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sábado, janeiro 31, 2009

Coisas, Pequenas Coisas Fazer das coisas fracas um poema. Uma árvore está quieta, murcha, desprezada. Mas se o poeta a levanta pelos cabelos e lhe sopra os dedos, ela volta a empertigar-se, renovada. E tu, que não sabias o segredo, perdes a vaidade. Fora de ti há o mundo e nele há tudo que em ti não cabe. Homem, até o barro tem poesia! Olha as coisas com humildade. Fernando Namora, in "Mar de Sargaços"

sexta-feira, janeiro 30, 2009

Muros
Não quero que a minha casa seja cercada por muros de todos os lados e que as minhas janelas estejam tapadas. Quero que as culturas de todos os povos andem pela minha casa com o máximo de liberdade possível. Mahatma Gandhi
(A propósito do 61º aniversário do seu assasinato, do muro à volta da Palestina e de outros muros que se vão levantando.)
Imagem: à esquerda, crianças judias num campo de concentração nazi e, à direita, crianças de Gaza num campo de concentração sionista

quinta-feira, janeiro 29, 2009

Os perdedores Naquela que um jornalista israelita, judeu e residente em Jerusalém, apelidou de guerra mais brutal e mais cruel de toda a história de Israel e que agora atravessa um cessar fogo periclitante, não houve ganhadores, mas apenas perdedores. Israel, apesar do aparente sucesso militar, perdeu em toda a linha, não conseguindo nenhum dos objectivos declarados, menos ainda dos encobertos mas à vista de toda a gente, e mostrou a centenas de milhões de pessoas a verdadeira face do sionismo. Quanto aos objectivos declarados, Israel queria destruir o Hamas e o seu governo, conseguir a reinstalação do líder da Fatah no poder em Gaza e acabar com a resistência armada. Terá conseguido matar mais de 1.300 palestinos, entre os quais 95 militantes do Hamas, sendo o resto civis, incluindo perto de 400 crianças; Mahmoud Abbas (ou Abu Mazen) perdeu mais uma fatia da pouca credibilidade que tinha, mesmo na Cisjordânia, e deixou de reunir quaisquer condições para liderar o que quer que seja; e teve o condão de fazer com que cada palestino capaz de pegar em armas, agora ou no futuro, seja mais um provável resistente armado, multiplicando por quase 100 o número de resistentes armados que se estima existir actualmente. No que respeita aos objectivos encobertos, pretendia Israel que o exército recuperasse a aura de invencibilidade perdida na guerra de 2006 e que os Partidos Kadima - do Primeiro (des)Ministro Ehud Olmert e da Ministra das Negociatas Estrangeiras Tipzi Livni - e Trabalhista - do Ministro do Ataque, Ehud Barak, ficassem bem posicionados para vencer as eleições do próximo mês. Conseguiu que o IDF passasse a ser visto entre a maioria da população mundial como um bando de terroristas assassinos; que todas as sondagens apontem como grande vencedor o Likud, do extremista Benjamin Nataniau; e que centenas de milhões de pessoas ficassem a conhecer os horrores da criação do estado sionista. Os palestinos também perderam, tornando mais difícil a concretização do sonho de um Estado Palestino independente. Mahmoud Abbas, que já era pouco crível por ter feito concessões a Israel sem obter nada em troca, perdeu o pouco que tinha e não se perfila ninguém capaz de liderar a Fatah e conduzi-la a um entendimento com o Hamas. Por sua vez, o Hamas, apesar de aparentemente ter saído reforçado, tem um milhão e meio de pessoas a morrer, sem acesso a comida, água e medicamentos e tem quase 400 quilómetros quadrados, completamente arrasados, para reconstruir, o que não pode fazer sem o apoio do Ocidente, que insiste em canalizar a ajuda através da Fatah. Como se isso não bastasse, há líderes do Hamas - como se pode ver neste artigo do professor de Irvine, Mark LeVine – que sabem há muitos anos que a violência não funciona, mas não sabem como fazê-la parar e que o verdadeiro acto de desespero que constitui o lançamento de foguetes Qassam e morteiros – que são poucos, desnecessários, errados e improdutivos – apenas serve para dar um pretexto a Israel para mais chacinas e para permitir aos seus apoiantes assobiar para o lado. Para além de ser uma temeridade totalmente desnecessária “cutucar a onça com vara curta”, ninguém, a não ser meia dúzia de lunáticos, admite que, mau grado toda a injustiça que envolveu a criação de um estado sionista e racista em terras palestinas e a sua crescente escalada de violência até ao que hoje é, Israel pode (e muito menos deve) ser destruído, pelo que o Hamas, mais tarde ou mais cedo, vai ter de aceitar oficialmente a sua existência. Quanto mais tarde o fizer mais contribui para o lento extermínio de um povo que diz defender. Perdeu, também, a dita “civilização ocidental”, ao permitir que um dos “seus” (salvo seja) tenha agido ao longo de 60 anos e continue a agir muito pior do que os bárbaros da idade das trevas, ao contribuir para a escalada do conflito de religiões e ao aprofundar o fosso entre o Ocidente e o Leste e entre o Norte e o Sul. Depois de tudo aquilo a que se assistiu, que autoridade têm os auto-denominados paladinos dos direitos humanos para se arvorarem em seus defensores? E, pior ainda, quem lhes vai ligar alguma? Perdeu, ainda, a humanidade no seu todo, principalmente os mais carentes, porque aquilo que Israel destruiu tinha sido construído, em grande parte, com o apoio da boa vontade de Estados e cidadãos dos países ditos desenvolvidos. E se, para os Estados, os donativos são uma forma de tentar limpar com uma mão a (má) consciência que a outra mão deixou conspurcar já é de esperar que os cidadãos se comecem a interrogar sobre se vale a pena contribuir para construir, hoje, algo que algum doido varrido vai destruir amanhã.

