Para que o mundo não esqueça
Sobrevivente do campo de concentração de Auschwitz, onde esteve desde 11 de Fevereiro de 1944 até ser libertado pelo exército vermelho em 27 de Janeiro de 1945, Primo Levi, celebrado escritor italiano, faleceu há 20 anos.
Regressado a Itália depois de ter recuperado da escarlatina que o tinha acometido (e que o salvou da marcha da morte), dedicou o resto da sua vida a tornar conhecida, no mundo inteiro, a existência dos campos de concentração nazis, ao mesmo tempo que tinha uma carreira de sucesso na indústria química, como cientista (era diplomado em Química).
Queria, sobretudo, que os jovens nascidos livres, que nada sabiam de racismo, de anti-semitismo ou de massacre de inocentes, entendessem que os campos de extermínio eram o epílogo necessário de qualquer sistema de pensamento baseado no dogma da desigualdade. Queria que se entendesse o abismo a que necessariamente conduzem o ofuscar do raciocínio, o ódio pelo diferente, a intolerância, o fanatismo, o desprezo pelo Outro.
O poema que tanscrevo encontra-se no romance Se non ora,quando?, interrogação que o autor repete - juntamente com outras interrogações - no final de cada estrofe, porque é, na realidade, a letra de uma música, aliás, da marcha que um personagem toca e canta em baixo tom: diz ele ser esta uma música sua e que, por não estar escrita em lugar nenhum, muda sempre um pouco, mas a letra tinha sido escrita por um prisioneiro judeu, que cantava e tocava as canções que ele escrevia. Foi preso e revistado por um soldado alemão que encontrou no seu bolso uma pequeníssima flauta e, como amava a música, lhe concedeu um último desejo. O judeu pediu meia hora de tempo para escrever uma canção; passada a meia hora, o alemão ficou com a canção e matou o judeu. Depois disso, o soldado alemão foi morto pelos colegas do judeu que recuperaram a canção e passaram a cantá-la quando se sentiam tristes.
Reconhecei-nos? Somos as ovelhas do gueto,
Tosadas por mil anos, resignadas à ofensa.
Somos os alfaiates, os copistas e os cantores
Secos à sombra da Cruz.
Agora aprendemos os caminhos da floresta,
Aprendemos a disparar e atiramos directo.
Se não for eu para mim, quem será por mim?
Se não assim, como? E se não agora, quando?
Os nossos irmãos subiram ao céu
Pelos caminhos de Sobibór e de Treblinka,
Cavaram-se um túmulo ao ar livre
Somente poucos de nós sobrevivemos
Pela honra do nosso povo submerso
Pela vingança e testemunho
Se não for eu para mim, quem será por mim?
Se não assim, como? E se não agora, quando?
Somos filhos de David e os obstinados de Massada,
Cada um de nós leva no bolso a pedra
Que quebrou a testa de Golías.
Irmãos, vamos embora da Europa dos túmulos:
Subimos juntos em direcção à terra
Onde seremos homens entre os outros homens
Se não for eu para mim, quem será por mim?
Se não assim, como? E se não agora, quando?
(Tradução retirada daqui)
Sem comentários:
Enviar um comentário