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sábado, outubro 31, 2015

Quero

Quero que todos os dias do ano
todos os dias da vida
de meia em meia hora
de 5 em 5 minutos
me digas: Eu te amo.

Ouvindo-te dizer: Eu te amo,
creio, no momento, que sou amado,
No momento anterior
e no seguinte,
como sabê-lo?

Quero que me repitas até à exaustão
que me amas que me amas que me amas.
Do contrário evapora-se a amação
pois ao dizer: Eu te amo,
desmentes
apagas
teu amor por mim.

Exijo de ti o perene comunicado.
Não exijo senão isto,
isto sempre, isto cada vez mais.

Quero ser amado por e em tua palavra
nem sei de outra maneira a não ser esta
de reconhecer o dom amoroso.


(poeta mineiro nascido faz hoje 113 anos)

sexta-feira, outubro 30, 2015

Para la libertad sangro, lucho, pervivo.
Para la libertad, mis ojos y mis manos,
como un árbol carnal, generoso y cautivo,
doy a los cirujanos.

Para la libertad siento más corazones
que arenas en mi pecho: dan espumas mis venas,
y entro en los hospitales, y entro en los algodones
como en las azucenas.

Porque donde unas cuencas vacías amanezcan,
ella pondrá dos piedras de futura mirada
y hará que nuevos brazos y nuevas piernas crezcan
en la carne talada.

Retoñarán aladas de savia sin otoño,
reliquias de mi cuerpo que pierdo en cada herida.
Porque soy como el árbol talado, que retoño:
aún tengo la vida.

Miguel Hernandez nasceu a 30 de Outubro de 1910 

Recordando

Sinto as cores, da noite, terem medo
e acolherem-se à sombra do teu luto.
Eu fui um rei dos godos, que em Toledo
o Tejo adormeceu e ainda escuto.

Cercam-se de oiro as salas que habitei,
oiro-cinza esquecido, oiro dormente.
E em minha Alma, na qual inda sou rei,
Cismo tronos caindo lentamente.

Buscam-me pajens tristes nos caminhos.
E a minha lenda em sonhos pergaminhos
vai escrevendo em silêncio o meu cismar.

São outros os domínios que vivi.
Todas as coisas que eu outrora vi
regressaram mistério ao meu olhar.


(poeta português nascido faz hoje 124 anos)

quinta-feira, outubro 29, 2015

Pássaro

É breve o pássaro
que ofusca a treva

Obscura flor
da ante-manhã

que resiste ao sol
cobrindo negra névoa

Por um instante o vôo
pousa o turvo manto

um relâmpago faz
o corpo estremecer

mas vence o véu da viúva
e tudo tarda

Por isso o pássaro
esconde o canto

assustado com a
mudez do sono


(poeta gaúcho que hoje faz 67 anos)

quarta-feira, outubro 28, 2015

Cor

É preciso soltar o ritmo que me prende.
Esta amarra de ferro à palavra e ao som.
Emudecer, no espaço, o arco e a corrente
E ser nesta varanda um pouco só de cor.
Não saber se uma flor é mesmo uma criança.
Se um muro de jardim é proa de navio.
Se o monumento fala, se o monumento dança.
Se esta menina cega é uma estátua de frio.
Um pássaro que voa pode ser um perfume.
Uma vela no rio, um lenço no meu rosto.
Na tarde de Fevereiro estar um dia de Outubro.
Nos meus olhos de morta uma noite de Agosto.
É preciso soltar o ritmo das marés,
Das estações, do Amor, dos signos e das águas,
Os duendes das plantas, os génios dos rochedos
Nos cabelos do Vento, as tranças de arvoredos.
Desordenai-me, luz! Que nada mais dependa
Das águas, das marés, dos signos e do Amor.
É preciso calar o arco e a corrente
E ser nesta varanda um pouco só de cor


(poetisa benaventense nascida a 28 de Outubro de 1920)

terça-feira, outubro 27, 2015

Lou Reed faleceu faz hoje 2 anos
A um estrangeiro

Isto de ser poeta e português
Não é tão simples como imaginais.
Vede em Camões, Antero e Pascoaes
O que essa estrela dúplice lhes fez.

