É sabido que os Estados Unidos não subscreveram o Protocolo de Quioto. Também é sabido que, com apenas cerca de 5% da população mundial, os Estados Unidos são responsáveis por cerca de 25% das emissões de gases com “efeito de estufa”. E, ainda, que a indústria petrolífera domina o poder instalado na Casa Branca.
Não é, pois, de admirar, que pessoas com pouca cultura e nenhum respeito pela humanidade, como George W. Bush e seus apaniguados, sempre tenham tentado negar as evidências do aquecimento global. Mas, já causa alguma consternação que pessoas da craveira intelectual de um Simon Blackburn não tenham aberto os olhos em devido tempo.
Com efeito, em 24 de Julho de 2004 foi publicada na Crítica a tradução integral da “Palestra Voltaire 2001” que aquele insigne filósofo proferiu em 13 de Dezembro de 2001 no King’s College London, no âmbito do evento organizado pela Associação Humanista Britânica. A mim, ia-me “caindo o queixo”, quando li o seguinte parágrafo:
“Casos mais insidiosos de alucinação de massas dependem provavelmente, em primeira análise, das necessidades institucionais das ciências específicas. Assim, por exemplo, o Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudança Climática tem produzido incessantemente gráficos e relatórios dando conta dos efeitos iminentes e catastróficos do aquecimento global. Para os cientistas que fazem parte do Painel, essas teses justificam mais financiamento, sem falar em mais poder institucional, recursos informáticos e viagens de avião em primeira classe para ir a conferências em locais exóticos. A paixão que nos faz receber estes relatórios (como outros acerca de outros desastres ambientais) tão avidamente é, suponho eu, a culpa. Pois de facto apenas existem escassos dados que apoiem a tese do aquecimento global, e muitos e bons dados que apoiam a tese de que não há nenhum ou quase nenhum. Tal como não há dados que comprovem a subida do nível do mar ou o aumento da agressividade climática (os escassos dados a favor disso advêm de medições feitas à superfície do globo e arbitrariamente distribuídas, ao passo que os dados substanciais contra essa ideia são proporcionados por satélites que têm um raio de acção sobre praticamente todo o planeta e por balões meteorológicos).
Não tenho aqui o objectivo de aligeirar a minha mensagem amesquinhando a ciência. Pelo contrário, os dados que referi são o resultado da ciência exercida com esforço, da ciência de alta qualidade e sem mácula. Mas uma declaração pública pode falar em nome de todo o edifício da ciência sem reflectir adequadamente o carácter dessa ciência. É às declarações públicas (...) do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática, que se tem de dar um grande desconto”.
Ainda pensei que poderia ser algum mal entendido, mas o original lá estava disponível na página do autor. Posteriormente, o filósofo afixou na sua página, antes do artigo, um aviso de que este já não retrata a sua perspectiva no que diz respeito ao aquecimento global.
O referido Painel Intergovernamental para as Mudanças Climáticas, organização internacional de cientistas especializados em climatologia, numa inflexível avaliação do futuro do nosso planeta concluiu, no passado dia 2 de Fevereiro, em Paris, que o aquecimento global é “inequívoco” e que a actividade humana é a sua principal causadora tendo, “muito provavelmente”, provocado a maior parte do aumento das temperaturas desde 1950.
Este relatório é a quarta avaliação do Painel desde 1990 sobre as causas e consequências das mudanças climáticas, mas é o primeiro em que o Grupo afirma, com uma certeza quase absoluta – mais de 90 de confiança – que o dióxido de carbono e outros gases com efeito de estufa provenientes da actividade humana têm sido as principais causas do aquecimento no último meio século.
No relatório anterior, de Março de 2001, o Painel, constituído por centenas de cientistas, tinha declarado que o nível de confiança para as suas projecções era “provável”, isto é, entre 66 e 90% (daí a minha surpresa pelas afirmações de Simon Blackburn, produzidas 9 meses depois). Esse nível de confiança passou, agora, a “muito provável”, isto é, entre 90 e 99%.
“Nas nossa vidas diárias todos nós reagimos urgentemente a perigos que têm muito menor probabilidade de afectar o futuro dos nossos filhos do que as mudanças climáticas”, declarou Achim Steiner, director executivo do Programa Ambiental das Nações Unidas que, em conjunto com a Organização Meteorológica Mundial, administra o Painel. E acrescentou que “o dia 2 de Fevereiro será recordado como a data na qual foi afastada a incerteza sobre se os seres humanos tinham algo a ver com as mudanças climáticas neste planeta. As provas estão em cima da mesa”.
Embora pareça que a administração Bush aceita as conclusões, há quem continue a negá-las. O American Enterprise Institute, por exemplo, que, de acordo com a Greenpeace, tem recebido fundos da Exxom Mobil ao longo dos últimos anos, ofereceu 10.000 dólares a cada cientista que conseguisse contraditar as conclusões do Painel. Parece que, para já, ainda ninguém aceitou a oferta.
Fotografia de Owen Humphreys/PA/Guardian
Há-de ser sempre assim, mesmo que a realidade aponte outro caminho, alguém tentará nos convencer de que o seu caminho é o correcto
ResponderEliminarSobre este assunto, está a par dos documentários "The Great Global Warming Swindle" e "The denial machine"?
[links]