quarta-feira, janeiro 28, 2009

A Padrão dos Pobres A Standard & Poor’s, empresa que atribui notações para o risco de crédito (vulgo rating) dos Países e das Empresas, decidiu, no fim da passada semana, baixar a notação de Portugal de AA- para A+, o que implica, também, a descida das notações das empresas com sede em Portugal, mesmo as filiais de empresas estrangeiras, já que uma das regras da notadora é não dar às empresa mais do que um grau acima da notação do país. Tal significa que o crédito para o Estado e para as Empresas ficou mais difícil e mais caro, não pela notação em si mas porque vivemos num mundo de decisores mentecaptos que seguem sem questionar as decisões de empresas sem qualquer credibilidade. E vou explicar porquê. O mundo do rating é dominado por três empresas: a Standard & Poor’s ( líder), a Moody's e a Fitch Ratings. Foram estas empresas que provocaram a actual crise financeira, já que os seus “sábios”, ainda há dois anos, atribuíam uma notação máxima (AAA, o máximo comum às três empresas) aos instrumentos financeiros (derivados) que financiaram o crédito subprime e que conduziram ao imbróglio em que hoje o mundo vive, que começou por ser financeiro mas já é económico e social, porque “quando o mar bate na rocha que se lixa é o mexilhão”. Para percebermos melhor o quão ridículos são os métodos destes abencerragens, chega dizer que a Standard & Poor’s considerou a Islândia como uma economia extremamente forte na véspera do País declarar a bancarrota e o Lehman Brothers um banco financeiramente robusto já este tinha apresentado às autoridades de Nova Iorque o pedido de falência. Há uns anos atrás, a Enron e a WorldCom tinham AAA pouco tempo antes de estoirarem. Depois de um relatório de 2003 da SEC (a CMVM lá do sítio), completamente arrasador para a indústria de rating, indiciando o recebimento de chorudas comissões pelas notações atribuídas a alguns instrumentos financeiros estruturados que enganaram milhões de investidores, um analista da Standard & Poor’s escreveu “esperemos estar todos ricos e reformados quando o castelo de cartas ruir” e outro acrescentou “eles (os instrumentos financeiros) podiam ter sido estruturados por vacas, que nós notá-los-íamos na mesma”. QED, o rating, só por si, não significa grande coisa; o que é muito perigoso é ser utilizado por decididores aparelhados com antolhos laterais. (Nota: Os sistemas de notações muito similares utilizados pelas três grandes podem ser vistos clicando nas ligações que coloquei acima.. Todas a notações apresentadas têm ainda graus intermédios de + (com excepção do AAA, que é o mais alto) e (com excepção do D, o mais baixo).

terça-feira, janeiro 27, 2009

Foro Social Mundial 2009 Entre hoje - dia 27 de Janeiro - e 1 de Fevereiro, o Fórum Social Mundial estará reunido em Belém, no Pará. Como singela homenagem à cimeira dos pobres (em contraponto à cimeira dos ricos, que decorre em Davos no mesmo período) deixo aqui uma ode do escritor, jornalista e poeta brasileiro Bernardo Kucinski, escrita propositadamente para o evento: Palavras de ordem Uma ode ao Fórum Social de Belém O mundo é complicado Nossa tarefa também Julgar sem pré-julgar Demarcar sem excluir Incluir sem forçar Somar, fazer bonito O mundo é infinito Combater a indiferença Respeitar a diferença e o diferente. Respeitar Defender a mata sem esquecer o homem Cultivar a terra sem derrubar a mata Cultivar o homem Amparar sem esperar Esperar sem se iludir Não desesperar, agir Não sucumbir Perseverar Convencer, conversar Persuadir sem mentir Não sofismar, Argumentar Gritar abaixo o imperialismo Viva o povo palestino Mas ao anti-semitismo dizer não Aplaudir a bravura Mas repudiar a bravata Não usar gravata Gritar a Amazônia é nossa Viva o povo brasileiro Viva a cesta básica e o Prouni Viva o luz para todos Em plena floresta amazônica Gritar abaixo os banqueiros Que seja a riqueza de todo o povo brasileiro Abaixo os juros E a especulação financeira Fora com o Deus mercado e o Deus dinheiro Sonhar mas não dormir Cada amanhecer é um novo dia O fim de um descanso Cada pequeno passo um avanço Conceituar sem preconceitos Refinar pensamentos Provocar sem agredir Polemizar De vez em quando aplaudir Perguntar e saber ouvir Não ouvir sem perguntar Questionar, Sempre Sempre duvidar, Não simplificar, complicar Entender é o que interessa Para poder avançar Saber, conhecer, decifrar Interpretar O saber é infinito O universo também O mundo é complicado Nossa tarefa também Bernardo Kucinski, Janeiro de 2009
Pormenores Fui desafiado pelo João a escolher, aleatoriamente, seis coisas sobre mim que deverei contar aqui e indicar mais seis blogues para continuarem o desafio, com as correspondentes ligações, e ir às respectivas caixas de comentários informá-los de que tinham sido nomeados. Sou totalmente avesso a algum tipo de correntes mas, para esta, aqui vai: *Abomino a hipocrisia, seja de que tipo for; *Gostava de ser filósofo e tocou-me ser economista e actuário pouco praticante; *Sou frontalmente contra o acordo ortográfico; *Detesto o politicamente correcto; *Cresci no meio de 6 irmãs, da mãe e da avó, casei com uma mulher, tive uma filha e quero morrer nos braços duma mulher; *Gostava de ser um comunicador perfeito: chamar estúpido a um gajo (ou gaja) que só o percebesse um ano depois. E agora os nomeados: Inflorescências Jardim de luz “CANTIGUEIRO” O Azereiro A FORMA E O CONTEÚDO PASSAGES

segunda-feira, janeiro 26, 2009

Adega do sono Dividias os gomos da fruta em aposentos da casa. A cortina do sumo leveda o sol levantado. O zodíaco do molde supre o gérmen do quarto. E o bafio estala a lareira das esferas na sala de estar da semente. Fabrício Carpinejar* *poeta brasileiro

domingo, janeiro 25, 2009

Se um cara corre... Se um cara corre, o bicho pega; se um cara fica, o bicho come! Este é um ditado brasileiro que traduz, de uma forma mais incisiva, o nosso velho preso por ter cão, preso por não ter. O adágio aplica-se que nem uma luva a Abdul Rahim Abdul Razzak al-Ginco, um cidadão sírio-curdo que passou os últimos sete anos em Guantánamo, onde continua preso. Em Janeiro de 2002, em Kandahar, al-Ginco, então com 26 anos, que tinha passado os dois anos anteriores a ser torturado pelos Talibãs, suplicou ao jornalista Tim Reid, do London Times, que pedisse às tropas estado-unidense recém chegadas que o ajudassem. E as tropas foram “ajudá-lo” e... enviaram-no para a prisão de Guantánamo, onde nunca foi acusado do que quer que fosse e diz que foi sujeito a torturas várias. O relato é o próprio jornalista e pode ser lido aqui.

