Tu És em Mim
Profunda Primavera
O sabor da
tua boca e a cor da tua pele,
pele, boca,
fruta minha destes dias velozes,
diz-me,
sempre estiveram contigo
por anos e
viagens e por luas e sóis
e terra e
pranto e chuva e alegria,
ou só agora,
só agora
brotam das
tuas raízes
como a água
que à terra seca traz
germinações
de mim desconhecidas
ou aos
lábios do cântaro esquecido
na água
chega o sabor da terra?
Não sei, não
mo digas, tu não sabes.
Ninguém sabe
estas coisas.
Mas,
aproximando os meus sentidos todos
da luz da
tua pele, desapareces,
fundes-te
como o ácido
aroma dum
fruto
e o calor
dum caminho,
o cheiro do
milho debulhado,
a
madressilva da tarde pura,
os nomes da
terra poeirenta,
o infinito
perfume da pátria:
magnólia e
matagal, sangue e farinha,
galope de
cavalos,
a lua
poeirenta das aldeias,
o pão
recém-nascido:
ai, tudo o
que há na tua pele volta à minha boca,
volta ao meu
coração, volta ao meu corpo,
e volto a
ser contigo a terra que tu és:
tu és em mim
profunda primavera:
volto a
saber em ti como germino.
(Pablo
Neruda nasceu faz hoje 112 anos)
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