Elegia da
Minha Infância
Eis a minha
fotografia de criança
a cravar em
mim meus olhos, mais profundos que nunca,
com uma
coisa vaga
pousada
entre as mãos, distraídas e leves.
É o banco de
pedra
– os pés não
chegando ao chão ainda –
do parque de
meus sonhos infantis
onde o sol
era amigo
e a areia
tomava
um tacto de
mãe velha e conhecida.
… Guardo a
imagem turva
de um menino
que, de repente, se distrai
no meio dos
jogos
e ao poente
fica pensativo
a escutar o
rumor distante das ruas…
O mundo ia
nascendo pouco a pouco
para mim
unicamente.
A terra era
uma alegre maçã de merenda,
um balão de
cores inesperado.
Os pássaros
cantavam porque eu estava a ouvi-los,
as árvores
nasciam quando eu abria os olhos…
E os medos,
depois…
Tudo podia
ser no escuro do quarto.
Ao fundo do
corredor
pulsava todo
o negro deste mundo,
todas as
vagas forças inimigas,
todas as
negações…
Alma da
minha infância!
Só vivo por
completo quando volto a menino.
Que outra
revelação maior do que essa
do mundo e
da vida em minhas mãos?
(… quando
todas as coisas eram como palavras…)
Que sonho
como aquele
de
pressentir do limiar da alma
os dias a
esperar-me?
Oh, Senhor,
aquele menino que era eu,
suplica-te, morto,
que o deixes
viver no meu presente um pouco!
Que continue
em mim, Deus meu – como tu nos dizias -,
e viverei
completamente,
e sentirei
plenamente a vida,
e serás o
meu assombro virginal cada manhã…
(escritor
estremenho nascido faz hoje 87 anos)
Tradução de
José Bento
1 comentário:
O menino merecia melhor. Muito melhor.
Abraço
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