How many times must a man look up, Before he can see the sky? How many ears must one man have, Before he can hear people cry? The answer, my friend, is blowin' in the wind. The answer is blowin' in the wind.
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quinta-feira, março 31, 2016
Enigma Lua
Esqueceste
o touro e o
grito
a parede
branca e fria
a cabeça
decepada enfunada
vento sangue
ferido.
Esqueceste
a lâmpada no
teto amarelo
rio de
sombra corrido
cavalo
eriçado na tábua
no quarto.
Esqueceste
a cova onde
Sangue e
olhos
enterraste
Esqueceste e
alienado nos salões
Ficaste cheirando
orquídeas inodoras
sapatinhos
de papa ocos
réplicas
estéticas à metralha
dos aviões.
Cansado?
Inútil? Delinquente? Vazio?
Quem te
poderá julgar?
Eu só sei
rasgar enigma
contra
razões da terra
olhos que
espanto me crava
na lua da
tarde que erra.
Presença de
transparência
na força que
assim me arde
na lua de
noite branca
me banho
fantasma árvore.
Sombra na
sombra lua
enigma junto
à janela.
Esqueceste
mas não
comigo
esqueceste a
lâmpada amarela do abrigo
e as quatro
paredes frias.
Esqueceste
mas não
comigo.
(poetisa
moçambicana nascida faz hoje 94 anos)
quarta-feira, março 30, 2016
Véu de
pirilampo
E eu
coloquei meus óculos escuros
contra a
mediocridade dos neons
contra a
agressão das almas monstruosas
e a
crueldade oculta nas manhãs
- na
penumbra amnésica anteparo
o cotidiano
fogo dos dragões.
E eu ajustei
meus óculos escuros
mas vi gente
comendo carne humana
crianças
assaltando à mão armada
cheirando
cola ou sendo trucidadas
enquanto os
vaidosos declamavam
a sua dor
tão dicionarizada.
E eu saio à
rua de óculos escuros
porque me
cega a cena da injustiça
porque a lei
só legítima a força
descobriu a
platéia o fundo falso
do palco
onde encerrou-se o último ato
e se
esqueceram de fechar o pano.
E eu uso
sempre os óculos escuros
porque o
mundo é uma faca nas pupilas
trapézio
inteiro de arame farpado
sobre a rede
de areia movediça
a pele
triturada e sem aplausos
prossigo
encantadora de serpentes
E eu saio à
noite de óculos escuros
porque meu
corpo acende nessa hora
meus óculos
são véu de pirilampo
me
resguardam de dentro para fora
escondem o
meu sol subcutâneo
- são a nave
em que chego até os homens.
(escritora
carioca que hoje faz 66 anos)
O animal da
floresta
De madeira
lilás (ninguém me crê)
se fez meu
coração. Espécie escassa
de cedro,
pela cor e porque abriga
em seu âmago
a morte que o ameaça.
Madeira
dói?, pergunta quem me vê
os braços
verdes, os olhos cheios de asas.
Por mim
responde a luz do amanhecer
que recobre
de escamas esmaltadas
as águas
densas que me deram raça
e cantam nas
raízes do meu ser.
No
crepúsculo estou da ribanceira
entre as
estrelas e o chão que me abençoa
as nervuras.
Já não faz
mal que doa
meu bravo
coração de água e madeira.
(poeta
amazonense que hoje faz 90 anos)
terça-feira, março 29, 2016
A DENSIDADE DOS SISTEMAS
[aos
perfeccionistas]
o onde é demasiado denso para o quando,
o quando é demasiado denso para o quem,
o quem é demasiado denso para o o quê,
o o quê
é demasiado denso para o porquê.
rejeitar as
coisas que não tens
é acender o
rastilho do tempo que resta,
a densidade
comparativa dos sistemas
destruí-los-á
um por um:
primeiro o
espaço, depois o tempo, depois
o facto
consumado, depois as dúvidas
e finalmente
as explicações infundadas.
- e nós?
- nós
acabaremos por subsistir no território
da alma, sem
densidade alguma.
