quarta-feira, março 31, 2010

Silêncio

Assim como do fundo da música
brota uma nota
que enquanto vibra cresce e se adelgaça
até que noutra música emudece,
brota do fundo do silêncio
outro silêncio, aguda torre, espada,
e sobe e cresce e nos suspende
e enquanto sobe caem
recordações, esperanças,
as pequenas mentiras e as grandes,
e queremos gritar e na garganta
o grito se desvanece:
desembocamos no silêncio
onde os silêncios emudecem.

Octavio Paz, in Liberdade sob Palavra

(Tradução de Luis Pignatelli)
Bom senso

O bom senso é a coisa que, no mundo, está mais bem distribuída: de facto, cada um pensa estar tão bem provido dele, que até mesmo aqueles que são os mais difíceis de contentar em todas as outras coisas não têm de forma nenhuma o costume de desejarem mais do que o que têm.

René Descartes, in Discurso do Método

terça-feira, março 30, 2010

Ninguém me habita

Ninguém me habita. A não ser
o milagre da matéria
que me faz capaz de amor,
e o mistério da memória
que urde o tempo em meus neurônios,
para que eu, vivendo agora,
possa me rever no outrora.
Ninguém me habita. Sozinho
resvalo pelos declives
onde me esperam, me chamam
(meu ser me diz se as atendo)
feiúras que me fascinam,
belezas que me endoidecem.


*poeta brasileiro que hoje completa 84 anos
"Tem pai que é cego"!!!

















Cartoon: Peter Brookes/The Times

segunda-feira, março 29, 2010

Luar

O cego pergunta:
como é o luar? E a jovem
beija-o na fronte.

Luís António Pimentel*

*poeta carioca que hoje completa 98 anos

domingo, março 28, 2010

Bicentenário

Ideias

O homem é mais propenso a contentar-se com as ideias dos outros, do que a reflectir e a raciocinar.


sábado, março 27, 2010

Arte-final

Não basta um grande amor
para fazer poemas.
E o amor dos artistas, não se enganem,
não é mais belo
que o amor da gente.

O grande amante é aquele que silente
se aplica a escrever com o corpo
o que seu corpo deseja e sente.

Uma coisa é a letra,
e outra o ato,

-  quem toma uma por outra
confunde e mente.


*poeta mineiro

sexta-feira, março 26, 2010

A VOZ  E O VENTO

com palavras faço a voz
e o vento
de que viajam e são

insistente desejo a lucilar
sobre a pele morna
de girassóis filtrando
teu rosto
seios
paisagem nua de ventre
com palavras a voz do que faço

estes dias infensos
a pendor de gume

quinta-feira, março 25, 2010

Pornografia dispendiosa



















Enquanto os “magos” de Wall Street  se entregavam aos jogos de azar que conduziram à crise económica mundial, vários empregados da SEC que deveriam estar atentos ao que se passava nas bolsas de Nova Iorque dedicavam-se ao “árduo trabalho” de navegar pelos mais variados sítios pornográficos a partir de computadores do Governo. Grandes reguladores!

quarta-feira, março 24, 2010

Arco-Íris

Choveu tanto esta tarde
Que as árvores estão pingando de contentes.
As crianças pobres, em grande alarde,
Molham os pés nas poças reluzentes.

A alegria da luz ainda não veio toda.
Mas há raios de sol brincando nos rosais.
As crianças cantam fazendo roda,
Fazendo roda como os tangarás:

"Chuva com sol!
Casa a raposa com o rouxinol."

De repente, no céu desfraldado em bandeira,
Quase ao alcance da nossa mão,
O Arco-da-Velha abre na tarde brasileira
A cauda em sete cores, de pavão.

Bidenismo


Palavras do vice-presidente Joe Biden para Barack Obama, com o microfone aberto, depois de fazer a apresentação do Presidente no início da cerimónia da assinatura da nova Lei dos Cuidados de Saúde. Frase que não é tão invulgar como isso na boca de vice-presidentes dos Estados Unidos.

Se aquele “porreiro, pá” de Sócrates para Barroso deu tanta polémica, imagino o que teria acontecido com um “grande f***, meu!. Foi um acordo do ca***** ”.

terça-feira, março 23, 2010

Catacumbas

Somos argila, noite
onde os dedos se afundam,
hemorragia de espantoso silêncio
nas galerias do corpo.

