How many times must a man look up, Before he can see the sky? How many ears must one man have, Before he can hear people cry? The answer, my friend, is blowin' in the wind. The answer is blowin' in the wind.
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quarta-feira, abril 30, 2014
Descendo o
meu bairro
Eu vou
trazer para o palco da vida
pedaços da
minha gente,
a fluência
quente da minha terra dos trópicos
batida pela
nortada do vendaval de abril.
Eu vou
descer à Chácara
Subir depois
pelos coqueiros do pântano
ao coração
do Riboque,
onde o Zé
Tintche, tange sua viola
neste findar
dum dia de cais
com gentes
de longe
na Ponte
Velhinha
num dia de
passageiros(...)
(poetisa
são-tomense nascida faz hoje 88 anos)
terça-feira, abril 29, 2014
Princípios
Podíamos
saber um pouco mais
da morte.
Mas não seria isso que nos faria
ter vontade
de morrer mais
depressa.
Podíamos
saber um pouco mais
da vida.
Talvez não precisássemos de viver
tanto,
quando só o que é preciso é saber
que temos de
viver.
Podíamos
saber um pouco mais
do amor. Mas
não seria isso que nos faria deixar
de amar ao
saber exactamente o que é o amor, ou
amar mais
ainda ao descobrir que, mesmo assim, nada
sabemos do
amor.
(Nuno Júdice
faz hoje 65 anos)
segunda-feira, abril 28, 2014
O retrato
nas paredes
As casas
como as pessoas
guardam
cicatrizes
expostas no
rosto do tempo.
Às casas
sempre voltamos
nelas a vida
anda por trás do que passou
existem na
existência indo embora.
As casas
onde morei para viver
na afoitosa
e lúdica adolescência
abrem rugas
na face branca das paredes.
De dentro
delas saltam sonhos
que não
querem envelhecer
e o menino
açoitando o vento nas curvas do rio
que se
arrasta na carne azul da paixão.
(poeta
cearense falecido faz hoje 2 anos)
domingo, abril 27, 2014
sábado, abril 26, 2014
TROTTOIR
Os homens
vão e vêm na íris das putas
E nenhum
pára.
Nenhum ouve
suas vozes dissolutas
Nem as
encara.
São inúteis
as frases mais argutas
Ou sobre a
cara
A tinta, o
pó. E a vida, quantas lutas,
Como está
cara!
Ao longe os
filhos, os filhos das putas
Com ladrões,
ou pinguços, ou recrutas,
Na noite
avara
Dormem
cingindo palhaços birutas,
Bonecas
louras relesmente hirsutas
Que a lua
aclara.
(poeta
carioca que hoje faz 51 anos)
sexta-feira, abril 25, 2014
E
agora, povo português?
Nunca
pensei viver para ver isto:
a
liberdade - (e as promessas de liberdade)
restauradas.
Não, na verdade, eu não pensava
-
no negro desespero sem esperança viva -
que
isto acontecesse realmente. Aconteceu.
E
agora, meu general?
Tantos
morreram de opressão ou de amargura,
tantos
se exilaram ou foram exilados,
tantos
viveram um dia-a-dia cínico e magoado,
tantos
se calaram, tantos deixaram de escrever,
tantos
desaprenderam que a liberdade existe -
E
agora, povo português?
Essas
promessas - há que fazer depressa
que
o povo as entenda, creia mais em si mesmo
do
que nelas, porque elas só nele se realizam
e
por ele. Há que, por todos os meios,
abrir
as portas e as janelas cerradas quase cinquenta anos -
E
agora, meu general?
E
tu povo, em nome de quem sempre se falou,
ouvir-se-á
a tua voz firme por sobre os clamores
com
que saúdas as promessas de liberdade ?
Tomarás
nas tuas mãos, com serenidade e coragem,
aquilo
que, numa hora única, te prometem ?
E
agora, povo português?
Jorge de Sena
quinta-feira, abril 24, 2014
Zelos
De leve,
beijo as suas mãos pequenas,
alvas, de
neve, e, logo, um doce, um breve,
fino rubor
lhe tinge a face, apenas
de leve
beijo as suas mãos de neve.
Ela vive
entre lírios e açucenas,
e o vento a
beija, e, como o vento, deve
ser o meu
beijo em suas mãos serenas,
- Tão leve o
beijo, como o vento é leve.. .
Que essa
divina flor, que é tão suave,
ama o que é
leve, como um leve adejo
de vento ou
como um garganteio de ave,
e já me
basta, para meu tormento,
saber que o
vento a beija, e que o meu beijo
nunca será
tão leve como o vento.. .
