Alí Primera, músico, compositor, poeta e activista político comunista venezuelano, nasceu a 31 de Outubro de 1941
How many times must a man look up, Before he can see the sky? How many ears must one man have, Before he can hear people cry? The answer, my friend, is blowin' in the wind. The answer is blowin' in the wind.
Páginas
▼
segunda-feira, outubro 31, 2011
Mãos dadas
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos,
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.
(poeta mineiro nascido a 31 de Outubro de 1902)
domingo, outubro 30, 2011
Para La Libertad
Para la libertad sangro, lucho, pervivo.
Para la libertad, mis ojos y mis manos,
como un árbol carnal, generoso y cautivo,
doy a los cirujanos.
Para la libertad siento más corazones
que arenas en mi pecho: dan espumas mis venas,
y entro en los hospitales, y entro en los algodones
como en las azucenas.
Porque donde unas cuencas vacías amanezcan,
ella pondrá dos piedras de futura mirada
y hará que nuevos brazos y nuevas piernas crezcan
en la carne talada.
Retoñarán aladas de savia sin otoño,
reliquias de mi cuerpo que pierdo en cada herida.
Porque soy como el árbol talado, que retoño:
aún tengo la vida.
Miguel Hernandez nasceu a 30 de Outubro de 1910
(Canta Joan Manuel Serrat)
sábado, outubro 29, 2011
sexta-feira, outubro 28, 2011
A MORTE DE CALAR
As viagens que sou prenderam-se em redomas
Ao corpo das palavras. À morte de calar.
Do alfabeto meu ignoro as cristalinas
Formas de aladas letras nestes versos finais.
São fantasmas de sol. São fantasmas de sede
Que chegam alta noite para nenhum lugar.
Decifro nas entranhas das trevas migradoras
O solstício da vida além da morte clara.
Mas quem me vem cegar, com setas voadoras
Nega-me agora a paz das secretas paisagens.
Meus Irmãos de astronaves, guiadas por um morto,
Que me esperam e estão, que me cantam e falam.
Que na vazia Cruz crucificam meu corpo
E abandonam a flor, mesmo a meio da sala.
À janela rasgada, para as cinzentas águas,
Encostam-me, sem olhos, e deixam-me ficar.
Não tenho nada mais a escrever sobre as ondas.
E mesmo que tivesse, ninguém leria o mar.
Natércia Freire
(poetisa benaventense nascida a 28 de Outubro de 1920)
Pregão
Vendo nuvens de cores!
as redondas, vermelhas,
para suavizar os calores!
Vendo os cirros arroxeados
e rosas, as alvoradas,
os crepúsculos dourados!
O amarelo astro,
colhido o verde ramo
do celeste pessegueiro!
Vendo a neve, a chama
e o canto do pregoeiro!
(poeta andaluz falecido a 28 de Outubro de 1999)
quinta-feira, outubro 27, 2011
Espelho
Sou de prata e exacto. Não faço pré-julgamentos.
O que vejo engulo de imediato
Tal como é, sem me embaçar de amor ou desgosto.
Não sou cruel, simplesmente verídico —
O olho de um pequeno deus, de quatro cantos.
Reflicto todo o tempo sobre a parede em frente.
É rosa, manchada. Fitei-a tanto
Que a sinto parte do meu coração. Mas cede.
Faces e escuridão insistem em separar-nos.
Agora eu sou um lago. Uma mulher se encosta a mim,
Buscando na minha posse o que realmente é.
Mas logo se volta para aqueles farsantes, o brilho e a lua.
Vejo as suas costas e reflicto-as na íntegra.
Ela paga-me em choro e em agitação de mãos.
Eu sou importante para ela. Ela vai e vem.
A cada manhã a sua face alterna com a escuridão.
Em mim se afogou uma menina, e em mim uma velha
Salta sobre ela dia após dia como um peixe horrível.
(poetisa estado-unidense nascida a 27 de Outubro de 1932)
(tradução inédita de Pedro Calouste retirada daqui)
quarta-feira, outubro 26, 2011
HUMORESCO SILVESTRE
O vento, chefe de esquadrão, comanda os pelotões do mato.
E no horto florestal - quartel das árvores -
os pinheiros e coqueiros
fazem ginástica
sueca.