sábado, janeiro 24, 2009

Pragmatismo Estético A disciplina é quase tudo menos o dia-a-dia o poema é quase nada mais a inspiração na falta solidária do mesmo quase faz-se o poema vive a poesia Carlos Vogt* *poeta brasileiro

sexta-feira, janeiro 23, 2009

O Enviado Especial Da catadupa de decisões tomadas pela nova Administração estado-unidense nos primeiros 2 dias de mandato quero focar-me numa que terá passado algo despercebida: de acordo com aquilo que era esperado, Obama escolheu George Mitchell para Enviado Especial ao Médio Oriente com vista à obtenção de um acordo de paz justo entre israelitas e palestinos. George John Mitchell, antigo senador democrata pelo Maine e líder da maioria democrata no Senado ente 1989 e 1995, foi nomeado por Bill Clinton Enviado Especial para a Irlanda do Norte, tendo desempenhado um papel fulcral no processo de paz que levou, em 1998, ao Acordo de Paz de Belfast, também conhecido por Acordo da Sexta Feira Santa, o qual conduziu a uma paz que perdura até hoje, apesar de alguns percalços. É verdade que o conflito Israelo-Palestino tem muitas diferenças relativamente ao da Irlanda do Norte, mas também tem pontos em comum, os quais suscitam alguma esperança, pois se na Irlanda do Norte republicanos (católicos) e unionistas (protestantes) - que se combateram durante décadas e desejaram a morte uns aos outros - conseguem, há mais de 10 anos, governar em conjunto e viver em paz, os palestinos e os israelitas não têm de estar condenados a lutar para sempre. Gerry Adams, líder histórico do Sinn Féin, já fez apelos nesse sentido. Não é menos verdade que George Mitchell já participou num quase acordo entre as duas partes, mas as negociações acabaram num fiasco. Com efeito, depois da Cimeira de Camp David 2000, esteve envolvido em negociações no Médio Oriente por indicação de Bill Clinton, mas o acordo, quase concluído na Cimeira de Taba, foi boicotado por Ariel Sharon, eleito primeiro ministro em 6 Fevereiro de 2001, com o beneplácito de Bush e Colin Powell. Agora, as condições locais são bem menos favoráveis, mas espera-se que haja um querer diferente em Washington.

quinta-feira, janeiro 22, 2009

A Habilidade Específica do Político A habilidade específica do político consiste em saber que paixões pode com maior facilidade despertar e como evitar, quando despertas, que sejam nocivas a ele próprio e aos seus aliados. Na política como na moeda há uma lei de Gresham; o homem que visa objectivos mais nobres será expulso, excepto naqueles raros momentos (principalmente revoluções) em que o idealismo se conjuga com um poderoso movimento de paixão interesseira. Além disso, como os políticos estão divididos em grupos rivais, visam dividir a nação, a menos que tenham a sorte de a unir na guerra contra outra. Vivem à custa do «ruído e da fúria, que nada significam». Não podem prestar atenção a nada que seja difícil de explicar, nem a nada que não acarrete divisão (seja entre nações ou na frente nacional), nem a nada que reduza o poderio dos políticos como classe. Bertrand Russell, in 'Ensaios Cépticos: A Necessidade do Cepticismo Político'

quarta-feira, janeiro 21, 2009

A esperança Compromissos profissionais há longo tempo assumidos acarretaram-me, anteontem e ontem, longas (mas muito compensadoras em termos profissionais e pessoais) jornadas de trabalho de mais de 12 horas, o que não me permitiu ver e ouvir (e muito menos escrever sobre) o que se passou na tomada de posse do novo Presidente dos Estados Unidos; mas, embora correndo o risco de fazer “chover no molhado” e mesmo com um dia de atraso, não quero deixar de dizer algo sobre o assunto. Neste dia, nós reunimo-nos porque escolhemos a esperança em detrimento do medo, a unidade de vontades em detrimento do conflito e da discórdia. A partir de hoje, temos de levantar-nos, sacudir o pó e começar outra vez a reconstruir a América. As duas citações acima são do discurso de ontem de Barak Obama, um discurso despojado da retórica a que habituou os seus apoiantes, mas cheio de mensagens positivas para os seus concidadãos e para o mundo; apesar de os adeptos do tudo ou nada considerarem que ele agradou, sobretudo, aos conservadores, e que defraudou as esperanças nele depositadas. Num mundo em que os conceitos ancestrais que cimentaram as relações entre os povos têm sido sistematicamente desprezados pelos poderosos e pelos seus braços políticos, Obama falou de valores, da memória dos antepassados, da responsabilidade pessoal e colectiva, do valor do trabalho, dos limites ao exercício do poder. Criticando com veemência (embora o fizesse de forma velada, como as circunstâncias exigiam) a política do seu antecessor, afirmou que rejeitava a falsa escolha entre a segurança e os ideais de liberdade em nome da defesa comum; zurzindo claramente na avidez dos que conduziram a economia ao seu estado actual, disse que o sucesso dependia da honestidade e do trabalho árduo, da coragem e da correcção, da tolerância e da curiosidade, da lealdade e do patriotismo. Conclamando os seus concidadãos ao reconhecimento de que cada Americano tem deveres para com ele próprio, para com o País e para com o mundo, deveres esses que não devem ser aceites de má vontade mas antes abraçados com entusiasmo, avisou de que o poder, só por si, não pode proteger o País nem lhes dá o direito de fazerem o que lhes aprouver; pondo de parte o lema bushiano de que “quem não está connosco está contra nós”, abriu portas a um dialogo multi-lateral, estendeu mãos aos velhos amigos e antigos inimigos, independentemente da sua raça ou credo. Já escrevi aqui sobre o que se poderia esperar de Obama como presidente, ciente que estou da diferente forma de encarar a política por parte dos europeus e dos estado-unidenses. Obama não poderá fazer tudo já, nem sequer nos seus quatro anos de (primeiro) mandato, e seguramente não fará muitas das coisas que gostaríamos que fizesse. Mas se der um contributo decisivo para resolver a crise económica, se sair do Iraque, se conseguir ajudar a encontrar uma solução justa para a situação israelo-palestina, se encarar de frente a problema das mudanças climáticas e a redistribuição da riqueza no mundo, é possível continuar a acreditar que outro (e melhor) mundo é possível. Imagem: Jim Young/Reuters

terça-feira, janeiro 20, 2009

ÁGUA Diversa de mim contudo eu Nesse mútuo consentimento – nado e nadas – aceita-me tão logo me despeça espalha-me em sal areia e algas espelho que à carne adere abismo que o sono invoca Carlos Roberto Lacerda* *poeta mineiro

segunda-feira, janeiro 19, 2009

A Génese de um Poema A maior parte dos escritores, sobretudo os poetas, preferem deixar supor que compõem numa espécie de esplêndido frenesim, de extática intuição; literalmente, gelar-se-iam de terror à ideia de permitir ao público que desse uma espreitadela por detrás da cena para ver os laboriosos e incertos partos do pensamento, os verdadeiros planos compreendidos só no último minuto, os inúmeros balbucios de ideias que não alcançaram a maturidade da plena luz, as imaginações plenamente amadurecidas e, no entanto, rejeitadas pelo desespero de as levar a cabo, as opções e as rejeições longamente ponderadas, as tão difíceis emendas e acrescentos, numa palavra, as rodas e as empenas, as máquinas para mudança de cenário, as escadas e os alçapões, o vermelhão e os postiços que em 99% dos casos constituem os acessórios do histrião literário. Edgar Allan Poe*, in A Filosofia da Composição *No 200º centenário do nascimento

