How many times must a man look up, Before he can see the sky? How many ears must one man have, Before he can hear people cry? The answer, my friend, is blowin' in the wind. The answer is blowin' in the wind.
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quinta-feira, julho 31, 2014
Engodo
A poesia não
pode tratar de mim,
nem eu da
poesia.
Estou só, o
poema está só,
o resto é
dos vermes.
Estava à
beira das ruas onde moram as palavras,
livros,
cartas, notícias,
e esperava.
Sempre
esperei.
As palavras,
em formas claras ou escuras,
transformaram-se
em alguém escuro ou mais claro.
Poemas
passam por mim
e
reconheciam-se como coisa.
Via-o e
via-me.
Esta
escravidão não tem fim.
Esquadrões
de poemas procuram os seus poetas.
Vão errando
sem comando pelo grande distrito das palavras
e esperam o
engodo da sua forma
feita,
perfeita, fechada,
concentrada
e
intangível.
(poeta holandês
que hoje faz 81 anos)
Tradução de
Fernando Venâncio
quarta-feira, julho 30, 2014
Os poemas
Os poemas
são pássaros que chegam
não se sabe
de onde e pousam
no livro que
lês.
Quando
fechas o livro, eles alçam vôo
como de um
alçapão.
Eles não têm
pouso
nem porto
alimentam-se
um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas,
então, essas tuas mãos vazias,
no
maravilhado espanto de saberes
que o
alimento deles já estava em ti...
(poeta
gaúcho nascido faz hoje 108 anos)
terça-feira, julho 29, 2014
Tu és
inteiro
Tu és
inteiro
e eu a
fracção de ti
que não é
perfeita.
Desembrulho-me,
rompendo pele
e faixas que
me ocultam,
ofereço-me
num búzio de mar
para que
oiças o leve sopro do meu coração.
Sim, encosta
a concha aos teus sentidos
e sente como
sou quebradiça,
tão
temporariamente menina
que te
espera até o tiquetaque
anunciar a
hora da descoberta.
És completo
e eu…
….pedaços
fragmentados
de um tempo
tão longínquo,
onde mares
não existiam,
apenas a
aridez da mutismo.
E escutas o
som desse búzio
de uma
qualquer praia
perdida no
finito do teu esquecimento.
Renasce a
pele,
reacende a
luz no brilho de papel de seda…
Novamente me
invólucro
à espera de
ser inventada…
sim, porque
tu és inteiro
e eu a
fracção de ti
que não é
perfeita.
(poetisa
portuense que hoje faz 56 anos)
segunda-feira, julho 28, 2014
PROFECIA
Cada gesto
de ódio
cada gesto
de prepotência
cada gesto
para amordaçar a verdade
cada gesto
para amparar a mentira
cada gesto
que suprime outro gesto
cada gesto -
indigesto
‑
voltará implacável como um «boomerang»
e ninguém
escapará a essa lei.
(poeta
lisboeta nascido faz hoje 94 anos)
Afixado em
28/07/2014
domingo, julho 27, 2014
CHUVA
CONGELADA
Reduzo a
cascata a um candelabro, fios
De luz,
ossos descarnados pelo gelo
Que se
refazem nas bandagens de vidro
E, onde o
lago age como nível de bolha,
Guardo
bolsas de ar para que a lontra viva.
Aumento uma
a uma as lâminas de grama
Com brotos,
chuva congelada e sincelos,
Polegar,
dedos que apontam o degelo
Derretem,
entre o lábio e a língua, até o âmago
Enquanto o
vento toca órgão nos ramos.
(poeta
norte-irlandês que hoje faz 75 anos)
Tradução:
Marcelo Tápia
PROMETEU
SUBURBANO
Tenho uma
vontade grande
de sair pelo
mundo sem destino
de ir-me
à-toa,
como uma
folha morta
ao capricho
de todos os tempos,
ao acaso de
todos os caminhos.
Tenho um
desejo imenso
de me largar
pelo mundo
-navio sem
leme nem bússola,
na delícia
de um de-déu-em-déu
ao
deus-dará.