Os castanheiros
com as flores de penacho
jogam peteca.
Sussurram pífanos e rufos na charanga dos bambus.
E as bananeiras
batendo as raquetas das palmas
batem pelota com a péla da lua.
Mas de repente
silêncio...
Pesa o repouso lunar.
Um grilinho clarina.
E o vento chefe de esquadrão ordena aos ramos “descansar.”
(poeta brasileiro nascido a 26 de Outubro de 1894)
terça-feira, outubro 25, 2011
segunda-feira, outubro 24, 2011
domingo, outubro 23, 2011
sábado, outubro 22, 2011
É Preciso Avisar...
(poeta português falecido a 22 de Outubro de 1988)
É preciso avisar toda a gente
dar notícia informar prevenir
que por cada flor estrangulada
há milhões de sementes a florir
É preciso avisar toda a gente
segredar a palavra e a senha
engrossando a verdade corrente
duma força que nada detenha
É preciso avisar toda a gente
que há fogo no meio da floresta
e que os mortos apontam em frente
o caminho da esperança que resta
É preciso avisar toda a gente
transmitindo este morse de dores
É preciso imperioso e urgente
mais flores mais flores mais flores
sexta-feira, outubro 21, 2011
Soneto das imagens interiores
Mistério das imagens interiores.
Imersas nestes mares de abandono
as sementes de fogo geram flores:
rosas de pó nas lâminas do outono.
Transfigurada, a fria luz de sono
vela de cinza a face dos pastores,
e os súditos do tempo, e os reis sem trono,
sob o mudo legado de outras dores.
Na áspera latitude um rio corre
branco de eternidade. As nebulosas
vão-se formando, enquanto o sonho morre.
Há pássaros absortos na obcecada
cisma da solidão; e mãos ansiosas
abrem portas de sombra para o nada.
(poeta pernambucano falecido a 21 de Outubro de 2006)
ADORMECIDO NO VALE
É um vão de verdura onde um riacho canta
A espalhar pelas ervas farrapos de prata
Como se delirasse, e o sol da montanha
Num espumar de raios seu clarão desata.
Jovem soldado, boca aberta, a testa nua,
Banhando a nuca em frescas águas azuis,
Dorme estendido e ali sobre a relva flutua,
Frágil, no leito verde onde chove luz.
Com os pés entre os lírios, sorri mansamente
Como sorri no sono um menino doente.
Embala-o, natureza, aquece-o, ele tem frio.
E já não sente o odor das flores, o macio
Da relva. Adormecido, a mão sobre o peito,
Tem dois furos vermelhos do lado direito.
(poeta francês nascido a 20 de Outubro de 1854)
Tradução: Ferreira Gullar
quarta-feira, outubro 19, 2011
O rio
Uma gota de chuva
A mais, e o ventre grávido
Estremeceu, da terra.
Através de antigos
Sedimentos, rochas
Ignoradas, ouro
Carvão, ferro e mármore
Um fio cristalino
Distante milênios
Partiu fragilmente
Sequioso de espaço
Em busca de luz.
Um rio nasceu.
(Vinícius de Moraes nasceu a 19 de Outubro de 1913)
terça-feira, outubro 18, 2011
Desilusão
Quando vi hoje em alguma da nossa imprensa que a japonesa Toto tinha inventado esta moto de 3 rodas, capaz de atingir 50 milhas por hora e movida a fezes, pensei que tínhamos resolvido o problema do défice já que, atendendo à merda que por aí anda, passávamos num ápice a exportadores de combustível. Além disso, ainda podíamos fabricar roupa adequada para que todo o mundo fosse “cagando e andando”, pois o assento da moto é mesmo uma sanita.
Afinal, não passou da tradicional incompetência do jornalismo que nos desinforma, pois o sítio da empresa esclarece que não senhor, a mota anda a biodísel fabricado a partir de desperdícios sólidos e líquidos domésticos, mas o assento sanita é tão só uma chamada de atenção para as suas preocupações ambientais.
Ora bolas!
Autofagia
Minhas
lágrimas à noite,
se escondem nos bares,
onde derramo dores
que escorrem lúpulo
Os meus
sonhos de dia,
eu guardo em retalhos
que embrulham lágrimas
de vários tamanhos
Os meus
anseios acoplam,
consuetudinários,
nos meus escaninhos,
buscando fórmulas de envelhecer
E ainda
agora, a minha aura
esqueceu a hora de avisar
meus sonhos, que se foram
embora sem pedir licença.