O resto,
o resto é pura perda
e transitória insônia.

Hélio Pellegrino

segunda-feira, março 22, 2010

Editor de jornal

Um editor de jornal é alguém que separa o joio do trigo - e publica o joio. 

domingo, março 21, 2010

Abstração

busco palavras
no escaninho 
da memória

e o poema 
dorme ao lado 
numa pose 
transitória

sábado, março 20, 2010

Responsabilidade

É fácil se livrar das responsabilidades. Difícil é escapar das consequências por ter se livrado delas.

Desmandamento

eu tardo
mas falho

ou não falho
ao tardar
em falhar

sexta-feira, março 19, 2010

Freiras rebeldes

Num claro desafio  aos bispos do país, que se opõem  à reforma do sistema de saúde alegando que o dinheiro dos contribuintes estado-unidenses iria financiar abortos, o que é redondamente falso, cerca de 60 freiras líderes de ordens religiosas que representam 59.000 freiras católicas enviaram, na passada quarta-feira, uma carta aos congressistas instando-os  a aprovar a proposta de lei do Senado.


Independentemente da maior ou menor bondade da proposta de lei em causa que, apesar de tudo, irá cobrir mais 32 milhões de pessoas, a carta é uma “pedrada no charco” num país em que a maioria das pessoas religiosas são altamente conservadoras e retrógradas. 

quinta-feira, março 18, 2010

Morrer de sede

Estrangeiro que fui no meu país,
saltei fronteiras a tentar a sorte.
Estrangeiro que sou, perdi o norte,
corri o mundo, não deitei raiz.
É meu rasgado e velho passaporte
a sede antiga, esta cicatriz
queimadura que diz e contradiz
a pátria calcinada até à morte.
Mas torno sempre ao lar: fornalha, frágua,
cinzas e pedras sob cada ponte.
Orvalho, quando o há, é só de mágoa.
E quando exijo ao verde que desponte
e vem Abril abrir-se em olhos d'água,
vou eu morrer de sede ao pé da fonte.

quarta-feira, março 17, 2010

Poesia atrasada

Em 14 de março algumas pessoas comemoraram o Dia Nacional da Poesia. Para mim, dia de jejum e abstinência. Não festejei com um verso sequer, com uma rima sequer. Fiz o mais silencioso silêncio, dediquei minhas melhores horas a estudar a nova ortografia, fingi que não sabia de nada.  

A poesia é um atraso. Poetas sofrem demais. Amam demais. Vêem demais. E depois ficam sonhando com empregos públicos, ou com a possibilidade de darem aulas em faculdade, ou, pior, com a justa remuneração por suas metáforas e aliterações.  

Eu já quis ser poeta. Era um adolescente. Passou. Virei a página sem derramar uma lágrima. Esqueci. Abandonei essa veleidade. Por certo tempo um desejo envergonhado ainda permaneceu guardado por aqui, nas entranhas. Desapareceu definitivamente quando comecei a pagar contas de luz, telefone, aluguel, seguro de vida, faturas e outras loucuras.  

Não convém atrasar o pagamento das contas. As multas, as cartas ameaçadoras, os telefonemas constrangedores recomendam o esforço da pontualidade. Poesia eu posso atrasar à vontade. Nenhuma daquelas antigas musas virá correndo, apavorada, lembrando que chegou o dia. A poesia, por definição, está vencida. Ninguém será punido se não pagar o tributo do verso aos deuses insaciáveis.  

Morrerão de fome os deuses, se dependerem de um soneto meu, de um dístico, de qualquer coisa que cheire a poesia. Os editores que ainda ousam publicar poesia morrerão de fome também. Que aguardem para nunca mais o meu livro de poemas.  

Poesia que se preza é poesia atrasada, póstuma, relegada, vítima da sociedade de consumo, da globalização, da corrupção crônica, da excomunhão compulsória, dos juros, das xenofobias, dos preconceitos mais bizarros.  

Ninguém pede poesia a ninguém. Exceto os que fazem agendas para ganhar dinheiro com a emoção alheia. A poesia está atrasada. Quando chegou, a festa já havia acabado. Quando chegou, não havia ninguém esperando coisa alguma. Poesia vive atrasada porque não anda em dia.  