domingo, janeiro 18, 2009

25 anos de saudade Ecce Homo Desbaratamos deuses, procurando Um que nos satisfaça ou justifique. Desbaratamos esperança, imaginando Uma causa maior que nos explique. Pensando nos secamos e perdemos Esta força selvagem e secreta, Esta semente agreste que trazemos E gera heróis e homens e poetas. Pois Deuses somos nós. Deuses do fogo Malhando-nos a carne, até que em brasa Nossos sexos furiosos se confundam, Nossos corpos pensantes se entrelacem E sangue, raiva, desespero ou asa, Os filhos que tivermos forem nossos. José Carlos Ary dos Santos
O veredicto da história Bush gosta de dizer que o veredicto da história sobre a sua presidência apenas virá longos anos após a sua morte. Mas, mais uma vez, o jornalista Dan Froomkin, na sua coluna White House Watch de terça feira, afirma que, longe de esperar que o seu cadáver esteja frio, o veredicto já existe mesmo antes de Bush deixar a Casa Branca. Num retrato cru, digno de ser lido, afirma entre muitas outras coisas, o seguinte: He took the nation to a war of choice under false pretenses - and left troops in harm's way on two fields of battle. He embraced torture as an interrogation tactic and turned the world's champion of human dignity into an outlaw nation and international pariah. He watched with detachment as a major American city went under water. He was ostensibly at the helm as the worst financial crisis since the Great Depression took hold. He went from being the most popular to the most disappointing president, having squandered a unique opportunity to unite the country and even the world behind a shared agenda after Sept. 11. He set a new precedent for avoiding the general public in favor of screened audiences and seemed to occupy an alternate reality. He took his own political party from seeming permanent majority status to where it is today. And he deliberately politicized the federal government, circumvented the traditional policymaking process, ignored expert advice and suppressed dissent, leaving behind a broken government. O texto é longo. mas vale a pena lê-lo com atenção, já que a coluna faz uma recolha das mais variadas opiniões a respeito do “bicho”.

sábado, janeiro 17, 2009

Comunicado Na frente ocidental nada de novo. O povo Continua a resistir. Sem ninguém que lhe valha, Geme e trabalha Até cair. Miguel Torga

(Ex)citações Se eu fosse um dirigente árabe, nunca assinaria um acordo com Israel. É normal, nós tirámos-lhes o país. É verdade que Deus no-lo prometeu, mas para que é que isso lhes serve? O nosso Deus não é o Deus deles. Tem havido anti-semitismo, houve os Nazis, Hitler, Auschwitz, mas que culpa é que eles têm? Só podem ver uma única coisa: viemos e roubámos-lhes o seu país. Porque teriam de aceitá-lo? David Ben Gurion, primeira pessoa a assumir as funções de Primeiro Ministro de Israel Cada vez que fazemos alguma coisa dizes que “os Estados Unidos farão isto ou aquilo...”. Quero deixar uma coisa bem clara: não te preocupes com a pressão dos Estados Unidos sobre Israel. Nós, o povo judeu, controlamos os Estados Unidos e os estado-unidenses sabem-no. Ariel Sharon, em 3 de Outubro de 2001, em conversa com Shimon Peres Entre os fenómenos políticos mais perturbadores dos nossos tempos encontra-se o aparecimento do Partido da Liberdade (Herut), no recém criado Estado de Israel; um partido político cuja organização, método, filosofia política e convocação social evocam o Partido Nazi e o Partido Fascista. Albert Einstein, Hanna Arendt e outras personalidades estado-unidenses de origem judaica num texto, para o jornal The New York Times, de protesto pela visita de Menachem Begin aos Estados Unidos, em Dezembro de 1948 O poder de Hitler emanava da “Lei Habilitante”, aprovada com todo o rigor jurídico pelo Reichstag e que permitiu que o Führer e os seus representantes fizessem o que lhes desse na gana ou, em jargão legal, emitissem normas com força de lei. O Knesset aprovou exactamente o mesmo tipo de lei imediatamente a seguir às conquistas de 1967, outorgando, assim, ao dirigente de Israel e aos seus representantes um poder comparável ao de Hitler, poder que têm exercido ao estilo hitleriano. Dr. Israel Shahak, Presidente da Liga Israelita para os Direitos Humanos e Civis, sobrevivente do campo de concentração de Bergen-Belsen, num comentário sobre as Normas de Emergência do exército israelita a seguir à guerra de 1967 Devolver os territórios ocupados? Não há ninguém a quem os devolver. Golda Meir, uma semana de assumir o cargo de Primeira Ministra de Israel, em 8 de Março de 1969.

sexta-feira, janeiro 16, 2009

Imagens...
Armazéns de um refúgio da ONU, bombardeado ontem por Israel. Nos armazéns encontrava-se um elevado número de pessoas, entre trabalhadores humanitários da ONU e refugiados palestinos, para além de centenas de toneladas de medicamentos e comida. Um antro de “terroristas”, segundo os sionistas guerreiros (imagem do The New York Times).
Um trabalhadora humanitária da ONU foge dos armazéns em chamas e vê-se estampada na sua cara a marca de “terrorista” (imagem do The New York Times).
Bombas de Fósforo Branco sobre Gaza. Trata-se de uma arma química proibida pela convenção de Genebra, já utilizada na Guerra do Iraque e agora em Gaza (filho de peixe sabe sempre nadar). Desde o início do massacre que a utilização deste tipo de bombas foi denunciada, facto que Israel sempre negou. Agora, o chefe da Missão Humanitária da ONU afirmou que sobre os armazéns tinham caído pelo menos três (imagem retirada da rede sem identificação da origem). Conclusão: Os terroristas são os outros.

