sentimento.
É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.
Carlos Marighella*
*poeta e político brasileiro, assassinado em São Paulo pela Junta Militar, em 4 de Novembro de 1969.
segunda-feira, novembro 03, 2008
Palavra
Uma palavra pode ser proferida
E esquecida com o tempo
Outra pode ser aquecida e sentida
Além da eternidade
Uma palavra pode ser mantida
Pode ser vencida
Pode ser transformada
Pode ser omitida
Pode ser deturpada
Pode ser lembrada
Uma palavra
Afasta o homem da ignorância
Aponta a saída do labirinto
Fantasiosa ou realista
Carrega vida em seu sentido
Uma palavra
Quando lançada
Não tem rumo
Não tem caminho certo
Trilha ao impulso do vento
E na velocidade do pensamento
Segue firme, vaga e veloz
Como uma flecha
Pode destronar uma certeza
E como uma chama
Pode transformar corações em brasa
Uma palavra
Simples e inútil
Pode mudar o mundo
Pode ultrapassar uma crença
Pode desatar nós e preconceitos
Pode vencer uma guerra
Aquela mesma palavra
Esquecida em meio a tantas outras
Na página amarelada de um livro qualquer
Pode ser a salvação
Ou a perdição
Na vida de alguém
Uma simples e imperfeita
Palavra
Bernardo Almeida*
*poeta brasileiro
domingo, novembro 02, 2008
E se insistir?
Dona Odualda recebeu um dinheirinho de herança e resolveu comprar uma casa no interior de Goiás, onde poderia criar com todo o cuidado suas duas jóias, Odarcy e Oderly, mocinhas de corpo bem feito, rostos bonitos e muita sensualidade esparramada pelo corpo inteiro. Viúva, com as duas filhas moças, ela não pôde escolher muito, comprou a primeira casa que lhe apareceu por preço razoável. Só tinha um detalhe: era a principal casa de prostituição da cidade.
Muitos fregueses das antigas moradoras apareciam todas as noites na casa da dona Odualda, a fim de dar uma trepadinha.
Um dia, apareceu na porta da casa uma plaquinha escrita com letras tortas:
“Casa de família.
Não insista.”
Mouzar Benedito
Publicado no jornal digital VIAPOLÍTICA
sábado, novembro 01, 2008
Dedicatória
Leões passeiam sua juba imponente
à frente de teu esquálido esqueleto.
És um pedinte que tem fome,
sarnento fraldiqueiro, um cão sem nome?
Serás um homem? Um caniço pensante?
Um bípede sem penas, ou um rinoceronte apenas?
Sofres de angústia existencial ou medo, simplesmente?
És um obreiro do transcendental
ou só um inocente?
Benedicto Ferri de Barros*
*poeta brasileiro
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