Nem no seu dia nacional a poesia veio. Onde está a poesia? — ninguém perguntou. A poesia passou a noite em claro, procurando motivos para dormir, acordar cedo, sair para o trabalho, alcançar metas de produtividade, mostrar sua preocupação com a ecologia, com os excluídos.  

Mas não será ela mesma uma excluída? E por opção? Mendiga que se recusa a ser recolhida, reintegrada, recuperada, readaptada?  

O poeta espera a poesia chegar. E ela sempre, sempre belamente atrasada.


*professor e escritor

Publicado no jornal digital Correio da Cidadania

terça-feira, março 16, 2010

Cântico do País Emerso*

Os previdentes e os presidentes tomam de ponta
Os inocentes que têm pressa de voar
Os revoltados fazem de conta fazem de conta...
Os revoltantes fazem as contas de somar.

Embebo-me na solidão como uma esponja
Por becos que me conduzem a hospitais.
O medo é um tenente que faz a ronda
E a ronda abre sepulcros fecha portais;

Os edifícios são malefícios da conjura
Municipal de um desalento e de uma Porta.
Salvo a ranhura para sair o funeral
Não há inquilinos nos edifícios vistos por fora

Que é dos meninos com cataventos na aérea
Arquitetura de gargalhadas em cornucópia?
Almas bovinas acomodadas à matéria
Pastam na erva entre as ruínas da memória,

Homens por dentro abandalhados em unhas sujas
Que desleixaram seu coração num bengaleiro;
Mulheres corujas seriam gregas não fossem as negras
Nódoas deixadas na sua carne pelo dinheiro;

Jovens alheios à pulcritude do corpo em festa
Passam por mim como alamedas de ciprestes
E a flor de cinza da juventude é uma aresta
Que me golpeia abrindo vácuos de flores silvestres

essa ansiedade de mim mesma me virgula
aula de pátria entressonhada. É um crisol.
E, o fruto agreste da linfa ardente que em mim circula
Sabe-me a sol.  Sabe-me a pássaro.  Pássaro ao sol.

Entre mim e a cidade se ateia a perspectiva
De uma angústia florida em narinas frementes. 
Apalpo-me estou viva e o tacto subjectiva-me
a galope num sonho com espuma nos dentes.

E invoco-vos, irmãos, Capitães-Mores do Instinto!
Que me acenais do mar com um lenço cor da aurora
E com a tinta azulada desse aceno me pinto.
O cais é a urgência.  O embarque é agora.


*(pequeno excerto)

segunda-feira, março 15, 2010

O celibato


















Qualidades do bispo - É digna de fé esta palavra: se alguém aspira ao episcopado, deseja um excelente ofício. Mas é necessário que o bispo seja irrepreensível, marido de uma só mulher, sóbrio, ponderado, de bons costumes, hospitaleiro, capaz de ensinar; que governe bem a própria casa, mantendo os filhos submissos, com toda a dignidade. Pois, se alguém não sabe governar a própria casa, como cuidará ele da igreja de Deus?

Paulo-1ª Carta a Timóteo (Cap.3:1-2,4-5) – Bíblia dos Capuchinhos

Porque é que uma Igreja que dá uma enorme importância a tudo o que Paulo de Tarso escreveu, ao ponto de partes das suas Cartas serem leitura  obrigatória na quase totalidade das missas dominicais em todo o mundo e da passagem sobre o amor da sua carta aos Coríntios ser a leitura e base da homilia em todos os casamentos canónicos, e que até fez de 2008-2009  Ano Paulino, continua a fazer finca pé no celibato obrigatório dos sacerdotes?

No passado dia 10 de Março, Christoph Schonborn, cardeal austríaco arcebispo de Viena, teólogo conservador e unha com carne com Bento XVI, levantou um enorme burburinho em vários sectores conservadores e no Vaticano, ao defender, no magazine da diocese, que o a questão do celibato devia ser reanalisada à luz dos escândalos de pedofilia que têm vindo a público, já que o mesmo pode ser uma das causas das inqualificáveis acções predatórias que têm vindo a ser reveladas.