quinta-feira, janeiro 15, 2009

Assassinada há 90 anos No meio das trevas, sorrio à vida, como se conhecesse a fórmula mágica que transforma o mal e a tristeza em claridade e em felicidade. Então, procuro uma razão para esta alegria, não a acho e não posso deixar de rir de mim mesma. Creio que a própria vida é o único segredo. Rosa Luxemburgo - in Cartas da Prisão
Abaixo assinado Um grupo de destacados judeus britânicos publicou, no passado Sábado, uma carta sobre a actual situação em Gaza. Ei-la: Nós, os abaixo assinados, somos todos de origem judaica. Quando vemos os mortos e os corpos ensanguentados de crianças pequenas, os cortes de água, de electricidade e de comida, somos relembrados do cerco ao Gueto de Varsóvia. Quando Dov Weisglass, um conselheiro do primeiro ministro, Ehud Olmert, falou sobre pôr os habitantes de Gaza "a dieta" e o vice-ministro da Defesa, Matan Vilnai, falou dos Palestinos sentirem na pele “uma shoah maior” (holocausto), isso recorda-nos o Governador Hans Frank na Polónia ocupada pelos Nazis, que falou de “morte à fome”. O verdadeiro motivo do ataque a Gaza é que Israel apenas deseja negociar com os Palestinos traidores. O principal crime do Hamas não é o terrorismo mas a sua recusa em aceitar tornar-se um fantoche nas mãos do regime de ocupação israelita na Palestina. A decisão tomada no mês passado pelo Conselho da União Europeia de melhorar as relações com Israel, sem nenhumas condições específicas sobre direitos humanos, encorajou a agressão israelita que se seguiu. O tempo para acalmar Israel passou há muito. Como primeiro passo, a Grã-Bretanha deve retirar o embaixador britânico de Israel e, como sucedeu com o apartheid na África do Sul, tomar parte num programa de boicote, desinvestimento e sanções. Assinaturas: Ben Birnberg, Prof Haim Bresheeth, Deborah Fink, Bella Freud, Tony Greenstein, Abe Hayeem, Prof Adah Kay, Yehudit Keshet, Dr Les Levidow, Prof Yosefa Loshitzky, Prof Moshe Machover, Miriam Margolyes, Prof Jonathan Rosenhead, Seymour Alexander, Ben Birnberg, Martin Birnstingl, Prof. Haim Bresheeth, Ruth Clark, Judith Cravitz, Mike Cushman, Angela Dale, Merav Devere, Greg Dropkin, Angela Eden, Sarah Ferner, Alf Filer, Mark Findlay, Sylvia Finzi, Bella Freud, Tessa van Gelderen, Claire Glasman, Ruth Hall, Adrian Hart, Alain Hertzmann, Abe Hayeem, Rosamene Hayeem, Anna Hellmann, Selma James, Riva Joffe, Yael Kahn, Michael Kalmanovitz, Ros Kane, Prof. Adah Kay, Yehudit Keshet, Mark Krantz, Bernice Laschinger, Pam Laurance, Dr Les Levidow, Prof. Yosefa Loshitzky, Prof. Moshe Machover, Beryl Maizels, Miriam Margolyes, Helen Marks, Martine Miel, Diana Neslen, O Neumann, Susan Pashkoff, Hon. Juliet Peston, Renate Prince, Roland Rance, Sheila Robin, Ossi Ron, Manfred Ropschitz, John Rose, Prof. Jonathan Rosenhead, Leon Rosselson, Michael Sackin, Ian Saville, Amanda Sebestyen, Sam Semoff, Prof. Ludi Simpson, Viv Stein, Inbar Tamari, Ruth Tenne, Norman Traub, Eve Turner, Tirza Waisel, Karl Walinets, Renee Walinets, Stanley Walinets, Philip Ward, Naomi Wimborne-Idrissi, Ruth Williams, Jay Woolrich, Ben Young, Myk Zeitlin, Androulla Zucker, John Zucker. O original pode ser encontrado aqui.

quarta-feira, janeiro 14, 2009

Coroa mural Muro que hoje separa os homens em passado e futuro, que divide, agora, o coração em dois: em oriente e ocidente. Divide o sol em dois: em dois mistérios. Divide o mundo em dois: em dois hemisférios, Ou em dois cemitérios? No labirinto do desentendimento humano o anjo rebelde se debate em busca de uma saída. E ao mesmo tempo, é expulso de uma cor para outra, deixando os pés escritos em areia e neve, na rude geografia das injustiças. (Só a dor e as estrelas são universais). Mas, como destrui-lo? Com as velhas trombetas de Jericó, já douradas de pó? Recolocando, no ar, em seu lugar, agora o novo arco celeste de uma ponte pênsil? Ou com a lira em flor Que Anfião tocou em Tebas? Anfião, a quem possam as pedras transformar-se, de novo, em pássaros? Ou com o sol de hidrogénio e só pelo consolo de morrermos, todos, - todos, ao mesmo tempo - e, assim, um ser irmão do outro, por prêmio? Ah! o herói obscuro a quem - todos - pudéssemos, os que sofremos dentro e fora do muro; de um só mal, todos presa, ofertar, toda em ouro, a coroa mural, Igual à que os romanos, num afresco antigo, estão oferecendo, sob um céu de turquesa, ao primeiro soldado que escalou a muralha de uma fortaleza. O dia é geográfico A noite é universal. Mas, se Deus ouvir rádio, esteja onde estiver, ouvirá o meu grito: por que a noite nos une e o dia nos separa? Cassiano Ricardo* *poeta brasileiro

terça-feira, janeiro 13, 2009

Última conferência de imprensa Cá fora...
... e lá dentro

Os últimos bushismos oficiais podem ser ouvidos aqui ou lidos aqui.

segunda-feira, janeiro 12, 2009

A força da propaganda Robert Fisk é um multi-premiado jornalista e escritor inglês, descrito pelo The New York Times com sendo “provavelmente o mais famoso correspondente estrangeiro da Inglaterra”. Presentemente é o correspondente do jornal inglês The Independent no Médio Oriente, onde tem vivido e escrito durante mais de 30 anos, acompanhando a guerra civil do Líbano, a revolução Iraniana, a guerra Irão-Iraque, a primeira guerra do Golfo, a invasão do Iraque e todos os conflitos israelo-árabes. Sobre a actual situação na Faixa de Gaza tem escrito vários artigos para o seu jornal, afirmando num deles, datado de 7 de Janeiro: O que surpreende é que tantos líderes Ocidentais, tantos presidentes e primeiros-ministros e, temo, tantos editores e jornalistas tenham acreditado na velha mentira: que os israelitas tem grande cuidado em evitar vítimas civis. “Israel faz todos os esforços possíveis para evitar baixas civis”, disse um embaixador israelita poucas horas antes do massacre de Gaza. E todos os presidentes e primeiros-ministros que repetiram esta mentira, como desculpa para iludir um cessar-fogo, têm as mãos sujas do sangue da carnificina da última noite. O artigo completo pode ser lido aqui e o rol de todos os seus artigos sobre a situação encontram-se aqui. Como seria bom que um tal “paquete”, que diz ter por função prover a objectividade informativa da televisão pública, se deixasse das questões de lana caprina com que anda a armar ao pingarelho para atirar areia para os olhos dos telespectadores e verificasse quanto custa aos contribuintes a equipa, capitaneada por Márcia Rodrigues, que se encarrega da (má) tradução dos comunicados do exercito israelita e da captação das imagens pelo ele seleccionadas .