Deus, porem,
me fez trapo
- trapo
humano, já se vê –
e me cingiu
a inércia do trabalho
preso a lama
da terra.
Mas Ele é
bom. E deixa
que minha
cabeça viva entre as estrelas…
(poeta
paulista falecido faz hoje 40 anos)
sábado, julho 26, 2014
Solidão
Vago aroma
de esteva, ao mesmo tempo ardente e virgem,
E este
murmúrio doce da folhagem,
São o falar
do mato, na estiagem,
Segredando
os mistérios da origem.
Calma
profunda, doce, resignada...
A vida não é
mais do que o viver
Da paisagem
nostálgica e pasmada.
A solidão
tem dedos de veludo,
De frementes
afagos delicados.
- Bendita
solidão, que beijas tudo,
Onde andarão
meus sonhos desvairados?!...
Nestes
montados, Que purificação me invade a alma!
Como entra,
em mim, toda a serenidade
Dos
ermitões, orando na paisagem!
Nesta
paisagem,
Calma,
calma, calma,
Como a
Eternidade.
(poeta
portuense nascido a 26 de Julho de 1905)
sexta-feira, julho 25, 2014
o meu riso vai alto
O meu riso
vai alto,
Mais alto
que os chapéus dos cardeais
Mais alto
que a esperança
Os meus
seios riem quando o sol brilha,
Apesar dos
meus fatos apesar do meu noivo.
Feia que
sou, sou feliz.
Deus e os
vampiros
Amam-me.
(poetisa
franco-egípcia nascida faz hoje 86 anos)
Tradução de
Mário Cesariny
quinta-feira, julho 24, 2014
quarta-feira, julho 23, 2014
terça-feira, julho 22, 2014
Lisboa:
aventuras
tomei um
expresso
cheguei de foguete
subi num
bonde
desci de um elétrico
pedi
cafezinho
serviram-me uma bica
quis comprar
meias
só vendiam peúgas
fui dar à
descarga
disparei um autoclismo
gritei
"ó cara!"
responderam-me "ó
pá!"
positivamente
as aves que
aqui gorjeiam não gorjeiam como lá
(poeta
paulista nascido faz hoje 88 anos)
segunda-feira, julho 21, 2014
domingo, julho 20, 2014
Árvores
São plátanos
palmeiras castanheiros
jacarandás
amendoeiras e até as
oliveiras
que
quando a
noite cai na infância formam uma
cortina
escura na estrada frente à casa
árvores
apagando os dias que a memória
avidamente
esconde
no corpo do
seu gémeo Penetra inutilmente
na terra
essa raiz do branco plátano
adolescente
e o campo do
tempo onde as palmeiras eram
pilares do
corpo nu símbolo de
si mesmo, à
luz
do dia fixo,
já se estende
na húmida
manhã dos castanheiros
Esquecimento
que tudo enfim possuis
e geras
a ofuscante
luz igual à da
memória, do
tempo como ela
filho,
construtor da ausência,
em vão te
invoco Tu
que mudas a
roxa amendoeira
em brancas
flores do jacarandá
entrega a
minha vida às árvores
que foram na
manhã e no crepúsculo
no meio-dia
e na noite, palavra
clara que
traz o dia em si fechado
(poeta
farense que hoje faz 73 anos)
sábado, julho 19, 2014
PODER
Tu sabes e
conheces melhor do que eu a velha história…
Na primeira
noite, eles se aproximam de nossa casa,
roubam-nos
uma flor e nós não dizemos nada…
Na segunda
noite, eles não só se aproximam da nossa casa,
mas pulam o
muro, pisam as flores, matam o nosso cãozinho
E nós não
dizemos nada…
Até que um
dia, o mais sábio deles entra em nossa casa,
rouba-nos a
luz, arranca a voz de nossa garganta
e aí, então,
meus caros amigos,
é que não
podemos dizer mais nada mesmo.