É uma f 'rida que não sara mais
A que fizera luz que alguma vez
Aureolou as frontes desses três
E doutros, cujas vidas ignorais:

Gomes Leal, Cesário Verde... tantos!
Se fossem doutro povo, doutra raça,
Seriam geniais, - mas sem desgraça.

Os poetas, aqui, são como os Santos:
Não conhecem os frutos dos seus prantos
E a glória é póstuma ilusão que passa.


(poeta português falecido faz hoje 66 anos)

segunda-feira, outubro 26, 2015

Idade

É um dos erros humanos
dar divisões ao tempo, e contá-las após,

porque os minutos quotidianos
têm bem diversas durações em nós.

Não se envelhece em ais e desenganos?
Não dura o choro e é o rir veloz?

Bons velhinhos - por isso eu que tenho 20 anos,
sou mais velho que vós!


(poeta mineiro nascido faz hoje 121 anos)

domingo, outubro 25, 2015

A carícia perdida

Sai-me dos dedos a carícia sem causa,
Sai-me dos dedos… No vento, ao passar,
A carícia que vaga sem destino nem fim,
A carícia perdida, quem a recolherá?

Posso amar esta noite com piedade infinita,
Posso amar ao primeiro que conseguir chegar.
Ninguém chega. Estão sós os floridos caminhos.
A carícia perdida, andará… andará…

Se nos olhos te beijarem esta noite, viajante,
Se estremece os ramos um doce suspirar,
Se te aperta os dedos uma mão pequena
Que te toma e te deixa, que te engana e se vai.

Se não vês essa mão, nem essa boca que beija,
Se é o ar quem tece a ilusão de beijar,
Ah, viajante, que tens como o céu os olhos,
No vento fundida, me reconhecerás?


(poetisa argentina falecida faz hoje 77 anos)

Tradução de Carlos Seabra


sábado, outubro 24, 2015

Os Búzios

Deixados pelos Deuses sobre a areia
Os búzios são cofres com pedaços da noite
Pequenos transístores para as notícias do mar

Encontrados pelas crianças na praia
Os búzios são caixas de música
São os ouvidos petrificados dos peixes

E um búzio separa
As crianças dos Deuses


(poeta açoriano nascido faz hoje 79 anos)

sexta-feira, outubro 23, 2015

Décima colina

A escultura adiada
com a morte do oleiro,
encontrava seu destino
na escassez dos traços.

A chama estava de pé
e as sombras lacradas.


(poeta gaúcho que hoje faz 43 anos)

quinta-feira, outubro 22, 2015

Primavera nos dentes

Quem tem consciência para ter coragem
Quem tem a força de saber que existe
E no centro da própria engrenagem
Inventa a contra-mola que resiste

Quem não vacila mesmo derrotado
Quem já perdido nunca desespera
E envolto em tempestade decepado
Entre os dentes segura a primavera

(João Apolinário faleceu faz hoje 27 anos

quarta-feira, outubro 21, 2015

Soneto do Exílio

Mais além, leve e alada, a imaginária
arquitetura irreal, sombra a crescer
sobre a terra dos mortos, solitária.
Na falsa noite não deixou de ser

ouvida a melodia perdulária.
Se acaso o húmus da vida fez nascer
luz esquiva na angústia milenária,
é chegado o momento de esquecer

as obscuras heranças desvividas
por desamor e amor: frágil reinado
em manhãs de magia, pressentidas

além de tempo e espaço. (E, roto o manto,
na torre enoitecida um exilado
rei de si mesmo. Que lhe resta? O canto.)


(poeta pernambucano falecido faz hoje 9 anos)

terça-feira, outubro 20, 2015

Pedra perene

Na pedra
finge-se
um silêncio
inquieto.

Aglutinados
somos pó e fantasia
luz e sonhos
palpitando loucuras.

Somos vida.