Christoph Schonborn não é o primeiro a sugerir uma ligação entre o celibato e a pedofilia, pois o teólogo (infelizmente “maldito”) Hans Küng já o tinha feito. Será que agora alguém vai prestar atenção, ou vão limitar-se a negar o óbvio, como já começamos a ouvir?


Cartoon: Peter Brookes/The Times

domingo, março 14, 2010

Candidatos em congresso


Imagem: Mitchell Krog/National Geographic
Variação 
    
Uma eternidade, mesmo se a tivesse nos dedos,
seria pouco para o tempo que a chuva demora
nos teus lábios: quase o tempo de
um pássaro rondar as rosas, e morrer.  
   
Francisco José Viegas,  in "Metade da Vida"

sábado, março 13, 2010

sexta-feira, março 12, 2010

Anjo de outrora

O anjo de outrora, adormecido na minha alma,
Acordou esta noite e espiou nos meus olhos:
A lágrima caída ainda há pouco era dele.

Foi ele que a esqueceu à porta dos meus olhos,
Com o discreto pudor com que à porta da igreja
Deixamos cair a esmola na mão de um pobre.


*poeta e romancista brasileiro
Preto no branco


Fernanda Câncio, no DN de hoje

Nem sempre concordo com a jornalista, mas hoje estou de acordo e reconheço que quem fala assim não é gago.

quinta-feira, março 11, 2010

Ansiedade

Quero compor um poema
onde fremente
cante a vida
das florestas das águas e dos ventos.

Que o meu canto seja
no meio do temporal
uma chicotada de vento
que estremeça as estrelas
desfaça mitos
e rasgue nevoeiros - escancarando sóis!

Manuel da Fonseca, in Poemas Dispersos

quarta-feira, março 10, 2010

PECPEC, PEC, PEC...


Cartoon: Josetxo Ezcurra
Paisagem


Entardecer... capim nas costas
do negro reluzente
a caminho do terreiro.
Papagaios cinzentos
explodem na crista das palmeiras
e entrecruzam-se no sonho da minha infância,
na porcelana azulada das ostras.
Alto sonho, alto
como o coqueiro na borda do mar
com os seus frutos dourados e duros
como pedras oclusas
oscilando no ventre do tornado,
sulcando o céu com o seu penacho
doido.
No céu perpassa a angústia austera
da revolta
com suas garras suas ânsias suas certezas.
E uma figura de linhas agrestes
se apodera do tempo e da palavra.

terça-feira, março 09, 2010

São Rosas

Esta posta era para ser afixada ontem, como é meu hábito, mas o fornecedor da internete não me deixou “assapar” imagens nem visitar nenhum blogue. Aqui ficam as rosas, mesmo com um dia de atraso, pois o que conta é a intenção.












































segunda-feira, março 08, 2010

Retrato de uma princesa desconhecida

Para que ela tivesse um pescoço tão fino
Para que os seus pulsos tivessem um quebrar de caule
Para que os seus olhos fossem tão frontais e limpos
Para que a sua espinha fosse tão direita
E ela usasse a cabeça tão erguida
Com uma tão simples claridade sobre a testa
Foram necessárias sucessivas gerações de escravos
De corpo dobrado e grossas mãos pacientes
Servindo sucessivas gerações de príncipes
Ainda um pouco toscos e grosseiros
Ávidos cruéis e fraudulentos

Foi um imenso desperdiçar de gente
Para que ela fosse aquela perfeição
Solitária exilada sem destino

Sophia de Mello Breyner Andresen

domingo, março 07, 2010

Os gandaieiros

Catadores é o termo com que os brasileiros se referem a pessoas que, por falta de alternativas no mercado de trabalho, se dedicam a vasculhar o lixo à procura de coisas que possam valer algum dinheiro. É um tipo de trabalho que muitos olham com desprezo, mas que aqueles que a ele se dedicam vêem, com toda a razão, como uma boa alternativa ao gamanço.

Não quero ser indelicado com membros de uma tal Comissão de Ética e seus convocados apelidando-os de catadores o que, para além dos próprios, poderia ofender os que se dedicam a tão duro ofício. Como a língua portuguesa, para além de muito traiçoeira, é riquíssima, prefiro aplicar-lhes o sinónimo gandaieiros (eu sei que também se aplica aos que andam na vadiagem, o que não é o caso), já que gandaia, na definição do dicionário consultado é, também, o acto de remexer o lixo à procura do que nele se pode aproveitar.

