How many times must a man look up, Before he can see the sky? How many ears must one man have, Before he can hear people cry? The answer, my friend, is blowin' in the wind. The answer is blowin' in the wind.
sábado, junho 30, 2012
Ânfora fui
Ânfora fui;
O seu
cadáver sou.
Emparedada
neste museu,
Pasto do pó
e dos olhares
Que não
perscrutam a minha mágoa,
Eu sou quem
fui,
Menos o fim
que alguém me deu,
De conter
vinho e mel e água...
Enfim, eu
não sou nada,
Que há muito
já se não propaga a mim
O calor de
uma anca,
E o meu
fresco conteúdo
Não encontra
uma boca
E uma sede
não estanca.
Do oleiro
que me fez
- A poeira,
talvez
Dispersa e
reunida,
A contenha
outra vida
Ou outra
ânfora... -
Nem memória
persiste do seu nome.
(poeta
português falecido em Lourenço Marques faz hoje 53 anos)
sexta-feira, junho 29, 2012
Caras Sujas
Ao longo
destas avenidas, 
recordação
de velhas lendas, 
cantam as
chácaras floridas 
com suas
líricas vivendas. 
Lá dentro,
há risos, jogos, danças, 
crástinas,
módulas fanfarras, 
um
pandemônio de crianças, 
um
zangarreio de cigarras. 
Fora,
penduram-se na grade 
os pobres,
como gafanhotos; 
têm dos
outros a mesma idade. 
mas estão
pálidos e rotos. 
Chora a
injustiça da cidade 
na cara suja
dos garotos.
(poeta
paulista nascido faz hoje 122 anos)
quinta-feira, junho 28, 2012
Tarde demais
Era frio, muito frio.
Frio na tarde, frio em mim.
Olhos em pranto,
Alma em desencanto,
Parti a caminhar.
E no melancólico crepúsculo,
Ouvi uma voz que dizia:
Esqueça!
Continuei a caminhada.
Era noite, muito noite então.
Estrelas perfilavam o firmamento,
Num brilho nostálgico o solitário.
E dentro da noite vazia,
Rosto banhado em luar,
Ouvi outra voz que dizia:
Perdoa!
Prossegui a cavalgada.
E já não havia mágoa
E nem mais ressentimento.
Foi quando então o coração falou:
Volta!
Voltei.
Mas era tarde,
Muito tarde então.
Nunca mais o encontrei! 
(poetisa paulista que hoje faz 80 anos)
quarta-feira, junho 27, 2012
A opinião de Sileno
Estranho inseto esse,
chamam-no, ao que parece,
homem, pessoa ... Passa
como quem quer voltar,
ave de arribação, mas que arrastasse
pedaços sem valia, como à cata
de algum modo de uni-los, dar-lhes forma
ou voz, talvez. No eco
para às vezes um pouco, conhecendo,
incapaz de salvar. Não tem um rosto,
tem mil cintilações e uma garganta
incompreensível, que escurece, e sempre
mais relutante. Cai,
e não raro tão perto
que chega a parecer conciliado;
não tarda muito a recobrar o rictus
que o põe aquém das coisas,
muro sob heras secas.
E continua a cavalgada em círculos
que não completa nunca.
Como os troncos mais duros buscam leito,
assim deita-se ele, mas sem força,
vazio de fragor e alheio à terra.
De um murmúrio sombrio ficam folhas
novas, iguais às outras,
limando o velho sol. Que nunca inteira
se apaga a chama escura.
Mas por que me interrogas
sobre o bicho estrangeiro irmão dos Fados,
como se dele eu visse
mais do que a dor que o cega ou a loucura
que o ordena e vai cumprindo ...?
(poeta carioca falecido faz hoje 5 anos)
terça-feira, junho 26, 2012
segunda-feira, junho 25, 2012
A Linha Imaginária
Vida suplementar,
tão próxima de ti,
tão evidente,
nas dobras deste enigma sereno.
Um pensamento só, voltar à infância, 
um desejo qualquer, basta a esperança, 
e refloresces em dádivas e gestos.