(poeta moçambicano que hoje faz 70 anos)

segunda-feira, outubro 19, 2015

A Poesia Vai Acabar

A poesia vai acabar, os poetas
vão ser colocados em lugares mais úteis.
Por exemplo, observadores de pássaros
(enquanto os pássaros não
acabarem). Esta certeza tive-a hoje ao
entrar numa repartição pública.
Um senhor míope atendia devagar
ao balcão; eu perguntei: «Que fez algum
poeta por este senhor?»    E a pergunta
afligiu-me tanto por dentro e por
fora da cabeça que tive que voltar a ler
toda a poesia desde o princípio do mundo.
Uma pergunta numa cabeça.
- Como uma coroa de espinhos:
estão todos a ver onde o autor quer chegar? -


(Manuel António Pina faleceu faz hoje 3 anos)
A lenda da maldição

A noite viu a criança que subia a escada cheia de risos e de sombras
E pousou como um pássaro ferido sobre as árvores que choravam.
A criança era o príncipe-poeta que a música ardente fizera subir à última torre
E a noite era a camponesa que amava o príncipe e o adormecia no seu canto.
Quando a criança chegou ao ponto mais alto viu que a música era o riso embriagado
E que o riso embriagado era das estátuas mortas que tinham no ventre aberto entranhas murchas.
A criança lembrou-se da noite cheia de entranhas e cujo riso era a poesia eterna
E a angústia cresceu no seu coração como o mar alto nos penhascos.
O olhar cego das estátuas levou o herdeiro do reino ao fosso negro - ó príncipe, onde estás? - a voz dizia
E a água subia, nos braços, no peito, na boca, nos olhos do amado da noite.

Depois saiu do fosso um homem que era o poeta-amaldiçoado
E que possuiu a noite chorando, adormecida.
A noite que nada viu continua chamando o príncipe-poeta
Enquanto o poeta-amaldiçoado chora nos braços das estátuas mortas...


(Vinicius de Moraes nasceu faz hoje 102 anos)

domingo, outubro 18, 2015

Imitando Lao Tsé

Trinta raios reunidos num eixo
fazem uma roda - mas é

o cavado que existe no eixo que faz
com que se possa utilizar a roda.

O oleiro vai afeiçoando a argila
até que o cântaro está pronto - mas é

o espaço vazio no seu interior que faz
com que se possa utilizar o cântaro.

Trespassada por portas e janelas
está a casa - mas é a circunstância de

a casa ser oca o que faz
com que a casa se possa utilizar.

Claro que devemos usar
o que existe - mas é

o que não existe o que faz
com que se possa utilizar o que existe.


(poeta norueguês que hoje faz 76 anos) 

Tradução de Amadeu Baptista

sábado, outubro 17, 2015

O instante do silêncio

Se puderes aceitar a nudez
como uma graça ou uma pobreza
talvez encontres
as linhas de força inexplicadas.
Se com o teu peso irremediável,
proferires a palavra que mal pousa
poderás sustentar a magnética felicidade
desse instante,
ameaçado mas vivo,
do indecifrável silêncio da nudez.


(António Ramos Rosa nasceu faz hoje 91 anos)

sexta-feira, outubro 16, 2015


Adriano faleceu faz hoje 33 anos
A Chave do Abismo - XXVI

Nuvens fogem ao longe
pássaros voam e desaparecem
eterna espera em vão
e as lágrimas como pérolas descem sem fim


(escritor mato-grossense nascido faz hoje 79 anos)

quinta-feira, outubro 15, 2015

Adormecer

Vai vida na madrugada fria.

O teu amante fica,
na posse deste momento que foi teu,
amorfo e sem limites como um anjo;
a cabeça cheia de estrelas...
Fica abraçado a esta poeira que teu pé levantou.
Fica inútil e hirto como um deus,
desfalecendo na raiva de não poder seguir-te!