domingo, janeiro 11, 2009

Sionismo e Anti-semitismo Qualquer pessoa que, na civilização ocidental, se atreva a criticar a política de Israel é imediatamente apodado de anti-semita, mesmo que seja judeu e tenha dado provas de clara condenação do anti-semitismo. Mas condenar Israel e o sionismo (o sionismo, na sua versão pura e dura, sempre foi e continua a ser o velho sonho de construir a Grande Israel através da conquista da totalidade das terras bíblicas, expulsando, ou mesmo aniquilando, os não judeus que lá viverem) não é sinónimo de anti-semitismo ou racismo. Pelo contrário, o sionismo é não apenas racista, é também anti-semita. É isso, preto no banco, que afirma a Rede Judia Anti-sionista Internacional (IJAN) na sua carta fundadora, divulgada no passado dia 29 de Setembro. Para quem preferir o castelhano, tem aqui um boa tradução.

sábado, janeiro 10, 2009

A invenção da alma Pronto: morri. E agora? Agora preciso do teu amor mais do que nunca Carlos Nóbrega* *poeta brasileiro

sexta-feira, janeiro 09, 2009

Amores precoces Para fazer uma pausa na guerra, falemos de amores, no caso muito precoces. Mika , de 6 anos, à direita na foto e a sua namorada Anna-Bell, de 5 anos, à esquerda, queriam fugir e casar num sítio exótico e, se bem o pensaram, melhor tentaram fazê-lo. Depois de magicarem em segredo sobre as opções que tinham, fizeram as malas na véspera do Ano Novo e procuraram pôr-se a andar da cidade de Hanover para darem o nó sob o calor do sol africano. Partiram ao amanhecer, enquanto os pais dormiam, acompanhados de Anna-Lena (ao centro), de 7 anos, a irmã de Mika que iria ser madrinha de casamento. Munidos de óculos de sol e braçadeiras para nadar e arrastando um colchão insuflável cor-de-rosa e as malas com rodas, cheias de roupa de verão, bonecos de peluche e algumas provisões, andaram um quilómetro a pé pela estrada, apanharam um eléctrico para a estação de comboios e foram até ao comboio expresso que os levaria ao aeroporto, quando um desconfiado guarda da estação alertou a polícia. Segundo o porta voz da polícia, “o que nos deixou perplexos foi o facto de os pequenitos estarem completamente na sua e terem montes de acessórios de natação com eles”. Em declarações à RTL, Anna-Bell afirmou: “nós queríamos casar e, portanto, pensámos simplesmente: vamos até lá!”. Por sua vez, Mika declarou: “nós queríamos apanhar o comboio para o aeroporto, depois apanhar um avião e, quando chegássemos, tirar das malas as coisas de verão e ir dar uma voltinha ao sol”. Como diria o ancião Fernando Pessa: e esta, hein??! (história completa, aqui)
Grito, choro e.... Imagens Para os que continuam por aí a afirmar que a totalidade ou a maior parte da culpa do massacre é do Hamas, talvez seja urgente lerem este testemunho do bem conhecido Presidente da AMI, Fernando Nobre, no seu blogue Contra a Indiferença. Como qualquer mortal, ele até talvez possa ser acusado de alguma coisa, mas não me perece que possa ser apelidado de anti-semita ou fanático terrorista islamita. ***
Uma imagem vale mais do que mil palavras e dezenas de imagens valem mais do que centenas de dissertações; mas, Cuidado! Estas não são recomendadas a mentes demasiado sensíveis. O horror que as nossas televisões e jornais não mostram, a partir de um sítio norueguês.

quinta-feira, janeiro 08, 2009

Trombetas de guerra Aqui e agora as coisas são assim: a oposição à paz é sempre legítima e patriótica; a oposição à guerra é traição, é anti-Israel e deve ser silenciada. Esta semana, ao apresentar o seu programa "London & Kirschenbaum", Yaron London reconheceu que começa a haver problemas: "Tivemos problemas quando estávamos a preparar este programa. Conhecemos que o amplo consenso é a favor da operação – atacá-los duramente, mas também há outras vozes, não só dos israelo-árabes mas também de judeus. Encontramos alguns judeus que acreditam que a operação deve ser suspensa, ou que jamais deveria ter sido sequer lançada, e que é preciso iniciar negociações políticas. Essa não é minha perspectiva. Em artigos que tenho escrito apelei a uma coisa diferente. Mas a voz deles também tem de ser ouvida. Falar sozinho leva sempre ao desastre. O problema é que eles têm medo. Há outras vozes que estão a ser aterrorizadas e reduzidas ao silencio Assim começa um elucidativo artigo da autoria do conceituado jornalista israelita Gideon Levy, publicada no jornal israelita mais conhecido internacionalmente - o Haaretz, a seguir à invasão de Gaza. Nele podemos aperceber-nos da realidade da preparação da população para a inevitabilidade da guerra, da animosidade de que são alvo os que lutam pela paz, de quem é responsável pelo quê, da manipulação e de outras coisas mais, que não chegam até nós através da comunicação social “de referência”. Escrito numa linguagem clara e sem rodriguinhos, a sua leitura é fácil. Mas, para quem, mesmo assim, tenha alguma dificuldade com o inglês, existe uma tradução para português do Brasil, disponível aqui, mas que não reputo de muito bem conseguida. Muito revelador de quem é a maior parte da responsabilidade pela actual situação, é um artigo publicado no The Washington Post de hoje, da autoria do antigo presidente Jimmy Cárter, que pode ser lido aqui.

