How many times must a man look up, Before he can see the sky? How many ears must one man have, Before he can hear people cry? The answer, my friend, is blowin' in the wind. The answer is blowin' in the wind.
sábado, abril 07, 2007
O desafio amazônico
O tema da Campanha da Fraternidade da Igreja Católica do Brasil desta Quaresma, é sobre a Amazônia. Milhões de fiéis, durante as quatro semanas, irão refletir sobre sua importância para nós e para o futuro da Terra.
A Amazônia abriga o maior patrimônio hídrico e genético do Planeta. De um de nossos melhores estudiosos, Eneas Salati, sabemos:"Em poucos hectares da floresta amazônica existe um número de espécies de plantas e de insetos maior que em toda a flora e fauna da Europa". Mas esta floresta luxuriante é extremamente frágil, pois se ergue sobre um dos solos mais pobres e lixiviados da Terra. Se não controlarmos o desmatamento, em dezenas de anos a Amazônia pode se transformar numa imensa savana.
Ela não é terra virgem e intocável. Em milhares de anos, dezenas de povos indígenas que ali viveram e vivem, atuaram como verdadeiros ecologistas. Grande parte de toda floresta amazônica, especialmente de várzea, foi manejada pelos índios, promovendo "ilhas de recursos", criando condições favoráveis para o desenvolvimento de espécies vegetais úteis como o babaçu, a palmeira, o bambu, os bosques de castanheiras e frutas de toda espécie, plantadas ou cuidadas para si e para aqueles que, por ventura, por lá passassem. As famosas "terras pretas de índios" remetem para esse manejo.
A idéia de que o índio é genuinamente natural, representa uma ecologização errônea dele, fruto do imaginário urbano, fatigado pela artificialização da vida. Ele é um ser cultural. Como atesta o antropólogo Viveiros de Castro:"A Amazônia que vemos hoje é a que resultou de séculos de intervenção social, assim como as sociedades que ali vivem são resultado de séculos de convivência com a Amazônia". O mesmo diz em seu instrutivo livro E. E. Moraes, "Quando o Amazonas corria para o Pacífico" (Vozes 2007): "Resta pouca natureza intocada e não alterada pelos humanos na Amazônia". Por 1.100 anos os tupi-guarani dominaram vastíssimo território que ia dos contrafortes andinos do rio Amazonas até às bacias do Paraguai e do Paraná.
Índio e floresta, portanto, se condicionam mutuamente. As relações não são naturais mas culturais, numa teia intrincada de reciprocidades. Eles sentem e vêem a natureza como parte de sua sociedade e cultura, como prolongamento de seu corpo pessoal e social. Para eles a natureza é um sujeito vivo e carregado de intencionalidades. Não é como para nós modernos, algo objetal, mudo e sem espírito. A natureza fala e o indígena entende sua voz e mensagem. Por isso ele está sempre auscultando a natureza e se adequando a ela num jogo complexo de inter-retro-relações. Encontraram um sutil equilíbrio sócio-cósmico e uma integração dinâmica, embora houvesse também guerras e verdadeiros extermínios como aqueles dos sambaquieiros e de outras tribos.
Mas há sábias lições que precisamos aprender deles face às atuais ameaças ambientais. Importa entender a Terra, não como algo inerte, com recursos ilimitados, disponíveis ao nosso bel prazer. Mas como algo vivo, a Mãe do índio a ser respeitada em sua integridade. Se uma árvore é derrubada, faz-se um rito de desculpa para resgatar a aliança de amizade. Precisamos de uma relação sinfônica com a comunidade de vida, pois como foi comprovado, Gaia já ultrapassou seu limite de suportabilidade. Se deixarmos as coisas correrem e não fizermos nada as ameaças se tornarão devastadora realidade.
Leonardo Boff
Publicado no site do autor em 23/02/2007 e aqui afixado com sua autorização
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