(poeta
gaúcho nascido a 24 de Abril de 1870)
quarta-feira, abril 23, 2014
Braços de
Seda
Ontem,
quando a
morte passou
carregando
meu corpo,
não sei se
para o céu,
ou qualquer
outro porto,
onde
houvesse lugar
para um
filho de Ogum,
eu vi que
havia luz e madrugada
e um solo de
canção desesperada,
nos olhos da
mulher que não me amou.
Ontem,
quando a
morte passou,
lá no bar
onde bebo,
e como linda
Inês,
posta em
sossego,
em seus
braços de seda me tomou,
senti que a
vida inteira me fluía
e que a
triste canção que eu perseguia
jazia na
mulher que não me amou.
(poeta
paraense falecido faz hoje 24 anos)
terça-feira, abril 22, 2014
Quissange -
Saudade Negra
Não sei, por
estas noites tropicais,
o que me
encanta...
Se é o luar
que canta
ou a
floresta aos ais.
Não sei, não
sei, aqui neste sertão
de música
dolorosa
qual é a voz
que chora
e chega ao
coração...
Qual o som
que aflora
dos lábios
da noite misteriosa!
Sei apenas,
e isso é que importa,
que a tua
voz, dolente e quase morta,
já mal a
escuto, por andar ausente,
já mal
escuto a tua voz dolente...
Dolente, a
tua voz "luena",
lá do
distante Moxico,
que disponho
e crucifico
nesta
amargura morena...
Que é o
destino selvagem
duma canção
em que tange,
por entre a
floresta virgem
o meu
saudoso "Quissange".
Quissange,
fatalidade
deste meu
triste destino...
Quissange,
negra saudade
do teu olhar
diamantino.
Quissange,
lira gentia,
cantando o
sol e o luar,
e chorando a
nostalgia
do sertão,
por sobre o mar.
Indo mares
fora, mares bravos,
em noite
primaveril
acompanhando
os escravos
que morreram
no Brasil.
Não sei, não
sei,
neste verão
infinito,
a razão de
tanto grito...
- Se és tu, oh
morte, morrei!
Mas deixa a
vida que tange,
exaltando as
amarguras,
e as mais
tristes desventuras
do meu amado
Quissange!
(poeta
constanciense nascido a 22 de Abril de 1900)
segunda-feira, abril 21, 2014
Bombas...
Bombas limpas, disseram? E tu sorris
E eu também. E já nos vemos mortos
Um verniz sobre o corpo, limpos, estáticos,
Mais mortos do que limpos, exato
Nosso corpo de vidro, rígido
À mercê dos teus atos, homem político.
Bombas limpas sobre a carne antiga.
Vitral esplendente e agudo sobre a tarde.
E nós na tarde repensamos mudos
A limpeza fatal sobre nossas cabeças
E tua sábia eloqüência, homens-hienas
Dirigentes do mundo.
(poetisa paulista nascida faz hoje 84 anos)
domingo, abril 20, 2014
Arte Poética
Escrever um
poema
é como
apanhar um peixe
com as mãos
nunca
pesquei assim um peixe
mas posso
falar assim
sei que nem
tudo o que vem às mãos
é peixe
o peixe
debate-se
tenta
escapar-se
escapa-se
eu persisto
luto corpo a
corpo
com o peixe
ou morremos
os dois
ou nos
salvamos os dois
tenho de
estar atenta
tenho medo
de não chegar ao fim
é uma
questão de vida ou de morte
quando chego
ao fim
descubro que
precisei de apanhar o peixe
para me
livrar do peixe
livro-me do
peixe com o alívio
que não sei
dizer
(Adília
Lopes faz hoje 54 anos)
Imaginação
A imaginação
é magia e é arte
que nos faz
inventar, sonhar e viajar.
Com
imaginação podemos ir a Marte
ou ao centro
da Terra, ou ao fundo do mar.
Com
imaginação nunca estamos sozinhos.
A imaginação
é um voo, um lugar
onde temos
amigos, onde há outros caminhos
nos quais,
sem te mexeres, podes ir passear.
Inventa uma
cantiga, um poema, um desenho
um
arco-íris, um rio por entre malmequeres;
esse lugar é
teu, sem limite ou tamanho.
A esse teu
lugar, só vai quem tu quiseres.
(Rosa Lobato
de faria nasceu faz hoje 82 anos)
sábado, abril 19, 2014
Momento num
Café
Quando o
enterro passou
Os homens
que se achavam no café
Tiraram o
chapéu maquinalmente
Saudavam o
morto distraídos
Estavam
todos voltados para a vida
Absortos na
vida.