(poeta
tavirense que hoje faz 34 anos
segunda-feira, março 28, 2016
A luz da
noite, o som do mundo - excerto
A noite, que
do mundo, o som descanta
O canto, que
do mundo, a luz depende
A noite,
percepção, de que no ar
O mar, o som
do mar, que no ar anda
A terra,
percepção, de que terrestre
O som, do
mundo ouve, intenso canta
A luz, tão
irreal, demente que
No ar,
celeste tão, grave cintila
(Luís de
Miranda Rocha faleceu faz hoje 9 anos)
domingo, março 27, 2016
sábado, março 26, 2016
Depois das
elegias
depois das
elegias o alcandorado grito
sobre o
deserto chão do poema,
desinventário
de européis no fulgor
em barrocas
cornijas de caniço ao alto,
a chuva,
e o chão ele
mesmo vertigem,
as estiradas
praias de silêncio
no tapume
como ínsulas do incerto mar
na cidade
dos cedros, sonetos antigos,
negreiros
tijolos de incisões
a desaguar
(poeta
moçambicano que hoje faz 63 anos)
sexta-feira, março 25, 2016
Dentro de ti
Dentro de ti
neblinas se
rasgaram
como
compreensões
geradas
de
catástrofes -
como as
pálidas tiras de luz
que após os
ventos
em síncope -
se
deixam às
praias
pelo olhar
líquido e amainado,
transmudando
o que
tardiamente
rolaram como
inútil.
(poeta
brasileiro nascido a 25 de Março de 1908)
quinta-feira, março 24, 2016
A sombra
cósmica
De um
radical hemisfério
Brota um
silêncio
sem terra
que
flutuando invadimos.
Impondo-nos
mão protetora
ele se fez
nosso augúrio
no
construtivo envolver-nos
já quase
astrais continentes.
Nautas e
consumidores
senhores
condescendendo
achegamo-nos
gratuitos.
(poetisa
pernambucana falecida faz hoje 17 anos)
quarta-feira, março 23, 2016
Gárgula
Gárgula.
Por dentro a
chuva que a incha, por fora a pedra misteriosa
que a mantém
suspensa.
E a boca
demoníaca do prodígio despeja-se
no caos.
Esse animal
erguido ao trono de uma estrela,
que se
debruça para onde
escureço.
Pelos flancos construo
a criatura.
Onde corre o arrepio, das espáduas
para o
fundo, com força atenta. Construo
aquela massa
de tetas
e unhas,
pela espinha, rosas abertas das guelras,
umbigo,
mandíbulas.
Até ao centro da sua
árdua talha
de estrela.
Seu buraco
de água na minha boca.
E
construindo falo.
Sou lírico,
medonho.
Consagro-a
no banho baptismal de um poema.
Inauguro.
Fora e
dentro inauguro o nome de que morro.
(Herberto
Hélder faleceu faz hoje 1 ano)
terça-feira, março 22, 2016
Futuro
O que há-de
vir é belo
(Pensamos).
Belo e ardente.
Fosse o
futuro assim!
Pudesse
agora tê-lo!
Agora, – e o
Presente
Deixá-lo
para o fim.
O dia de
amanhã?
Ilusão.
Frioleiras.
Pois bem:
quem o tivera
Já gasto em
cinza vã,
Em vez de, à
sua espera,
Ficar a vida
inteira!
Amanhã: dia
de hoje
Que não
chegou ainda.
Seja! Mas
foge
A vida,
antes que venha!
A sua face é
linda.
Pena que se
detenha.
Há-de vir,
certamente,
Daqui a
muitos anos.
Todavia no
mundo
Só haverá
presente.
Enganos.
Desenganos.
Um silencio
profundo.
Dia tão
indeciso,
Tão cheio de
mistério!
Virá pelo
Outono,
Quando não
for preciso,
Acordar-me
do sono,
Talvez no
cemitério.
(poeta
madeirense nascido a 22 de Março de 1897)
segunda-feira, março 21, 2016
Eu não sou
professor
Eu não sou
professor
Para te
ensinar a amar,
Também os
peixes não precisam de um professor
Que os
ensine a nadar
E os
pássaros de um professor
Que os
ensine a voar.
Nada pelos
teus próprios meios.
Voa pelos
teus próprios meios.
O amor não
tem manuais
E os maiores
amantes da história
Não sabiam
ler.
(poeta sírio
nascido faz hoje 93 anos)
domingo, março 20, 2016
Noite
As casas fecham as pálpebras das janelas e dormem.
Todos os rumores são postos em surdina,
todas as luzes se apagam.
Há um grande aparato de câmara funerária
na paisagem do mundo.
Os homens ficam rígidos,
tomam a posição horizontal
e ensaiam o próprio cadáver.
Cada leito é a maquete de um túmulo.
Cada sono um ensaio de morte.
No cemitério da treva
tudo morre provisoriamente
(poeta paulista
nascido a 20 de Março de 1892)
sábado, março 19, 2016
Crepúsculo
O mar âmbar
morrediço de mais um dia
que se dilui
na dureza inexpugnável da penumbra,
traz o
encanto e a magia,
traz um
manto feito sombra.
