SALMO
a João Bigotte Chorão.
Estou morto.
Mas a vida
lambe a
minha pele em labaredas.
Sou noite.
Mas o dia
põe-me nos
lábios papoilas
e coroa-me
de espigas o cabelo.
Ceguei.
Mas a luz
vem
poisar-me sobre as pálpebras
outras
tantas borboletas inquietas.
Não oiço.
Mas o eco do
silêncio
canta o hino
imenso que eu não posso.
Não respiro.
Mas aspiro o
alento
da maresia
no vento.
Não sinto.
Mas
pressinto: a minha alma arde
e uma chaga
floriu na minha carne.
Não choro.
Mas tremem
estrelas cadentes
nas lágrimas
pendentes que sustenho.
Não canto.
Mas sopro
nuvens
no pó que
levanto.
Não ando.
Mas todo o
meu espírito
vadia sem
folga nem descanso.
Não durmo.
Hiberno:
verme esvurmo limo e lama
no fosso em
que me enfurno
aninho e
faço a cama.
Não amo.
Sobre a seta
quebrada no meu peito
raiva uma
fonte de sangue
a incendiar
a sede a incinerar a fome
dos
homens dos bichos das florestas.
Não sonho.
Mas a fé
faz da
esperança e da saudade
sentinelas
do sepulcro
onde vivo
o meu coração jaz
pisado por
cavalos em tumulto.
Estou morto.
Mas o sol
explode
a luz
esplende
em plena
primavera
neste corpo
que me
prende
e me
suspende
absorto.
Fernando Pinto Ribeiro
(poeta egitaniense
nascido a 10 de Janeiro de 1928)
Um poema fortíssimo.
ResponderEliminarAbraço