quarta-feira, janeiro 07, 2009

Outra vez de “tanga” Não consigo perceber o reboliço de ontem por o Governador do Banco de Portugal ter reconhecido que o país estava em recessão. Honras de abertura nos noticiários e telejornais, inquéritos de rua em que nem inquiridores nem a maioria dos inquiridos faziam a mínima ideia daquilo de que se estava a falar e mais um pequena “homilia” do “sacristão” da Católica (sempre ele) para dizer que recessão era a diminuição do produto por 2 trimestres consecutivos, como se o cidadão português desconhecedor do economês entendesse muito bem que produto era esse. O Produto Interno Bruto, vulgo PIB, os produtos do hipermercado, das mercearias e do comércio em geral, o produtos que costumam fazer parte do incrível aviso “os produtos expostos são para consumo da casa”, como se a casa comesse ou bebesse, ou o produto de um bar de alterne? Mas alguém de bom senso estava à espera de que a recessão económica não atingisse cá o rectângulo, num momento em que todos os nossos parceiros comerciais estão em recessão? Parece é que nunca vamos ter uma recessão da cretinice, pois essa cresce diariamente. Em boa hora a RTP1 teve a ideia de convidar dois jornalistas de economia para, logo a seguir ao telejornal, virem explicar ao povoléu o que se estava a passar. O Pedro Guerreiro, director do Jornal de Negócios, esteve menos mal, embora não tenha a clareza de um Sérgio Figueiredo e manifestasse alguma dificuldade em fazer passar a mensagem. Já o Martin Avillez Figueiredo, que eu não conhecia mas foi director do Diário Económico e estava a preparar o lançamento de um novo diário (não sei se já saiu), foi uma agradável surpresa. Claro, preciso e conciso e com uma mensagem muito positiva de que “é preciso não alarmar demais a população”, pois isso só piora os efeitos da crise. Muitos já o sabiam desde o discurso da “tanga” de há anos, mas é sempre bom que um jornalista que parece ter a coluna vertebral direita o venha afirmar. Pela minha parte, obrigado ao Martim e ao Pedro.
Pateticismo e patetismo Por princípio, apenas ouço telejornais na RTP, não apenas porque é um canal pago com os meus impostos e as experiências de “crimes de faca e alguidar” que tive com os outros canais foram muito más, mas sobretudo porque, sendo um serviço público, tem a obrigação de mostrar uma certa imparcialidade. Não tem sido assim no relato do que se está a passar na Faixa de Gaza, com a pateta e patética Márcia Rodrigues a debitar “bocas” que mais parecem comunicados do Ministério do Ataque israelita. É certo que a senhora talvez não possa ir - e julgo que não iria, mesmo que pudesse, tal o medo estampado no rosto quando teve de participar num provável simulacro de fuga para um abrigo - ao “outro lado” para ver o que lá se passa, embora haja quem vá, ou tinha ido quando era possível e ainda lá permaneça. Mas há coisas que nem um aprendiz de jornalista pode escamotear, tais como: 1. Que o Hamas é uma criação de Israel e dos seus serviços secretos quando, nos anos oitenta, era necessário um grupo de diversão para tentar dividir a então bem organizada (e reconhecida internacionalmente) OLP; 2. Que, queiramos ou não, o detestemos ou nos seja indiferente, o Hamas foi livremente eleito em eleições supervisionadas pela União Europeia, obtendo uma substancial maioria na Autoridade Palestina. E, contrariamente ao que já vi escrito, não conquistou a vitória pela força das armas, mas sim por se ter tornado relevante pelos serviços que prestou aos refugiados e pela prestimosa ajuda da corrupção instalada na Fatah; 3. Que Israel, com o total apoio dos Estados Unidos, respondeu a essa eleição com incursões na Faixa de Gaza e na Cisjordânia para raptar um grande número de eleitos, que foram metidos nas prisões de Israel pelo único crime de terem sido eleitos não sendo “paus mandados” dos israelitas. 4. Que a Fatah, vista pela maioria dos palestinos como traidora ao serviço de Israel, largamente minoritária após as eleições, se envolveu numa luta com o Hamas estimulada por Israel, de que resultou o colapso da Autoridade Palestina, com o Hamas a governar Gaza e a Fatah a Cisjordânia e que Israel e os Estados Unidos de imediato apoiaram a sua protegida, rejeitada pela população. Ao contrário do que também já vi escrito, o colapso da AP não foi provocado pela força das armas do Hamas, mas pela recusa da Fatah em aceitar a derrota e governar em conjunto, em clara minoria; 5. Que Israel impôs, de imediato, devastadoras sanções económicas a Gaza e pressionou fortemente a UE para que o Hamas fosse declarado um grupo terrorista; 6. Que aos palestinos de Gaza só resta a alternativa de tentar combater ou morrer; 7. Que Israel violou sucessivamente o cessar fogo, matando e prendendo dezenas e dezenas de palestinos e impondo um embargo total, por terra, mar e ar, desde 5 de Novembro passado, expulsando intelectuais judeus críticos do belicismo e até o próprio representante das Nações Unidas para os Direitos Humanos; 8. Que as eleições israelitas são em Fevereiro, que há uma espécie de vazio de poder na Casa Branca e que a assassina monstruosa que dá pelo nome de Tzipi “não há tragédia humanitária em Gaza” Livni, a perder terreno para Netayahu, lançou, em conluio com os seus compinchas do Kadima, um mortífero ataque à região mais densamente povoada do globo, exclusivamente para ser eleita primeira ministra, não importa à custa de quantos cadáveres do odiado inimigo. Talvez a cabeça da enviada da RTP não tenha capacidade para fazer a leitura dos acontecimentos mas, que diabo!, o José Rodrigues dos Santos (que, pelo menos, seria menos mau) ainda lá está, o dinheiro gasto seria o mesmo e a informação seria, certamente, de uma qualidade menos má. Após a elaboração desta posta, tomei conhecimento de um extenso artigo publicado no The Guardian de hoje, da autoria do insuspeito historiador judeu, professor de relações internacionais em Oxford e antigo membro do exército israelita, Avi Shlaim. Recomendo a todos a sua leitura atenta, principalmente aos que, porventura, pensem que eu exagero.

terça-feira, janeiro 06, 2009

Citações So I believe that I act in the spirit of the Almighty God. By defending myself against the Jew, I am fighting for the work of the Lord.” Adolf Hitler, Mein Kampf, 1924 “A thousand non-Jewish lives are not worth a Jew’s fingernailDov Lior, Rabino de Kiryat Arba - Abril de 2004 Oitenta anos separam estas duas afirmações. Mas a intolerância e o ódio racista são os mesmos. Como é a mesma a finalidade: para Hitler, exterminar os judeus era o meio de obter a tão ansiada como mítica raça ariana pura; para o sionismo, aniquilar os palestinos é a tentativa, votada ao fracasso, de fazer esquecer que Israel é um estado terrorista, fundado e mantido com base no terrorismo, com o beneplácito da “civilização”, para quem os que estão do “nosso” lado são sempre bons, ao passo que o que estão do lado dos “outros” são invariavelmente maus. Na imagem podem ver-se crianças, certamente “terroristas”, a fugir do campo de refugiados da Jabalya, um dos alvos apetecidos de Israel. Mas fugir para onde, se estão numa autêntica prisão? Os tão apregoados avisos de Israel à população para que abandone alguns locais são tão “humanitários” como a acção dos cães perdigueiros que vão de moita em moita "levantar" as aves para que os caçadores possam disparar à vontade. Imagem: Mohammed Abed/AFP/Getty Images

segunda-feira, janeiro 05, 2009

ANIMAL aves pisam em folhas secas da noite marcas de ferradura do poeta que dormiu animal Carlos Alberto Pessoa Rosa* *poeta brasileiro

domingo, janeiro 04, 2009

Henfil
Henrique de Souza Filho, humorista, cartunista, jornalista e escritor brasileiro, mais conhecido como Henfil, morreu há 21 anos, com 44 anos de idade, porque, sendo hemofílico, foi contaminado numa transfusão de sangue infectado com o vírus da SIDA. Criador de figuras carismáticas com Fradim Baixim, Fradim Cumprido e Capitão Zeferino, foi um incansável lutador contra a ditadura brasileira, tendo escrito no livro Diretas Já: É preciso a certeza de que tudo vai mudar; É necessário abrir os olhos e perceber que as coisas boas estão dentro de nós: onde os sentimentos não precisam de motivos nem os desejos de razão. O importante é aproveitar o momento e aprender sua duração; Pois a vida está nos olhos de quem sabe ver ... Se não houver frutos, valeu a beleza das flores. Se não houver flores, valeu a sombra das folhas. Se não houver folhas, valeu a intenção da semente.