Este braço de mar é teu, - podes guardá-lo,
esta paz,
este azul,
este piano,
esta nesga de céu que o vento espalha.
Tudo tão próximo de ti,
tão ligado ao teu cotidiano,
ao teu suor diurno,
às tuas vigílias,
às tuas palavras que emprestas
uma outra significação.
Só agora percebes
a tua absurda neutralidade
diante deste fim de tarde,
deste sino que é a tua primeira
e única
memória musical,
desta noite,
caindo leve
sobre a tua cidade.
Só agora buscas o espelho
que procuravas evitar,
só agora tentas restabelecer
todos os elos que ainda justificam tua mísera existência,
reconstituir todos os fatos,
- mesmo os não evidentes -
o Fiat,
a Paixão,
os elementos,
o riso do amigo mais amado.
Só agora te permites a inutilidade
deste gesto fraterno;
só agora ousas confessar
a saudade
que há tanto tempo agasalhaste na sombra,
- de ti mesmo,
- dos teus brinquedos favoritos,
- da mansa voz
do teu primeiro amor.
Só agora te serves desta aurora,
tão próxima de ti,
tão evidente,
nas dobras deste enigma sereno. 
(poeta paraense nascido faz hoje 92 anos)
domingo, junho 24, 2012
Guimarães, a
eucaliptal cidade
Apesar de
conhecer muito bem Guimarães decidi marcar 3 noites num hotel da cidade, para
ver o que é uma Capital Europeia da Cultura, quando estiver a passar parte das
minhas férias na minha terra natal, em Ponte de Lima.
Ao saber que
a eucaliptal figura de Belém foi agraciada com a medalha da cidade, fico com
uma dúvida atroz: não vou porque ou vou apesar de?
sábado, junho 23, 2012
sexta-feira, junho 22, 2012
quinta-feira, junho 21, 2012
quarta-feira, junho 20, 2012
O tempo o homem                               
O tempo faz o homem que faz o tempo
                                               
Faz tempo
O homem que constrói o tempo
                         
Que destrói o homem
                        
                      Só a Era
faz-se
Heras destruindo o tempo o homem
       a casa
             velhas
paredes
                                 azulejos
                                           
limo
A Ampulheta: o testemunho, a arte
                                             Os ciclos, os
séculos
A hera decora o muro
O tempo decora o homem
que colora o tempo
                     
descolora
Só o artista faz a Hora
(poeta paraense que hoje faria 86 anos)
terça-feira, junho 19, 2012
insólito
contato é impudicícia ou carência de tato 
gesto que sai do corpo como um salto de gato 
suave rude ardil ou busca de gozo 
rei dos sentidos empós do amor ou do afeto 
sondagem de quem sonhou e argui de fato 
a empáfia escondida entre haustos do só 
não temer o impacto da astúcia 
colher a rosa no ramo propício enquanto é vermelha 
e saborear o odor a cor o íntimo calor 
é tarde é breve mas intensa de brilho 
signo de infinito clamor 
que não calou no estamento do tempo
e rói fundo o apetite que resta 
via possível na corrosão do palor 
e usá-la a furto oculto 
imponderada lapela 
fim ou princípio 
sorte lançada 
defasado cupido
(poeta mineiro que hoje faz 84 anos)
segunda-feira, junho 18, 2012
Passado,
Presente, Futuro
Eu fui. Mas
o que fui já me não lembra: 
Mil camadas
de pó disfarçam, véus, 
Estes
quarenta rostos desiguais. 
Tão marcados
de tempo e macaréus. 
Eu sou. Mas
o que sou tão pouco é: 
Rã fugida do
charco, que saltou, 
E no salto
que deu, quanto podia, 
O ar dum
outro mundo a rebentou. 
Falta ver,
se é que falta, o que serei: 
Um rosto
recomposto antes do fim, 
Um canto de
batráquio, mesmo rouco, 
Uma vida que
corra assim-assim.