(Manuel da Fonseca nasceu faz hoje 104 anos)

quarta-feira, outubro 14, 2015

Gosto dos Amigos

Gosto dos amigos
Que modelam a vida
Sem interferir muito;
Os que apenas circulam
No hálito da fala
E apõem, de leve,
Um desenho às coisas.
Mas, porque há espaços desiguais
Entre quem são
E quem eles me parecem,
O meu agrado inclina-se
Para o mais reconciliado,
Ao acordar,
Com a sua última fraqueza;
O que menos se preside à vida
E, à nossa, preside
Deixando que o consuma
O núcleo incandescente
Dum silêncio votivo
De que um fumo de incenso
Nos liberta.


(poeta bracarense naturalizado moçambicano, falecido faz hoje 15 anos)

terça-feira, outubro 13, 2015

O rio

Ser como o rio que deflui
Silencioso dentro da noite.
Não temer as trevas da noite.
Se há estrelas no céu, refleti-las
E se os céus se pejam de nuvens,
Como o rio as nuvens são água,
Refleti-las também sem mágoa
Nas profundidades tranqüilas.


(poeta pernambucano falecido faz hoje 47 anos)

segunda-feira, outubro 12, 2015

Escavacou

Escavacou abismos,
Abriu-se à realidade,
Morreu de impaciência.

Viveu a insignificância
Dos contratempos,
Buscou-se no que

Sobrou de si mesmo.
Desentendeu-se,
Se foi, serenamente,

Para a terra dos
Esquecidos.
Entregou-se às

Divergências,
Desacelerou-se,
Pensou nas atitudes

Que o reduziram
Às migalhas
De toda solidão.


(poeta norte-rio-grandense que hoje faz 48 anos)
Motivo cibernético

Polimultiplurimáquinas
estiram os nossos nervos
nos giros da exatidão.

No campo vibrante
de circuitos e painéis,
tecniscravos apascentam
rebanhos sagrados
de monstros eletrônicos.


(poetisa paranaense nascida faz hoje 103 anos)

domingo, outubro 11, 2015

 O anjo Heurtebise

Com pés de animal azul celeste,
Chegou o anjo Heurtebise. Estou só
Todo nu sem Eva, sem bigode
Sem mapa.
As abelhas de Salomão
Debandam, porque me é difícil comer o mel
De tomilho amargo, o meu mel dos Andes.
Em baixo, esta manhã o mar copia
Cem vezes o verbo amar. Anjos de algodão
Sujos, indecentes
Mungem na erva os úberes das grandes
Vacas geográficas.


(Jean Cocteau faleceu faz hoje 52 anos) 

Tradução de Herberto Hélder

sábado, outubro 10, 2015

Tu à Noite

Tu à noite havias de escutar
A trovoada e o ar ambulante.
Tu nessa margem hás-de virar
Para onde estão as intempéries dominantes.

Toda essa honrada esperança
Ruirá na ardósia,
E destroçará o inverno
Que vocifera a teus pés.

Se bem que ardam os altares apaixonantes,
E que o sol deliberado
Faça ladrar a águia,
Tu avançarás na corda bamba.


(Harold Pinter nasceu faz hoje 85 anos)

sexta-feira, outubro 09, 2015

Dúvida

Não há nada mais triste
do que um cão em guarda
ao cadáver do seu dono.

Eu não tenho cão.
Será que ainda estou vivo?


(poeta paulista falecido faz hoje 17 anos)

quinta-feira, outubro 08, 2015

Névoa
    A Albano Nogueira

Abraçada à noite,
a névoa desce sobre a terra.

Imprecisamente,
como se a névoa fosse dos meus olhos,
vejo o casario e as luzes da outra margem do rio.
Mais à direita, ao longe,
são já da névoa a praia, o mar.
Ouve-se apenas o ronco do farol
- um som molhado.
Para o lado dos pinhais,
anda a bruma a fazer medo
e a pôr mais pressa nos passos de quem foge.

Não há luar, não há estrelas.
De novo, olho para o rio.
Não sei se o vejo:
anda a névoa, já, com ele,
e os meus olhos não dizem o que é bruma, o que é rio.
E ela não pára,
avança ao meu encontro.

Cerca-me.
E eu tenho, só,
orvalho nas árvores do jardim,
gotas de água que se partem na alameda,
o ar húmido que me trespassa,
o molhado ronco do farol,
os cabelos encharcados
e pensamentos de névoa...