A manhã nova
que já se aguarda
nada mais
traz na sua farda
que outro
dia e outro "amor",
e outro sol
e outra dor,
e outra
conquista pelo ser maior
que na sua
empresa,
mais perde
de vista
a Natureza.
Humanidade
perdida,
a quem
ciclicamente a paz é concedida
no intervalo
precendente a cada açoite;
Humanidade
arrefecida,
que deste o
teu poder aos deuses da vida
e que agora
gelas no medo da noite.
Ah! A manhã
nova que já se oferece
que nada
mais traz, em que nada acontece,
é a nova era
de um novo mesmo,
em que outra
farsa, em que outro sismo,
em que outro
céu, em que outro abismo,
nos
envolverá na certeza
que mais
perde de vista
a Natureza.
O mar âmbar
morrediço de mais um dia
que se dilui
na dureza inexpugnável da penumbra,
traz o
encanto e a magia,
traz um
manto feito sombra...
Rui Diniz
(poeta
almadense que hoje faz 37 anos)
sexta-feira, março 18, 2016
quinta-feira, março 17, 2016
quarta-feira, março 16, 2016
Ode I
O poeta se
dirige ao silêncio.
E o diálogo,
sua vida.
- Eu vos amo
a todos,
ventos,
rios, mares,
eu vos amo,
meus irmãos.
Ao redor,
nenhuma voz
entrecorta
sua solidão
palpitante.
Mas ele crê:
de um
pequeno murmúrio,
tece ao
menos um eco.
Vida de
poeta,
no apelo de
um brilho,
no encontro
de um reflexo.
(poetisa
paulista nascida faz hoje 83 anos)
terça-feira, março 15, 2016
Estes dias
Por enquanto
Andamos sem
pensar
Comemos com
prazer
Amamos sem
parar
Vivemos por
viver
Por enquanto
Estamos com
razão
Senhores do
destino
Dizendo sim
e não
Escolhendo o
caminho
Por enquanto
Somos alma
deste mundo
Vencemos os
invernos
Respiramos o
segundo
Somos jovens
e eternos
Por enquanto
Apenas por
enquanto
(escritor
paulista que hoje faz 52 anos)
segunda-feira, março 14, 2016
domingo, março 13, 2016
sábado, março 12, 2016
Esboço
Teus lábios
inquietos
pelo meu
corpo
acendiam
astros...
e no corpo
da mata
os
pirilampos
de quando em
quando,
insinuavam
fosforescentes
carícias...
e o corpo do
silêncio estremecia,
chocalhava,
com os
guizos
do cri-cri
osculante
dos grilos
que imitavam
a música de
tua boca...
e no corpo
da noite
as estrelas
cantavam
com a voz
trêmula e rútila
de teus
beijos...
(poetisa
carioca nascida a 12 de Março de 1893)
sexta-feira, março 11, 2016
Poemas da
Infância - Segundo
Quando foi
que demorei os olhos
sobre os
seios nascendo debaixo das blusas,
das
raparigas que vinham, à tarde, brincar comigo?...
... Como
nasci poeta
devia ter
sido muito antes que as mães se apercebessem disso
e fizessem
mais largas as blusas para as suas meninas.
Quando, não
sei ao certo.
Mas a
história dos peitos, debaixo das blusas,
foi um
grande mistério.
Tão grande
que eu
corria até ao cansaço.
E jogava
pedradas a coisas impossíveis de tocar,
como sejam
os pássaros quando passam voando.
E desafiava,
sem razão
aparente,
rapazes
muito mais velhos e fortes!
E uma vez,
de cima de
um telhado,
joguei uma
pedrada tão certeira
que levou o
chapéu do Senhor Administrador!
Em toda a
vila
se falou logo
num caso de política;
o Senhor
Administrador
mandou vir
da cidade uma pistola,
que
mostrava, nos cafés, a quem a queria ver;
e os do
partido contrário
deixaram
crescer o musgo nos telhados
com medo
daquela raiva de tiros para o céu...
Tal era o
mistério dos seios nascendo debaixo das blusas!
(Manuel da
Fonseca faleceu faz hoje 23 anos
quinta-feira, março 10, 2016
A Idade dos
Lilases
Mulher
No tempo dos
cabelos agitas a paz em amor
Todos os
dias por ti
O universo
se faz e tu não sabes não
Amanhã a
mulher joga a vida num vale de lilases
Dele irrompe
cheirosa a flor
Que é
pródiga em lis e lases
E serei tudo
o que de mais fértil o teu ventre der
Mulher
Na estrada à
noite não pode haver desacordo
Eia tanta
gente amiga são as árvores.