sábado, janeiro 03, 2009

Quimeras para 2009 Janeiro: Blair, Aznar e Barroso são presos e transportados para Haia para serem julgados pelo TPI por crimes de guerra e contra a humanidade, pela destruição física, social, cultural e moral do Iraque, provocando mais de um milhão de mortos. Fevereiro: Bush é preso no seu rancho e enviado para Haia como criminoso de guerra, a bordo do “Criminoso de Guerra Um”. Março: Os Estados Unidos começam a retirar do Iraque; Bin Laden ordena aos seus sequazes que parem as acções naquele país até ver em que param as modas. Abril: Dick Cheney, que anda a caçar andorinhas na Florida, calcula mal o tiro, a bala faz ricochete e atinge-o mesmo no meio da testa. Antes de expirar ainda tem alento para dizer: eu sou o gajo que puxou o gatilho que fez disparar a bala que me atingiu na testa. Maio: A NATO começa a retirar do Afeganistão e os Talibans e Bin Laden cessam as hostilidades também naquele país. Em Myanmar, a junta militar demite-se, Aung San Suu Kui assume o seu lugar como chefe do Governo, o país volta a ser a Birmânia e a capital regressa a Rangoon. Junho: Acaba a retirada do Iraque. Mokata Al Sadr encabeça gigantescas manifestações de paz em Bagdade, Bassorá e Tikrit. Xiitas, Sunitas e Curdos chegam à conclusão de que o melhor é permanecerem juntos e tratarem da reconstrução do país. Julho: A Turquia retira do Chipre, faz as pazes com a Grécia e entrega o governo do Curdistão ao PKK. Agosto: O Conselho de Segurança da ONU aprova, por unanimidade e aclamação, o embargo total de armas a todos os países africanos onde há conflitos. E, milagre dos milagres, todos os países o cumprem escrupulosamente. Setembro: Para acabarem de vez com o problema de Caxemira, indianos e paquistaneses votam maciçamente na união dos dois estados, transformando o novo país – o Indostão - no garante da paz na zona. Outubro: A NATO abandona definitivamente o Afeganistão, o Mulah Omar assume democraticamente o poder, elaborando uma constituição laica que dá às mulheres direitos iguais aos dos homens e liberdade de vestirem o que muito bem entenderem e Bin Laden retira-se para Meca para orar e ler o Corão, mandando os seus homens formar uma organização humanitária chamada Com Todos pelo Islão, chefiada pelo seu número 2, Dr. Ayman Muhammad Rabaie al-Zawahiri, a qual será financiada pelo petróleo árabe e só dará a sua missão por cumprida quando não houver uma única criança no mundo faminta, doente, analfabeta ou sujeita a trabalho escravo. Novembro: Israel, Hamas, Fatah, Hezbollah, Síria, Jordânia e Egipto reúnem-se em Jerusalém oriental para acabarem com a guerra na região e chegam a resultados animadores. O TPI decide o destino dos 4 “criminosos de guerra”: Blair jura a pés juntos que é Blair e não Bliar, mas não convence, é condenado a prisão perpétua e beatificado em vida por Bento XVI; o inefável Bush continua a afirmar apenas ter obedecido à voz de Deus, é condenado a prisão perpétua com trabalhos forçados na Coreia do Norte; Aznar engasga-se no bigode, diz que foi aos Açores apenas a convite do amigo Zé Manel, sendo condenado a 47 anos de prisão com a obrigação de utilizar o cilício da Opus Dei na coxa direita, mesmo durante o banho semanal de água fria; o Zé Manel é condenado a passar 10 anos na Coreia do Norte a servir cafés ao Kim Jong-Il e seus homens de mão e água morna ao Mr. W. ou, em alternativa, a ir para a Madeira com a Margarida limpar toda a porcaria que o AJJ fez durante 30 anos. Dezembro: Após, como convidado de honra, ter discursado brilhantemente sobre paz, amor e convivência pacífica em fóruns tão diversos como O Congresso dos Estados Unidos, o Parlamento inglês, O Knesset israelita e a Praça de São Pedro, em Roma, Ahmadinejad abandona o programa nuclear, revoga a lei islâmica, manda regressar os Aiatolás às mesquitas, tudo com manifestações de apoio de milhões de iranianos - principalmente iranianas sem véu - nas ruas de Teerão. Com a reconstrução do Iraque a caminhar a todo o vapor, o petróleo desce para os 20 dólares por barril. É Natal e tempo de compromissos para 2010, ano em que serão resolvidos os conflitos residuais que, entretanto, se têm mantido em “banho maria”.

sexta-feira, janeiro 02, 2009

Verticalidade Sempre que me é possível oiço o concerto de Ano Nova da Orquestra Filarmónica de Viena que constitui, já, um acontecimento de nível mundial. Com efeito, apesar do adivinhado cheiro a naftalina das vestimentas da assistência, muita dela provavelmente analfabeta musical, e da frequente repetição de algumas das peças tocadas, a sua beleza e o virtuosismo dos músicos são dignos de uma audição atenta. O deste ano teve um sabor particular de esperança, por ter sido dirigido por Daniel Barenboïm, precisamente quando decorre mais um massacre em Gaza. Para além de renomado maestro, Daniel Barenboïm é um autêntico cidadão do mundo e um exemplo da luta pela paz. Nascido na Argentina, de origem judaica e ascendência russa, para além da cidadania argentina adquiriu as cidadanias israelita e espanhola e, em Janeiro de 2008, tornou-se, também, cidadão palestino. Vale a pena perceber as razões porque tomou esta última decisão, na entrevista dada ao jornal francês Nouvel Observateur , também disponível numa tradução para castelhano.

Imagem : AP Photo/Lilli Strauss

quinta-feira, janeiro 01, 2009

Repouso Paz das alturas, evasão furtiva Da inquietação rasteira. Aprazível clareira Na floresta do tempo penitente. Branca serenidade passageira Onde tudo é sereno eternamente. Um pequeno descanso refractário De ser homem. Pousei o meu carrego. A cavalo na terra, olho-a de cima, Fugido à força de atracção que anima O seu desassossego. Miguel Torga Poesia Completa II – D. Quixote – Junho de 2007