(José
Saramago faleceu faz hoje 2 anos)
domingo, junho 17, 2012
em folhas de
acetato me proteges
em folhas de
acetato me proteges
floresço em
avenida litoral
breve serei
semente um céu e a terra
plantado
azul e sopro de marés
as palavras
fechadas com o jeito
que a boca
tem ao ver-se
retratada
quase um
sabor razão acidulada
me persegues
de nomes, me retratas
igual ao
branco hotel onde regressa
a não
lembrada sombra do verão
e pousam de
ouro em água o só
engano breve
das rosas e
da neve despertadas.
(poeta
viseense que hoje faz 68 anos)
sábado, junho 16, 2012
Ladaínha horizontal
Como se fossem jangadas 
desmanteladas, 
vogam no mar da memória 
as camas da minha vida ... 
Tanta cama! Tanta história! 
Tanta cama numa vida! 
Grabatos, leitos, divãs, 
a tarimba do quartel; 
e no frio das manhãs 
lívidas camas de hotel .. 
Ei-las vogando as jangadas 
desmanteladas, 
todas cobertas de escamas 
e do sal do mar da vida ... 
Tanta cama! Tantas camas! 
Tanta cama numa vida! 
Já os lençóis amarrados 
tocam no centro da Terra 
(que o reino dos desesperados 
fica no centro da Terra!) 
e os cobertores empilhados 
são monte que não se alcança! 
Só as tábuas das jangadas 
desmanteladas 
bóiam no mar da lembrança 
e no remorso da vida ... 
Homem sou. Já fui criança. 
Tanta cama numa vida! 
Nem vão ao fundo as de ferro, 
nem ao céu as de dossel. .. 
Lembro-vos, camas de ferro 
de internato e de bordel, 
gaiolas da adolescência, 
ginásios do amor venal! 
Barras fixas. Imprudência. 
Sem rede, o salto mortal 
pra fora da adolescência ... 
E confundem-se as jangadas 
desmanteladas 
no mar da reminiscência ... 
Onde estás, ó minha vida? 
Sono. Volúpia. Doença. 
Tanta cama numa vida! 
E recordo-vos, tão vagas, 
vós que viestes depois, 
ó camas transfiguradas 
das furtivas ligações! 
Camas dos fins-de-semana, 
beliches da beira-mar ... 
Oh! que arrojadas gincanas 
sobre os altos espaldares! 
E as camas das noites brancas, 
tão brancas!, tão tumulares! 
Cigarros. Beijos. Uísque. 
Ó fragílimas jangadas, 
desmanteladas ... ! 
E nelas há quem se arrisque 
sobre os pélagos da vida! 
Cigarros. Beijos. Uísque. 
Tanta cama numa vida! 
E o amor? Tálamo, templo, 
conjugação conjugal .. 
O amor: tálamo, templo 
- ilha num mar tropical. 
Mas ao redor, insistentes, 
bramam as ondas do mar, 
do mar da memória ardente, 
eternamente a bramar ... 
Já no frio dos lençóis 
há prelúdios da mortalha; 
e, nas camas, sugestões 
fúnebres, torvas, pesadas ... 
- Sede, por fim, ó jangadas 
desmanteladas, 
a ponte do esquecimento 
prà outra margem da Vida! 
Sede flecha, monumento, 
ponte aérea sobre o Tempo, 
redentora madrugada! 
Se o não fordes, sereis nada, 
jangadas 
desmanteladas, 
todas roídas de escamas 
da margem de cá da Vida ... 
Pobres camas! Tristes camas! 
Tanta cama numa vida!
(David-Mourão Ferreira faleceu faz hoje 16 anos)
sexta-feira, junho 15, 2012
Encontro
Que vens
contar-me 
se não sei
ouvir senão o silêncio? 
Estou parado
no mundo. 
Só sei
escutar de longe 
antigamente
ou lá para o futuro. 
É bem certo
que existo: 
chegou-me a
vez de escutar. 
Que queres
que te diga 
se não sei
nada e desaprendo?
A minha paz
é ignorar. 
Aprendo a
não saber: 
que a
ciência aprenda comigo 
já que não
soube ensinar. 
O meu
alimento é o silêncio do mundo 
que fica no
alto das montanhas 
e não desce
à cidade 
e sobe às
nuvens que andam à procura de forma 
antes de
desaparecer. 