Um no
entanto se descobriu num gesto longo e demorado
Olhando o
esquife longamente
Este sabia
que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade
Que a vida é
traição
E saudava a
matéria que passava
Liberta para
sempre da alma extinta.
(poeta
pernambucano nascido a 19 de Abril de 1886)
sexta-feira, abril 18, 2014
Elegia
Entrou na
sala e ficou em pé tocando piano,
Sua mão
pequena batia no teclado
duramente.
Lembro que
estava de vermelho
Lembro que
tinha nas tranças finas uma fita preta
Lembro que
era de tarde
E entrava
pelas janelas abertas o vento do
mar.
Não lembro
se tinha flores perto dela
Mas nascia
um perfume do seu corpo.
Que amor o
meu!
(poeta
carioca nascido faz hoje 108 anos)
quinta-feira, abril 17, 2014
Primeiro as
Últimas Coisas
Soluções
para problemas
são fáceis
de encontrar:
o problema é
uma boa
contribuição.
O que
realmente é uma arte
é torcer a
mente
e obter um
problema que encaixe
numa
solução.
(cientista e
poeta dinamarquês falecido faz hoje 18 anos)
(tradução de
Natália Bebiano e F. J. Craveiro de Carvalho)
quarta-feira, abril 16, 2014
Não tenho
pressa
Não tenho
pressa. Pressa de quê?
Não têm
pressa o sol e a lua: estão certos.
Ter pressa é
crer que a gente passa adiante das pernas,
Ou que,
dando um pulo, salta por cima da sombra.
Não; não
tenho pressa.
Se estendo o
braço, chego exactamente onde o meu braço chega -
Nem um
centímetro mais longe.
Toco só onde
toco, não onde penso.
Só me posso
sentar onde estou.
E isto faz
rir como todas as verdades absolutamente verdadeiras,
Mas o que
faz rir a valer é que nós pensamos sempre noutra cousa,
E somos
vadios do nosso corpo.
(Alberto
Caeiro “nasceu” em Lisboa faz hoje 125 anos)
terça-feira, abril 15, 2014
Clandestinidade
Secreto me
acho
e secreto me
sentes
quando
secreto me
julgas,
Impuro me
reconheço
quando
o nosso
silêncio
são vozes
turbas.
Dúbio é o
desejo
quando
não é
transparente
a água em
que se deita
precavidamente.
Clandestinos
somos
quando
o que somos
teme a face
que pesquisa.
Os olhos são
claros
quando
a superfície
do espelho
é lisa.
(Fernando
Namora nasceu faz hoje 95 anos)
segunda-feira, abril 14, 2014
LUZ INTERIOR
Não de luz,
mas de sombra são meus versos,
humildes
desajustados,
como quem
vem de longe e se arreceia
de
inesperado encontro.
A sombra é
luz filtrada esmaecida
homóloga à
vida interior reflexa
manso fluir
de águas profundas
numa réstea
de musgo e pedras brancas.
Não é à
plena luz do sol a pino
mas quando
ele se quebra no horizonte
que o
espírito perplexo se inclina
e vê na
sombra o que a luz lhe esconde.
(escritor
paulista falecido faz hoje 8 anos)
domingo, abril 13, 2014
O fragmento
"Veio a
luz do oriente", cantava ele,
"radiosa
garantia de Deus, e as ondas aquietaram-se.
Eu podia ver
línguas de terra e rochedos acossados.
Muitas
vezes, pela coragem mostrada, o fado poupa o homem
se não o
marcou já."
E quando a
objecção deles lhe foi dita -
em especial
que a sua obra se fizera em fragmentos,
que já não
podiam dizer onde estavam com ele,
que já não
distinguiam primeira linha ou última linha -
respondeu
com uma questão.
"Desde
quando", perguntou,
a primeira e
a última linha de qualquer poema
são onde o
poema principia e termina?"
(poeta
irlandês nascido faz hoje 75 anos – Nobel 1995)
tradução
deVasco Graça Moura
sábado, abril 12, 2014
Contratados
À hora de
sol-posto
as rolas
traçam
desenhos de
feitiços sinuosos
caminhos sob
a calma das mulembas
e abraços de
segredos e silêncios.
... longe...
muito longe
um risco
brando
acorda os
ecos dos quissanges
vermelho
como o fogo das queimadas
com imagens
de mucuisses e luar.
Canções que
os velhos cantam
Murmurando.
... e nos
homens cansados de lembrar
a distância
vai calando mágoas
renasce em
cada braço
a força de
um secreto entendimento.
(poeta
angolano nascido faz hoje faz 78 anos)