José Telles
(poeta cearense)
A Verdade
A verdade é semelhante a uma adolescente
vibrante, flexível, em radiosa sombra.
Quando fala é a noite translúcida no mar
e a esfera germinal e os anéis da água.
Um apelo suave obstinado se adivinha.
Ela dorme tão perfeitamente despertada
que em si a verdade é o vazio. Ela aspira
à cegueira, ao eclipse, à travessia
dos espelhos até ao último astro. Ela sabe
que o muro está em si. Ela é a sede
e o sopro, a falha e a sombra fascinante.
Ela funda uma arquitectura volante
em suspensas superfícies ondulantes.
Ela é a que solicita e separa, delimita
e dissemina as sílabas solidárias.
(poeta farense nascido a 17 de Outubro de 1924)
domingo, outubro 16, 2011
As mãos
Com mãos se faz a paz se faz a guerra.
Com mãos tudo se faz e se desfaz.
Com mãos se faz o poema – e são de terra.
Com mãos se faz a guerra – e são a paz.
Com mãos se rasga o mar. Com mãos se lavra.
Não são de pedras estas casas mas
de mãos. E estão no fruto e na palavra
as mãos que são o canto e são as armas.
E cravam-se no Tempo como farpas
as mãos que vês nas coisas transformadas.
Folhas que vão no vento: verdes harpas.
De mãos é cada flor cada cidade.
Ninguém pode vencer estas espadas:
nas tuas mãos começa a liberdade.
(Adriano Correia de Oliveira faleceu a 16 de Outubro de 1982)
Ansiedade
Quero compor um poema
onde fremente
cante a vida
das florestas das águas e dos ventos.
Que o meu canto seja
no meio do temporal
uma chicotada de vento
que estremeça as estrelas
desfaça mitos
e rasgue nevoeiros - escancarando sóis!
(escritor alentejano nascido há 100 anos, em 15 de Outubro de 1911)
sexta-feira, outubro 14, 2011
quinta-feira, outubro 13, 2011
Paul Simon faz hoje 70 anos. Como se vê num momento de grande comoção, está bem e recomenda-se.
(Foram 70 aninhos e não 50, como bem fez notar o Salvo:)) )
quarta-feira, outubro 12, 2011
Linha de rumo
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Encontro-me parado...
Olho em redor e vejo inacabado
O meu mundo melhor.
Tanto tempo perdido...
Com que saudade o lembro e o bendigo:
Campos de flores
E silvas...
Fonte da vida fui. Medito. Ordeno.
Penso o futuro a haver.
E sigo deslumbrado o pensamento
Que se descobre.
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Desterrado.
Desterrado prossigo.
E sonho-me sem Pátria e sem Amigos,
Adrede.
(Ruy Cinatti faleceu há 25 anos, a 12 de Outubro de 1986)
terça-feira, outubro 11, 2011
De Tudo Ficaram Três Coisas
De tudo ficaram três coisas:
A certeza de que estamos começando,
A certeza de que é preciso continuar e
A certeza de que podemos ser interrompidos antes de terminar
Fazer da interrupção um caminho novo,
Fazer da queda um passo de dança,
Do medo uma escola,
Do sonho uma ponte,
Da procura um encontro,
E assim terá valido a pena existir!
(escritor mineiro falecido a 11 de Outubro de 1994)
domingo, outubro 09, 2011
sábado, outubro 08, 2011
Mar Morto
A noite caiu sobre o cais, sobre o mar, sobre mim...
As ondas fracas, contra o molhe, são vozes calmas de afogados.
O luar marca uma estrada clara e macia nas águas,
mas os barcos que saem podem procurar mais noite,
e com as suas luzes vão pôr mais estrelas além ...
O vento foi para outros cais levar o medo,
e as mulheres, que vêm dizer adeus e cantar,
hoje sabem canções com mais esperança,
canções mais fortes que a ressaca,
canções sem pausas onde passe uma sombra da morte...
Velhos marítimos - a terra é já a sua terra -
olham o mar mais distante e têm maior saudade...
Pára o rumor duns remos...