Para que
queres que te apareça 
se me agrada
não ter horas a toda a hora? 
A preguiça
do céu entrou comigo 
e prescindo
da realidade como ela prescinde de mim. 
Para que me
lastimas 
se este é o
meu auge?! 
Eu tive a
dita de me terem roubado tudo 
menos a
minha torre de marfim. 
Jamais os
invasores levaram consigo as nossas
torres de
marfim. 
Levaram-me o
orgulho todo 
deixaram-me
a memória envenenada 
e intacta a
torre de marfim. 
Só não sei
que faça da porta da torre 
que dá para
donde vim.
(Almada
Negreiros faleceu faz hoje 42 anos)
quinta-feira, junho 14, 2012
quarta-feira, junho 13, 2012
Cromo
andamos pelo
mundo 
experimentando
a morte 
dos brancos
cabelos das palavras 
atravessamos
a vida com o nome do medo 
e o consolo
dalgum vinho que nos sustém 
a urgência
de escrever 
não se sabe
para quem 
o fogo a
seiva das plantas eivada de astros 
a vida
policopiada e distribuída assim 
através da
língua... gratuitamente 
o amargo
sabor deste país contaminado 
as manchas
de tinta na boca ferida dos tigres de papel 
enquanto
durmo à velocidade dos pipelines 
esboço
cromos para uma colecção de sonhos lunares 
e ao
acordar... a incoerente cidade odeia 
quem deveria
amar 
o tempo
escoa-se na música silente deste mar 
ah meu
amigo... como invejo essa tarde de fogo 
em que
apetecia morrer e voltar 
(Al Berto
faleceu faz hoje 15 anos)
terça-feira, junho 12, 2012
segunda-feira, junho 11, 2012
domingo, junho 10, 2012
sábado, junho 09, 2012
Choro!
Ninguém vê
as minhas lágrimas, mas choro 
as crianças
violadas 
nos muros da
noite 
úmidos de
carne lívida 
onde as
rosas se desgrenham 
para os
cabelos dos charcos. 
Ninguém vê
as minhas lágrimas, mas choro 
diante desta
mulher que ri 
com um sol
de soluços na boca 
— no exílio
dos Rumos Decepados. 
Ninguém vê
as minhas lágrimas, mas choro 
este sequestro
de ir buscar cadáveres 
ao peso dos
poços 
— onde já
nem sequer há lodo 
para as
estrelas descerem 
arrependidas
de céu. 
Ninguém vê
as minhas lágrimas, mas choro 
a coragem do
último sorriso 
para o rosto
bem-amado 
naquela
Noite dos Muros a erguerem-se nos olhos 
com as mãos
ainda à procura do eterno 
na carne de
despir, 
suada de
ilusão. 
Ninguém vê
as minhas lágrimas, mas choro 
todas as
humilhações das mulheres de joelhos nos tapetes da súplica 
todos os
vagabundos caídos ao luar onde o sol para atirar camélias 
todas as
prostitutas esbofeteadas pelos esqueleto de repente dos espelhos 
todas as
horas-da-morte nos casebres em que as aranhas tecem vestidos para o sopro do 
silêncio 
todas as
crianças com cães batidos no crispar das bocas sujas 
de
miséria... 
Ninguém vê
as minhas lágrimas, mas choro... 
Mas não por
mim, ouviram? 
Eu não preciso
de lágrimas! 
Eu não quero
lágrimas! 
Levanto-me e
proíbo as estrelas de fingir que choram por mim! 
Deixem-me
para aqui, seco, 
senhor de
insônias e de cardos, 
neste ódio
enternecido 
de chorar em
segredo pelos outros 
à espera
daquele Dia 
em que o meu
coração 
estoire de
amor a Terra 
com as
lágrimas públicas de pedra incendiada 
a
correrem-me nas faces 
— num
arrepio de Primavera 
e de
Catástrofe!
(José Gomes
Ferreira nasceu faz hoje 112 anos)
sexta-feira, junho 08, 2012
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