(poeta portuense falecido faz hoje 23 anos)

quarta-feira, outubro 07, 2015

Êxtase

Eis a minha vida:
Um sorriso entre lágrimas…
Uma lágrima entre sorrisos…
E a Poesia pairando sobre tudo!


(poeta lisboeta que hoje faria 82 anos

terça-feira, outubro 06, 2015

Drummondiana

A vida - sabemos - vai mal
A morte - coitada - nada tem a oferecer-nos de novo
Por isso
faz um poema josé
faz um poema suzana
faz um poema tomé
faz um poema ana
faz um

José Vicente Lopes 

(escritor cabo-verdiano que hoje faz 55 anos)

segunda-feira, outubro 05, 2015

Sem Abrigo

Só nos meus poemas encontro morada
Abrigo diferente não me foi cedido;
Ao próprio lar nunca me vi atraído,
E a tenda p’lo vento brutal foi levada.

Só nos meus poemas encontro morada.
E, se tal refúgio consigo nos matos,
Em estepes, cidades ou sítios ingratos,
Miséria nenhuma me afectará nada.

Ainda demora, mas há-de chegar
O tempo em que a força me abandonará
E em vão doces ditos irá requerer
Com que eu construía, e em que o chão irá
Guardar-me e eu me inclino pra esse lugar
Onde há uma cova no escuro a romper.


(poeta holandês falecido a 5 de Outubro de 1936) 

Tradução de Fernando Venâncio

domingo, outubro 04, 2015

Janis Joplin faleceu faz hoje 45 anos
Em celebração do meu útero

Tudo em mim é um pássaro.
Adejo com todas as minhas asas.
Queriam extirpar-te
mas não o farão.
Diziam que estavas incomensuravelmente vazio
mas não estás.
Diziam que estavas doente prestes a morrer
mas estavam errados.
Cantas como uma colegial
Tu não estás desfeito.

Doce peso,
em celebração da mulher que sou
e da alma da mulher que sou
e da criatura central e do seu prazer
canto para ti. Atrevo-me a viver.
Olá, espírito. Olá, taça.
Fixar, cobrir. Cobre o que contém.
Olá, terra dos campos.
Bem-vindas, raízes.

Cada célula tem uma vida.
Há aqui bastantes para satisfazer uma nação.
Chega que a populaça possua estes bens.
Qualquer pessoa, qualquer grupo diria:
Está tudo tão bem este ano que podemos plantar de novo
e pensar noutra colheita.
Uma praga tinha sido prevista e foi eliminada.
Por isso muitas mulheres cantam em uníssono:
uma numa fábrica de sapatos amaldiçoando a máquina,
uma no aquário cuidando da foca,
uma aborrecida ao volante do seu FORD,
uma cobradora na portagem,
uma no Arizona enlaçando um bezerro,
uma na Rússia com uma perna de cada lado do violoncelo,
uma trocando panelas num fogão no Egipto,
uma pintando da cor da lua as paredes do quarto,
uma no seu leito de morte mas recordando um pequeno almoço,
uma na Tailândia deitada na esteira,
uma limpando o rabo ao seu bebé,
uma olhando pela janela do comboio,
no meio do Wyomming e uma está
em qualquer lado e algumas estão em todo o lado e todas
parecem estar cantando, embora haja quem
não possa cantar uma nota sequer.

Doce peso
em celebração da mulher que sou
deixa-me levar uma echarpe de três metros,
deixa-me tocar o tambor pelas que têm dezanove anos,
deixa-me levar taças para oferecer
(se é isso o que me toca).
deixa-me estudar o tecido cardiovascular,
deixa-me calcular a distância angular dos meteoros,
deixa-me chupar o pecíolo das flores
(se é isso o que me toca).
Deixa-me imitar certas figuras tribais
(se é isso o que me toca).
Pois o corpo preciso disso,
que me deixes cantar
para a ceia,
para o beijo,
para a correcta
afirmação.


(poetisa estado-unidense falecida faz hoje 41 anos)