Não vão mais às estrelas as canções com noite, amor e morte...
Penso em todos os que foram e andam no mar,
em todos os que ficam e andam no mar também ...
E a luz do farol, lá longe, diz talvez...
(poeta portuense falecido a 8 de Outubro de 1992)
sexta-feira, outubro 07, 2011
Prelúdio
Levanta-se da rocha a flor esmagada
Mais dura do que a rocha e cristalina.
Raízes, caule, pétalas, angústia.
Raízes para sempre ali cravadas,
Caule verticalmente inexorável,
Pétalas miraculosas: pura água.
Minhas mãos são chagas,
Para te colher…
Minhas mãos são chamas,
Pedaços de gelo…
Levanta-se da rocha a flor esmagada.
(poeta lisboeta nascido a 7 de Outubro de 1933)
quinta-feira, outubro 06, 2011
quarta-feira, outubro 05, 2011
terça-feira, outubro 04, 2011
DENTRO DO COPO
Dentro deste copo se esconde
um gosto amargo que me atiça.
Deita em suas bordas uma lua que não brilha
fadas e bichos de meus sonhos tortos.
Minha melancolia está guardada no copo
e um sorriso que me disfarça sem graça.
Bóia no líquido do copo um rio me afunda
e defuntos que me abraçam com flores de enterro.
Cabe na solidão do copo
a lembrança o medo e o desejo.
Reside na água triste deste copo que me absolve
um relógio que devora o tempo.
Ele dispara e arrasta a vida para o fundo do copo.
José Romildo Alves Feitosa
(poeta brasileiro)
segunda-feira, outubro 03, 2011
Balada dos suplícios
- «Pudesse eu recomeçar
e este caminho seguia...»
Uma voz fala das grades
sobre a futura alegria.
Na sua cela, dois homens
por essa noite comprida,
murmuravam-lhe: «Confessa.
Ou estás cansado da vida?
Podes viver como nós,
viver, viver anos vastos...
Uma só palavra, és livre...
e podes viver de rastos...»
- «Pudesse eu recomeçar
e este caminho seguia...»
A voz que sobe das grades
canta a futura alegria.
«Apenas uma palavra,
abre-se a porta e tu sais:
já o carrasco se some,
já acabaram teus ais!
Apenas uma mentira
para mudares o destino...
sonha, sonha, sonha
o claro sol matutino!»
«Disse o que tinha a dizer
como o Rei Henrique falo:
uma missa por Paris...
p'lo meu reino, um cavalo...
Nada a fazer.» E partiram!
Cobre-o já seu sangue quente!
Era o seu único triunfo:
saber morrer inocente!
Pudesse ele recomeçar
ia esta sorte escolher?
Diz a voz que vem das grades:
- «Torná-lo-ia a fazer.
Eu morro e tu, França, ficas,
meu refúgio e minha fé.
Ó meus amigos, se morro,
vós sabeis pelo que é!»
Vieram para o prender,
falavam em alemão.
Disse-lhe um: - «Queres-te render?»
Respondeu com decisão:
- «Pudesse eu recomeçar
queria esta sorte seguir...»
A voz que sobe das grades
fala aos homens do porvir.
- «Pudesse eu recomeçar
queria esta sorte seguir.
Mesmo carregado de ferros,
que cante em mim o porvir!»
E cantava sob as balas:
«... sangrento se levantou...»
Até que nova rajada
veio por fim e o tombou.
Mas outra canção francesa
já dos seus lábios se evade
acabando a Marselhesa
para toda a Humanidade!
Louis Aragon (Paris, 1897-1982)
(Louis Aragon nasceu a 3 de Outubro de 1897)
Tradução: Carlos de Oliveira
domingo, outubro 02, 2011
sábado, outubro 01, 2011
Dias
Há dias. Existem dias. Contam-se dias.
E os dias passam.
As horas levam os minutos abraçados ao passado.
E os dias não são mais que horas; horas que nos roubam a vida no presente.
Um presente que se torna passado.
Mas existem sempre novos dias. Dia após dia.
E sabe bem esperar um novo dia acreditando no sol e na alegria.
Dia-a-dia há felicidade a transbordar até ao clarear do céu.
Mafalda Chambel
(poetisa lisboeta nascida a 1 de Outubro de 1987)