(poeta russo
nascido faz hoje 121 anos)
sexta-feira, julho 18, 2014
quinta-feira, julho 17, 2014
quarta-feira, julho 16, 2014
Para Ser
Lido Mais Tarde
Um dia
quando já
não vieres dizer-me Vem
jantar
quando já
não tiveres dificuldade
em chegar ao
puxador
da porta
quando
já não
vieres dizer-me Pai
vem ver os
meus deveres
quando esta
luz que trazes nos cabelos
já não
escorrer nos papéis em que trabalho
para ti será
o começo de tudo
Uma outra
vida haverá talvez para os teus sonhos
um outro
mundo acolherá talvez enfim a tua oferenda
Hás-de ter
alguma impaciência enquanto falo
Ouvirás com
encanto alguém que não conheço
nem talvez
ainda exista neste instante
Mas para mim
será já tão frio e já tão tarde
E nem mesmo
uma lembrança amarga
ou doce
ficará
desta hora
redonda
em que
ninguém repara
(Mário
Dionísio nasceu faz hoje 98 anos)
terça-feira, julho 15, 2014
segunda-feira, julho 14, 2014
Ode ao inominado
Em mim,
ó inominado,
ó infigurado,
ó
transfigurado,
em mim
subsistes.
Sémen
primeiro e perene,
aparição
absurda no vazio,
nódulo
subtil e diáfano,
continente
microcósmico de todo o cósmico,
ímpeto puro,
movimento puro,
espectacular
súbito actor original,
haver ser no
não-ser,
espaço
conquistado ao nada,
tempo
inventado,
átomo,
molécula, ínfima partícula,
verbo
indizível,
minúsculo,
majestoso,
pequena
gigantesca energia,
forma
matéria achada,
em mim
subsistes,
existes,
persistes,
vives
crescendo até à altura do infinito,
teu-meu fito
neste atroz,
maravilhoso porto
em que me
debato.
Noite alta,
o sonho
explode, a angústia, esperança,
saudade,
estranheza
de entre-acordar e entre-viver,
emersão em
véus, objectos, emoções que se dissipam
num
quotidiano mal recuperado.
Noite alta,
ó inominado,
sou em ti o
enigma de aparecer, de aparecer-me
e ser.
(António
Quadros nasceu faz hoje 91 anos)
domingo, julho 13, 2014
Eu quero
ouvir o coração falar
Eu quero
ouvir o coração falar
e não os
homens a falar por ele!
Enquanto a
gente fala, há-de parar
no peito a
vida estranha que o impele.
Independente
à forma de o expressar,
o sentimento
existe, e ai daquele
coração
triste que se julgue dar
na cerração
em que a palavra o vele.
Astro no
peito, é sobre a língua chaga.
Dizer uma
alegria ou um tormento
é um mar em
que sempre se naufraga.
Era a
essência de Deus vista e atingida!
Se é a força
da vida o sentimento,
fez-se
palavra para mentir a vida.
(poeta
lamecence falecido faz hoje 74 anos)
sábado, julho 12, 2014
O Pai
Terra de
semente inculta e bravia,
terra onde
não há esteiros ou caminhos,
sob o sol
minha vida se alonga e estremece.
Pai, nada
podem teus olhos doces,
como nada
puderam as estrelas
que me
abrasam os olhos e as faces.
Escureceu-me
a vista o mal de amor
e na doce
fonte do meu sonho
outra fonte
tremida se reflecte.
Depois...
Pergunta a Deus porque me deram
o que me
deram e porque depois
conheci a
solidão do céu e da terra.
Olha, minha
juventude foi um puro
botão que
ficou por rebentar e perde
a sua doçura
de seiva e de sangue.
O sol que
cai e cai eternamente
cansou-se de
a beijar... E o outono.
Pai, nada
podem teus olhos doces.
Escutarei de
noite as tuas palavras:
... menino,
meu menino...
E na noite
imensa
com as
feridas de ambos seguirei.
(Pablo
Neruda nasceu faz hoje 110 anos)
Tradução de
Rui Lage