Pelo que me tenho apercebido, há alguns gandaieiros que têm uma maneira muito típica de gandaia já que, em vez de procurarem no meio do lixo aquilo que se pode aproveitar, dedicam o seu tempo a manobras abertamente escatológicas, tentando encontrar merda - que para eles, pelos vistos, vale ouro - com que possam satisfazer os seus instintos coprófagos. Felizmente as televisões ainda não transmitem o cheiro.

sábado, março 06, 2010

História mal contada

Ainda ninguém conseguiu fazer com que eu entendesse como é que Moniz foi despedido da TVI por não conseguir calar a mulher, levou três milhões de euros - mais de 100 anos de trabalho de um quadro médio/superior de uma empresa privada portuguesa - e foi contratado para vice-presidente da Ongoing (accionista da PT e da Impresa, dona da SIC, entre outros activos), empresa envolvida no alegado plano do governo para amordaçar a mulher dele, Moniz, por cento e cinquenta milhões de euros. Afinal, onde está a propalada crise dos média, quando um antigo fura-greves graduado em director geral e uma locutora de continuidade promovida a “jornalista” por via uterina valem tantos milhões?

quinta-feira, março 04, 2010

Vendam!


















Para "azar" nosso, neste momento não temos para vender. No entanto, como a Grécia tem mais de 1.400 ilhas, das quais apenas 227 são habitadas, sempre há a hipótese de vender umas quantas para pagar a sua dívida e ainda pode emprestar-nos algumas para podermos dar como fiança da nossa.
Um sonho (excerto)

Na messe, que enlourece, estremece a quermesse...
O sol, o celestial girassol, esmorece...
E as cantilenas de serenos sons amenos
Fogem fluidas, fluindo à fina flor dos fenos...

As estrelas em seus halos
Brilham com brilhos sinistros...
Cornamusas e crotalos,
Cítolas, cítaras, sistros,
Soam suaves, sonolentos,
Sonolentos e suaves,
Em suaves,
Suaves, lentos lamentos
De acentos
Graves,
Suaves.

Flor! enquanto na messe estremece a quermesse
E o sol, o celestial girassol, esmorece,
Deixemos estes sons tão serenos e amenos,
Fujamos, Flor! à flor destes floridos fenos...

Eugénio de Castro, in Oaristos

quarta-feira, março 03, 2010

"A depor" na Comissão de Ética

Fotografia: Olaf Kraak/AFP/Getty Images
Bandeira Branca

E a estrela perdeu-se na noite deserta...
Tentar procurá-la, para quê, se era em vão?
Deixaram-me em casa com a porta aberta.
Mas eu bem compreendo que estou em prisão.

Talvez que pensassem mal imaginário
a mágoa duns olhos em rosto bravio.
Mas eu bem me sinto peixe em aquário,
e sei a amargura de sonhá-lo rio.

Mas eu bem compreendo o cruel desalento
dos gestos frustrados, perdidos no ar.
Foi curta a mensagem, findou meu tormento.
E não vale a pena o que está por contar.

terça-feira, março 02, 2010

Ética

A ética é a estética de dentro, escreveu o poeta francês Pierre Reverdy.  A avaliar pelo que se tem passado na dita Comissão de Ética, Sociedade e Cultura da AR, quer por parte dos ouvidos quer por parte de alguns dos ouvidores, diria que na sociedade nacional não abunda a cultura e a ética não tem estética nem de dentro nem de fora.

segunda-feira, março 01, 2010

Palavras

Quais são as tuas palavras essenciais? As que restam depois de toda a tua agitação e projectos e realizações. As que esperam que tudo em si se cale para elas se ouvirem. As que talvez ignores por nunca as teres pensado. As que podem sobreviver quando o grande silêncio se avizinha.

Vergílio Ferreira, in Escrever
Vida

Inteira
no sabor
de uma dor.
Verdadeira
na cor
de uma flor.
Exacta em cada momento,
e no instante do movimento
mentida,
- Vida.

Vergílio Ferreira