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quinta-feira, dezembro 21, 2006

Laicidade e liberdade espiritual Muitos crentes, das mais variadas confissões religiosas, sentem arrepios quando ouvem falar de laicidade. Ainda recordo os ataques de que foi alvo o Dr. Mário Soares, quando, há muitos anos e em circunstâncias que não vêm agora a propósito, se declarou “laico, republicano e socialista”. Não por se declarar “republicano”, o que legitimaria o desagrado dos monárquicos, ou “socialista”, o que poderia justificar o desacordo dos não socialistas. Mas por se afirmar “laico”, num país de longa tradição cristã. Ora a laicidade, como deve ser entendida na sua essência, não se destina a proscrever as religiões, a eliminar o sagrado ou a proibir os locais de culto. Pode ser-se crente e laico, como eu o sou, ou ser ateu e inimigo do laicismo. Com efeito, laicismo e laicidade derivam da palavra grega λαικος, que significa “pertencente ao povo”, “que é do povo” (povo considerado no sentido lato e não apenas no sentido estrito de eleitorado, pois para isso há o vocábulo δέμος). E é para velar pelo bem do povo que serve a laicidade: para manter o religião afastada dos poderes do Estado a fim de que todos os cidadãos possam viver cada um a sua liberdade espiritual em igualdade de direitos e sem discriminações, independentemente do tipo de culto que praticam ou de não praticarem culto algum. Por conseguinte, a laicidade, longe de prejudicar a religiosidade, defende-a das interferências do Estado. Não cabe ao Estado dizer o que é ou não religião, se umas são melhores ou piores do que as outras nem fazer qualquer discriminação dos seus cidadãos por motivos religiosos. Se ser a favor da laicidade significa que:

Um Estado não deve ordenar os membros do clero, como acontece na China;

Os membros do clero não devem ser funcionários do Estado, pagos pelo erário público, como acontece na Alemanha;

As organizações religiosas não devem ter benefícios (fiscais e outros) que são negados a outras pessoas colectivas que se dedicam a actividades similares, como se verifica nos Estados Unidos;

O Estado, ao legislar, não deve ter subjacentes princípios religiosos, como acontece em tantos países do mundo;

A abertura de locais de culto, desde que a expensas dos crentes e em locais adequados à sua edificação, deve ser permitida;

A esfera privada, de que faz parte a liberdade espiritual, não deve ser confundida com o individual, já que aquela inclui a dimensão colectiva das associações religiosas ou filosóficas formadas por pessoas que escolhem a mesma opção espiritual;

O Estado, na sua legitimidade democrática, deve ter mão firme sobre aqueles que utilizam a religião, ou a negação dela, para cometerem atentados contra a liberdade espiritual dos outros ou contra as regras democráticas,

então, todos deveríamos ser a favor da laicidade. Penso, mesmo, que quem defende a democracia só pode considerar-se laico.

8 comentários:

  1. Absolutamente de acordo!

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  2. Sofia e Ricardo:
    Muito obrigado pelos vossos comentários.

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  3. Gostei muito deste texto, Lino!.. Ainda não tinha tomado conhecimento do som do silêncio!... ;)

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  4. Obrigado pela visita, Cinderela!
    Este cantinho só existe desde o dia 1 de Dezembro.

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  5. Então, bons augúrios para 2007! :) Para o blog, o blogger e todos aqueles que ama!

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  6. Olá Lino!

    Que bom foi encontrar este espaço. Este post está muito bom. A falta de uma cultura da laicidade foi o "pecado mortal" da igreja eo longo de quase 17 séculos...
    Com efeito, nao encontro atitude mais laica que a de Jesus de Nazaré!

    Obrigado pela Lucidez.
    SHALOM

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  7. E eu também não, Rui!
    Por isso é que sou um "não alinhado", embora conheça muitos que pensam como eu mas não podem dizê-lo às claras. Já fui ao "derrotar montanhas", que não conhecia, e vou voltar.
    SHALOM

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