(Dórdio Leal
Guimarães nasceu faz hoje 78 anos)
quarta-feira, março 09, 2016
terça-feira, março 08, 2016
Quando Eu
Partir
Quando eu
partir, quando eu partir de novo
A alma e o
corpo unidos,
Num último e
derradeiro esforço de criação;
Quando eu
partir...
Como se um
outro ser nascesse
De uma
crisália prestes a morrer sobre um muro estéril,
E sem que o
milagre se abrisse
As janelas
da vida. . .
Então
pertencer-me-ei.
Na minha
solidão, as minhas lágrimas
Hão de ter o
gosto dos horizontes sonhados na adolescência,
E eu serei o
senhor da minha própria liberdade.
Nada ficará
no lugar que eu ocupei.
O último
adeus virá daquelas mãos abertas
Que hão de
abençoar um mundo renegado
No silêncio
de uma noite em que um navio
Me levará
para sempre.
Mas ali
Hei de
habitar no coração de certos que me amaram;
Ali hei de
ser eu como eles próprios me sonharam;
Irremediavelmente...
Para sempre.
(Ruy Cinatti
nasceu faz hoje 101 anos)
segunda-feira, março 07, 2016
Que não
seja
estátua!
Seja às
vezes carne
Entre rosa e
sangue
Entre forma
e fundo.
Saiba ser o
fruto
Sem ser só o
gomo
Seja vinho
novo
Seja apenas
sumo.
Seja
nevoeiro.
Venha nu,
mas venha
Envolto na
bruma....
Possa ser
mistério...
Seja cais à
espera
Seja barco à
vela;
Possa ser
mar alto
Possa ainda
ser espuma.
(poeta
lisboeta nascido a 7 de Março de 1954 e falecido aos 52 anos)
domingo, março 06, 2016
A cama de
pregos
Tenho o
corpo varado de angústias
e não
encontro posição de repouso.
Porque aos
de minha geração
foi dado
existir numa cama de pregos,
entre o
espasmo e o grito,
antes da
primeira frase se fazer orvalho
contra as
paredes da cela.
Não há
possibilidade de fuga
para nosso
instinto.
querem que o
sexo floresça e murche
em nossas
próprias mãos;
ou que o
orgasmo seja catalogado
e obedeça
aos trâmites legais.
Não há
caminho que nos leve à amada.
Todos os
corredores conduzem ao vestíbulo,
onde uma
enfermeira nos agarra
e nos faz
preencher um questionário.
Esconderam
as fêmeas em arcas de veludo
e nos iludem
o apetite
com mulheres
da vida,
com
cineminhas mambembes
e filme de
sacanagem.
Mas isto não
nos basta,
é preciso um
espaço infinito
para nos
fazermos ao largo,
como jovens
leões que se lançam à planície.
Ah, visões
de antigos dias,
farândolas
de faunos,
virgens
consumidas,
olhos de
ciclopes aguardando as madrugadas!
Não haverá
nesta cidade uma única mulher
verdadeiramente
no cio?
Quero
agitá-la como uma bandeira
entre as
estrelas
e vê-la
tombar,
com a face
tranqüila.
Sim, deliro,
estamos
todos loucos,
à beira do
caos e do copo.
E contudo é
preciso utilizar de alguma forma
esta
convulsão incontida.
Mesmo que
tudo termine
na cama de
pregos,
seguros pela
enfermeira
e cheirando
clorofórmio.
Não, por
Deus,
não me façam
uma incisão no crânio.
Eu sei que
estou preso num palácio de espelhos
e é preciso
quebrar tudo!
(poeta
carioca que hoje faz 80 anos)
sábado, março 05, 2016
Riso
Tive o jeito
de rir, quando menino,
Até beber as
lágrimas choradas:
Com
carantonhas, gestos, desatino,
Passou a
nuvem e os pequenos nadas.
A rir de
escuridões, de encruzilhadas,
Tornei-me
afeito logo em pequenino;
Porque ri é
que trago as mãos geladas,
E choro
porque ri do meu destino.
Vivi de mais
num mundo idealizado
Comigo só: E
só de mim descreio
Entornava-me
riso a luz em cheio
Quando o meu
mundo foi principiado;
Rio agora
que não sei donde me veio
Sempre o mal
que me trouxe o bem sonhado.
(poeta
coimbrão falecido a 5 de Março de 1958)