nenhum amor
escapa impune
deixa-me
perguntar se te
pareço tão
assustado assim. Não
me sinto
deslocado, talvez curioso, mas
nem
surpreso. algo em ti me puxa
sempre ao
sentimento, mesmo antes de
te conhecer,
lembras-te, uma propensão para
te tratar
bem, cuidar, vulnerabilizar os meus
modos,
recusar admitir que também eu sou
capaz de
crueldades quotidianas e
impunes.
queria conversar contigo
sobre o
nelson, que foi ver as coisas a
arder
fotografando a própria
pele. queria
falar-te da isabel e de como
choramos
juntos, muito maricas, quando
nos correm
mal estes amores ou, pior, a
nossa
amizade. esta noite sonhei contigo e
achei graça
dizer-te que cheirava mal
na nossa
cama. que me incomodou a luz a entrar
pela
persiana por fechar. que ouvi com dor o
orgasmo da
vizinha de baixo
queria que
soubesses que também eu
poderia ter
ardido para o nelson
fotografar.
queria que soubesses que
também
poderia parar de chorar pela
isabel.
queria que soubesses que o faria
exclusivamente
para
arruinar o meu coração, se fosse a
tua vontade
e com isso te deixasse em
paz. faria
qualquer coisa, ainda que
quisesse
morrer a seguir, faria qualquer coisa que,
por um
instante, te pusesse
a pensar em
mim
(valter hugo
mãe faz hoje 45 anos)
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