How many times must a man look up, Before he can see the sky? How many ears must one man have, Before he can hear people cry? The answer, my friend, is blowin' in the wind. The answer is blowin' in the wind.
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quinta-feira, fevereiro 01, 2007
Desmistificar fantasias – IV
Quando começam os seres humanos a ser pessoas?
“Os seres humanos começam a ser pessoas quando começam a ter o sentido do eu e a responder a padrões de racionalidade. Os requisitos para ser pessoa são adquiridos gradualmente e estão relacionados com a capacidade de atribuir estados mentais de uma certa complexidade a si próprio e a outros. É muito difícil apontar para uma idade na qual estas capacidades se manifestam.
As crianças parecem adquirir consciência completa do eu algures durante o seu segundo ano de vida (Lewis e Brooks-Gunn, 1979; Kagan, 1981). As crianças abaixo dos 2 anos de idade são, naturalmente, conscientes, mas falta-lhes a consciência completa de si próprias enquanto distintas dos outros. Perto do fim do segundo ano começam a usar pronomes pessoais, a reconhecerem-se a si próprias ao espelho e a exibir emoções autoconscientes, como a vergonha (Zelazo, 2004). Além disso, descobriu-se que as crianças abaixo dos 3 anos falham a tarefa da "falsa crença" (Wimmer e Perner, 1983). O significado dos resultados experimentais é controverso, mas uma interpretação é que as crianças não são capazes de distinguir a sua própria perspectiva enquanto observadoras de uma história da perspectiva de uma das personagens ficcionais na história. Têm sido concebidas variantes desta experiência para testar a capacidade em animais não humanos de atribuírem estados mentais a outros.
Embora não exista um teste definitivo para as capacidades envolvidas na autoconsciência, estes estudos empíricos excluem que os embriões e fetos humanos sejam pessoas. Visto que não satisfazem os requisitos para serem pessoas (racionalidade e auto-consciência), não se qualificam como pessoas e, na nossa perspectiva, não têm interesse na continuação da sua própria existência. Na bibliografia existe um apelo frequente à ideia de que os embriões e fetos humanos são pessoas potenciais. O argumento tem a seguinte estrutura geral: se os embriões se desenvolverem normalmente e sem interferência, é provável que adquiram no futuro as capacidade que caracterizam as pessoas. Portanto, devemos tratar os embriões como tratamos as pessoas. Vamos aqui avaliar sucintamente os argumentos da potencialidade. Primeiro, vamos analisar o conceito de "potencial" e, em seguida, ponderar as consequências que os argumentos da potencialidade têm para a investigação em células estaminais.
Há um conceito fraco de potencialidade, de acordo com o qual A é um B potencial se A é um elemento causal na produção de B. Este conceito de potencialidade é muitíssimo grosseiro por duas razões principais. Em primeiro lugar, não sugere até onde devemos recuar na atribuição da pessoa potencial. Se o que interessa é o fim do processo (B) e o seu estatuto como pessoa, então todos os agentes causais envolvidos no processo têm igual direito a serem pessoas potenciais, mesmo os espermatozóides. Em segundo lugar, do conceito fraco de potencialidade seguir-se-ia que uma célula somática humana é uma pessoa potencial, já que uma pessoa pode ser obtida a partir dela através de clonagem. É implausível argumentar a favor de uma tal proliferação de obrigações morais directas com base na pessoa potencial (Harris, 1985; Sandel, 2004).
Estas objecções instigaram um conceito de pessoa mais rigoroso (Hursthouse, 1987). De acordo com este conceito mais recente, A é um B potencial se i) A produzirá B se A se desenvolver normalmente; e ii) o B assim produzido será tal que outrora foi A. Embora esta seja uma formulação melhor do que a anterior, há ainda alguns problemas sérios. O que quer dizer ser produzido ou desenvolver-se "normalmente" ou "naturalmente"? A clonagem é um processo natural em alguns aspectos, visto que ocorre na natureza sem intervenção humana na criação de gémeos monozigóticos. Stone (1987) apresenta uma definição de desenvolvimento normal. A desenvolve-se normalmente se originariamente segue até ao fim a via de desenvolvimento que é determinada pela sua natureza e que conduz a B, um membro da sua espécie na idade adulta. Abstraindo-nos da evidente circularidade desta definição, o que nos surpreende é a segunda condição que parece sugerir que existe uma continuidade de identidade entre A e B ou que A e B são o mesmo indivíduo em diferentes fases. Se é este o caso, então os embriões humanos na sua fase inicial, aproximadamente até aos 14 dias, perdem o seu direito de serem pessoas potenciais, visto que se podem formar gémeos e os embriões podem dar origem não a uma mas a duas ou mais pessoas.
A conclusão dos argumentos da potencialidade é que é errado impedir o desenvolvimento de um embrião porque o embrião tem o potencial de se tornar uma pessoa. Isto apoia-se na assumpção de que devemos tratar uma pessoa potencial da mesma forma que tratamos uma pessoa. Mas nós temos obrigações morais directas em relação às pessoas em virtude dos seus interesses no seu próprio bem-estar. Será justificado conferir o mesmo estatuto moral aos embriões na sua fase inicial que não têm interesse no seu próprio bem-estar? A pessoa potencial não tem interesse em crescer, dado o conceito de interesse que foi examinado no princípio deste ensaio. Isto é também conhecido como o problema lógico dos argumentos da potencialidade. Se B tem direitos porque satisfaz um certa condição, não se segue que A tem os mesmos direitos porque pode satisfazer essa condição no futuro. Em resumo, nós somos todos potencialmente cadáveres, mas isso seguramente não significa que tenhamos razões convincentes para nos tratarmos uns aos outros como se já fôssemos cadáveres. Assim, o argumento da potencialidade falha em mostrar que devemos tratar os embriões humanos como pessoas.”
Lisa Bortolotti e John Harris
Vieram-me à cabeça umas quantas analogias em relação a esta potencialidade. A dos cadáveres, é sem sombra de dúvida divinal! Mas há outras: ora portanto, a menstruação ou o simples acto de tomar banho devem ser considerados actos criminosos, porque resultam num descartar de potenciais seres humanos!
ResponderEliminarO numero de células que vai pelo ralo em cada banho é inacreditável! já para não falar em espermatozoides e óvulos!
Enfim, é só de mim, ou quando os argumentos começam a ser rebatidos torna-se tudo um pouco estranho?