NÃO ESPERES O TEMPO
Camarada poeta: se puderes
pega na palavra e não te cales
mais. Digo que não esperes,
para cantar, o tempo da colheita.
Agora a fome é tanta
que a palavra pão também se come.
Quem diz pão diz fome e a fome
de a não ter não é sobeja.
Digo que a palavra seara faz crescer
o grão da raiva de a não ter.
Digo que a palavra fonte faz jorrar
rios de sede até ao mar.
A palavra trabalho, a palavra suor,
a palavra amiga, a palavra amor.
A palavra precisa, de vendaval ou brisa:
a que denuncia, a que profetiza.
Digo que a palavra que disseres
se pode desfolhar como os malmequeres:
ou muito ou pouco ou tudo ou nada.
O que não pode é ficar calada.
(Carlos Aboim Inglez faleceu a 13 de Fevereiro de 2002)
2 comentários:
lino
Li para alguém que está aqui ao meu lado, meu marido o "folha seca" que conviveu de perto com o Carlos Aboim e que ficou bastante emocionado ao ouvir as palavras que li deste poema.
Obrigado lino
Beijinho e uma flor
Adélia
Um Homem que nunca se calou.
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